CSM/SP: Registro de Imóveis – Escritura pública de promessa de compra e venda de unidade imobiliária – Impossibilidade do registro com efeito translativo da propriedade, ainda que quitado o preço – Necessidade de escritura pública definitiva – Inteligência dos arts. 108, 1.245. 1.417 e 1.418 do Código Civil – Aplicação do art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79 que se restringe a loteamentos – Óbice mantido – Dúvida procedente – Recurso não provido.

Trata-se de recurso de apelação interposto por JULIA MOHOVIC contra a r. sentença proferida pela MM. Juíza Corregedora Permanente do 18º Oficial de Registro de Imóveis de São Paulo, que manteve a negativa de registro da escritura pública de promessa de compra e venda firmada por Gafisa S/A Julia Mohovic relativa ao imóvel matriculado sob nº 194.598 como título para a transmissão da propriedade (fl. 76/79).

Alega a apelante, em síntese, que a escritura pública de promessa de compra e venda quitada serve como título para a transmissão da propriedade, dispensada nova escritura pública definitiva. Para ancorar sua pretensão, socorre-se do disposto no art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79, o qual deve ser aplicado ao caso em tela promessa de compra e venda pactuada sob o regime jurídico da Lei nº 4.591/64 – diante da omissão legislativa, em prestígio à tutela do consumidor. Por isso, requer o provimento do recurso para julgar improcedente a dúvida, valendo como título para registro da propriedade a escritura pública de promessa de compra e venda quitada (fl. 85/97).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fl. 114/117).

É o relatório.

Pretende a recorrente o registro da escritura pública de promessa de compra e venda quitada não com efeito de direito real de aquisição (art. 1.417 do Código Civil), mas sim como sucedâneo de título translativo de propriedade de acordo com o art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79.

O contrato de promessa de compra e venda de unidade futura integrante de incorporação imobiliária foi celebrado por instrumento público e o pagamento do preço de R$135.279,60 efetivado à vista (fl. 42/57).

Ainda assim, o título não é hábil à transferência do domínio.

Como regra, a promessa de compra e venda firmada por instrumento público ou particular, sem cláusula de arrependimento, registrada no Cartório de Registro de Imóveis, atribui ao promitente comprador direito real à aquisição do imóvel, oponível a terceiros (arts. 1.417 e 1.418 do Código Civil).

Direito real de aquisição que não se confunde com o direito de propriedade.

Logo, a promessa de compra e venda mesmo que já saldado o seu preço não constitui título hábil à transferência do domínio do imóvel, sendo indispensável a celebração do contrato definitivo e seu registro posterior, nos termos dos arts. 108 e 1.245 do Código Civil.

No contrato preliminar – como a promessa de compra e venda – ainda que concentrada a maioria da carga negocial, o seu objeto é a outorga da escritura definitiva.

Inclusive, no caso concreto, em que pese o pagamento do preço à vista, as partes comprometeram-se a finalizar, a posteriori, o contrato de compra e venda, mediante futura outorga de escritura definitiva (cláusula 3.4).

Não se olvida que o pacto em questão foi celebrado sob o regime jurídico da Lei nº 4.591/64, o qual submete-se ao regramento estatuído para as promessas de compra e venda reguladas pelo Código Civil, observadas as peculiaridades da lei de regência que também deixa bem claro que o único direito conferido ao promitente comprador que se acautelou e levou a registro o seu contrato é o direito real (art. 32, § 2º, da Lei de Incorporação Imobiliária).

À evidência, a hipótese em testilha não se ajusta àquela preconizada no art. 26, § 6º, da Lei nº 6.766/79, in verbis:

“§ 6º Os compromissos de compra e venda, as cessões e as promessas de cessão valerão como título para o registro da propriedade do lote adquirido, quando acompanhados da respectiva prova de quitação.”

Apenas o compromisso de compra e venda de lote urbano, firmado entre o loteador e o adquirente, quando acompanhado da prova de quitação do preço, serve como título para a transmissão da propriedade imobiliária perante o Cartório de Registro de Imóveis, dispensando a lavratura de escritura pública, independentemente do valor do negócio ou do imóvel.

Trata-se, pois, de exceção à regra geral e, como tal, sua interpretação deve se dar no contexto da legislação em que prevista.

