Retificação de Registro Civil das Pessoas Naturais – Lei nº. 9.140/95 – Ausência de falha no serviço extrajudicial no caso concreto por estar conforme precedente anterior da CGJ, depois modificado – Sugestão de publicação da decisão e parecer do último entendimento administrativo no DJE.


  
 

Número do processo: 178237

Ano do processo: 2019

Número do parecer: 658

Ano do parecer: 2019

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 2019/178237

(658/2019-E)

Retificação de Registro Civil das Pessoas Naturais – Lei nº. 9.140/95 – Ausência de falha no serviço extrajudicial no caso concreto por estar conforme precedente anterior da CGJ, depois modificado – Sugestão de publicação da decisão e parecer do último entendimento administrativo no DJE.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de solicitação de manifestação da Corregedoria Geral da Justiça em expediente concernente a dificuldades havidas na delegação correspondente ao 18º Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais do 18º Subdistrito – Ipiranga – Comarca da Capital, quanto à retificação de assento de óbito de pessoas reconhecidas como mortas ou desaparecidas políticas, nos termos da Lei nº 9.140/95 e 12.528/11, conforme representação do D. Presidente da Comissão Permanente de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil – São Paulo perante a E. Presidência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo.

É o relatório.

Opino.

Incialmente observo a inexistência de ilício administrativo da parte da Sra. Titular da Delegação quanto ao indeferimento do pedido da retificação, porquanto fundada em precedente administrativo desta Corregedoria Geral da Justiça (Processo n. 2018/00121505).

Não obstante, a orientação em questão não prevaleceu sendo modificada em precedente administrativo posterior, como se observa da seguinte ementa:

REGISTRO CIVIL DE PESSOAS NATURAIS – Retificação administrativa de assento de óbito lavrado na forma da Lei nº 9.140/95 – Declaração, pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, de que o falecimento decorreu de morte causada pelo Estado brasileiro – Anterior submissão da matéria à Eg. Corregedoria Nacional de Justiça que reconheceu a regularidade das retificações promovidas com base em atestado emitido na forma da Resolução nº 02/2017 da referida Comissão – Recurso provido. (CGJ, processo n. 1045782-43.2019.8.26.0100).

No parecer da lavra do Dr. José Marcelo Tossi Silva, no processo n. 1045782-43.2019, aprovado por Vossa Excelência em 08.10.2019, constou:

A Lei nº 9.140/95 reconheceu a morte, para todos os efeitos legais, das pessoas que foram detidas por agentes públicos e desapareceram em razão de participação, ou de acusação de participação, em atividades políticas no período de 2 de setembro de 1961 a 5 de outubro de 1988.

A referida Lei criou Comissão Especial com atribuições para promover o reconhecimento de pessoas desaparecidas: em razão de participação, ou acusação de participação, em atividades políticas e que faleceram de causas não-naturais, em dependências policiais ou assemelhadas; em virtude de repressão policial sofrida em manifestações públicas, ou em conflitos armados com agentes públicos; ou por suicídio praticado na iminência de prisão ou em decorrência de sequelas psicológicas resultantes de tortura por agentes do poder público:

“Art. 1º São reconhecidos como mortas, para todos os efeitos legais, as pessoas que tenham participado, ou tenham sido acusadas de participação, em atividades políticas, no período de 2 de setembro de 1961 a 5 de outubro de 1988, e que, por este motivo, tenham sido detidas por agentes públicos, achando-se, deste então