Outra não é a conclusão de Francisco Eduardo Loureiro, que aponta:

“Embora defenda José Osório de Azevedo Júnior a tese da possibilidade da dispensa da escritura definitiva, substituída pelo compromisso acompanhado de prova de quitação, tal conclusão implica violação ao disposto no art. 108 do CC (‘O compromisso de compra e venda’. In: FRANCIULLI NETO, Domingos (coord.), MENDES, Gilmar Ferreira & MARTINS FILHO, Ives Gandra da Silva. O novo Código Civil: estudos em homenagem ao prof. Miguel Reale. São Paulo, LTr, 2003, p.450).

Não pode prevalecer, portanto, o Enunciado n. 87 do Centro de Estudos Judiciários do CJF, por ocasião da Jornada de Direito Civil realizada entre 11 e 13 de setembro de 2002, cujo teor é o seguinte: ‘Considera-se também título translativo, para fins do art. 1.245 do CC, a promessa de compra e venda devidamente quitada (arts. 1.417 e 1.418 do CC e § 6°do art. 26 da Lei n. 6.766/79)” (Código Civil Comentado, Coordenador Ministro Cezar Peluso, 14ª ed., São Paulo: Manole, 2020, p. 1.497).

No mesmo sentido, a apelação nº 1036475-31.2020.8.26.0100 de minha relatoria:

Apelação – Dúvida – Recusa a transmissão da propriedade – Termo de quitação de compromisso de venda e compra que não constitui título translativo do domínio – Necessidade de título hábil Inteligência do art. 1.417 do Código Civil – Promitente comprador que adquire direito à aquisição do imóvel – Aplicação restrita do art. 26, §6º, da Lei nº 6.766/79 aos casos em que o compromisso de venda e compra foi celebrado pelo próprio loteador – Inteligência do art. 167, II, item 32 da Lei de Registros Públicos para fins específicos – Desprovimento do recurso.”

O título apresentado a registro não é apto a transferir o domínio à recorrente, portanto.

Por todo o exposto, pelo meu voto, nego provimento ao recurso.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 20.10.2021 – SP)

Fonte: INR Publicações.

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CGJ/SP: Recurso Especial – Direito de Família – Partilha de verba trabalhista – Reserva para garantir a meação – Possibilidade – 1. As verbas trabalhistas cujo fato gerador e reclamação judicial ocorram na vigência do casamento ou união estável, independentemente do momento em que foram efetivamente percebidas, são suscetíveis de partilha, sendo possível a reserva do montante para garantir a meação – 2. Recurso especial provido.

RECURSO ESPECIAL Nº 1954275 – RS (2021/0244987-0)

RELATOR : MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

RECORRENTE : D W A

ADVOGADOS : ANDRE ROBERTO MALLMANN – RS022940

LUCAS JOSÉ MARIANI – RS055788

MÁRIO APPEL BASSEGIO – RS086789

RICARDO DANI BECKER – RS093434

RECORRIDO : E A

ADVOGADOS : VANICE REICHERT – RS042017

VERA LÚCIA DE SOUZA FONTANA – RS010438

JOSUÉ DA ROSA – RS087716

EMENTA

RECURSO ESPECIAL. DIREITO DE FAMÍLIA. PARTILHA DE VERBA TRABALHISTA. RESERVA PARA GARANTIR A MEAÇÃO. POSSIBILIDADE.

1. As verbas trabalhistas cujo fato gerador e reclamação judicial ocorram na vigência do casamento ou união estável, independentemente do momento em que foram efetivamente percebidas, são suscetíveis de partilha, sendo possível a reserva do montante para garantir a meação.

2. Recurso especial provido.

DECISÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

1. Cuida-se de recurso especial interposto por DWA, com fundamento no art. 105, III, c, da Constituição da República, contra acórdão proferido pelo TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, assim ementado:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE DIVÓRCIO. DETERMINAÇÃO DE BLOQUEIO DE METADE DAS VERBAS RESCISÓRIAS ADVINDAS DE RECLAMATÓRIA TRABALHISTA. DESCABIMENTO. INCOMUNICABILIDADE DOS PROVENTOS DE TRABALHO PESSOAL. PRECEDENTES.

A incomunicabilidade dos proventos de trabalho pessoal de cada cônjuge/companheiro, causa de exclusão prevista no inciso VI do art. 1.659 do CCB, abarca as verbas rescisórias e os créditos originados em ação trabalhista. Portanto, considerando sua natureza, não é admissível a partilha, vez que valores percebidos por quaisquer dos cônjuges em razão do exercício de atividade profissional não integram o patrimônio comum do casal, porquanto considerados frutos civis do trabalho.

AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO (fl. 211).

Opostos embargos de declaração, foram acolhidos parcialmente, sem efeitos infringentes (fls. 311-319).

Em suas razões recursais, aponta a recorrente, além de dissídio jurisprudencial, ofensa ao disposto nos arts. 1.659, VI, e 1.660, I, do Código Civil. Sustenta, em síntese, a comunicabilidade das verbas pleiteadas em reclamatória trabalhista na constância do casamento.

Não foram apresentadas contrarrazões ao recurso especial, consoante certidão à fl. 425.

Crivo positivo de admissibilidade na origem (fls. 429-433).

É o relatório. Decido.

2. A irresignação merece prosperar.

Este recurso é tirado de agravo de instrumento interposto contra a decisão de fls. 94-95 por meio da qual o juiz de piso, “analisando os documentos juntados aos autos às fls. 202/261”, determinou “o bloqueio da metade do valor das verbas trabalhistas devidas ao cônjuge” até que sobrevenha deliberação definitiva a respeito.

Na sequência, o agravo de instrumento foi provido, ao fundamento de que não seria devida a partilha, pois tais valores seriam “considerados frutos civis do trabalho”.

No entanto, as verbas trabalhistas cujo fato gerador e reclamação judicial ocorram na vigência do casamento ou união estável, independentemente do momento em que foram efetivamente percebidas, são suscetíveis de partilha, sendo possível a reserva do montante para garantir a meação. Nessa linha:

PROCESSO CIVIL. PARTILHA. COMUNICABILIDADE DE VERBA INDENIZATÓRIA TRABALHISTA. INTERPRETAÇÃO DOS ARTS. 1.658 E 1.659, VI, DO CC. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC CONFIGURADA.

1. No regime de comunhão parcial ou universal de bens, o direito ao recebimento dos proventos não se comunica ao fim do casamento, mas, ao serem tais verbas percebidas por um dos cônjuges na constância do matrimônio, transmudam-se em bem comum, mesmo que não tenham sido utilizadas na aquisição de qualquer bem móvel ou imóvel (arts. 1.658 e 1.659, VI, do Código Civil).

2. O mesmo raciocínio é aplicado à situação em que o fato gerador dos proventos e a sua reclamação judicial ocorrem durante a vigência do vínculo conjugal, independentemente do momento em que efetivamente percebidos, tornando-se, assim, suscetíveis de partilha. Tal entendimento decorre da ideia de frutos percipiendos, vale dizer, aqueles que deveriam ter sido colhidos, mas não o foram. Precedentes.

3. No caso, conquanto alegue a recorrente que o ex-cônjuge ficou desempregado durante a constância do casamento, é certo que o Tribunal de origem (TJ/SP), a despeito da determinação anterior deste Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.193.576/SP) para que explicitasse qual o período em que teve origem e em que foi reclamada a verba auferida na lide trabalhista, negou-se a fazê-lo, em nova e manifesta ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil.

4. Recurso especial provido.

(REsp 1358916/SP, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, DJe 15/10/2014).

………………………………………………………………………………………………..

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE DIVÓRCIO. PARTILHA. CRÉDITO TRABALHISTA. COMUNICABILIDADE DA PARTE REFERENTE AO PERÍODO DO MATRIMÔNIO. RESERVA PARA GARANTIR A MEAÇÃO. POSSIBILIDADE. ALEGAÇÃO DE QUE AS VERBAS DE NATUREZA INDENIZATÓRIA DEVEM SER EXCLUÍDAS DA PARTILHA POR TEREM CARÁTER PERSONALÍSSIMO. INOVAÇÃO RECURSAL. RECURSO NÃO PROVIDO.

1. É pacífica a jurisprudência desta Corte no sentido de que a verba de natureza trabalhista adquirida e pleiteada, na constância da união, comunica-se entre os cônjuges, devendo, portanto, ser partilhada. Precedentes.

2. A tese de que as verbas de natureza indenizatória devem ser excluídas da partilha por terem caráter personalíssimo não foi suscitada anteriormente nos autos pelo agravante no agravo de instrumento, tampouco nas contrarrazões ao recurso especial, configurando verdadeira inovação recursal, o que obsta o conhecimento desta matéria.

3. Agravo interno não provido.

(AgInt no REsp 1696458/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/05/2018, DJe 29/05/2018).

3. Ante o exposto, dou provimento ao recurso especial para reconhecer o direito à partilha de verbas trabalhistas cujo fato gerador e reclamação judicial tenham ocorrido na constância do casamento, restabelecendo a decisão de primeira instância agravada “a fim de que o valor fique indisponível ao requerido até que sobrevenha decisão definitiva nestes autos” (fl. 95).

Publique-se. Intimem-se.

Brasília, 24 de agosto de 2021.

MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO

Relator – – /

Dados do processo:

STJ – REsp nº 1.954.275 – Rio Grande do Sul – 4ª Turma – Rel. Min. Luis Felipe Salomão – DJ 01.09.2021

Fonte: INR Publicações.

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IRTDPJBrasil expede Orientação Institucional sobre a extinção da EIRELI

ORIENTAÇÃO INSTITUCIONAL Nº 02/2021

Extinção da EIRELI

CONSIDERANDO que o INSTITUTO DE REGISTRO DE TÍTULOS E DOCUMENTOS E DE PESSOAS JURÍDICAS DO BRASIL –IRTDPJBrasil é entidade de classe legitimamente reconhecida pelos poderes constituídos para representar os 3.371 (três mil trezentos e setenta e um) serventias extrajudiciais que possuem atribuição de Registro de Títulos e Documentos – RTD e/ou Registro Civil de Pessoas Jurídicas – RCPJ;

CONSIDERANDO que é objetivo do IRTDPJBrasil estudar e pesquisar os procedimentos e normas jurídicas referentes ao Registro de Títulos e Documentos e de Pessoas Jurídicas, propugnando pelo desenvolvimento, difusão e aperfeiçoamento das técnicas utilizadas;

CONSIDERANDO que é atribuição do RCPJ registrar os atos constitutivos e demais alterações estatutárias das sociedades simples;

CONSIDERANDO que as sociedades simples podem adotar natureza jurídica de Empresa Individual de Responsabilidade Limitada – EIRELI;

CONSIDERANDO a extinção da EIRELI pela Lei nº 14.195, de 26 de agosto de 2021;

CONSIDERANDO que a Receita Federal do Brasil comunicou o IRTDPJBrasil quanto à descontinuidade da EIRELI no sistema da Rede Nacional para a Simplificação do Registro e da Legalização de Empresas e Negócios – Redesim em reunião realizada no dia 23 de setembro de 2021;

O IRTDPJBrasil estabelece esta Orientação Institucional nº 02/2021 para todos os Oficiais de Registro Civil de Pessoas Jurídicas.

No dia 26 de agosto de 2021, foi publicada a Lei nº 14.195, que em seu Capítulo IX – DA DESBUROCRATIZAÇÃO EMPRESARIAL E DOS ATOS PROCESSUAIS E DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE dispõe que:

Art. 41. As empresas individuais de responsabilidade limitada existentes na data da entrada em vigor desta Lei serão transformadas em sociedades limitadas unipessoais independentemente de qualquer alteração em seu ato constitutivo.

Parágrafo único. Ato do Drei disciplinará a transformação referida neste artigo.

De acordo com a literalidade do dispositivo acima, as EIRELIs devem ser transformadas, automaticamente, em Sociedades Limitadas Unipessoais (SLU), natureza jurídica inaugurada no ordenamento jurídico brasileiro por meio da Lei nº 13.874, de 20 de setembro de 2019 – Lei da Liberdade Econômica.

Em razão do exposto, o IRTDPJBrasil orienta os Oficiais de RCPJ para que exijam a alteração de natureza jurídica em todos os requerimentos para inscrição ou averbação de sociedades simples que tenham, originariamente, adotado a natureza jurídica de empresa individual de responsabilidade limitada.

Em caso de transformação, o instrumento de formalização da EIRELI em SLU é a declaração do titular, seja pessoa natural ou jurídica, com a modificação da denominação ou da firma retirando-se a sigla EIRELI e adicionando a sigla Ltda.

Fonte: IRTDPJBrasil.

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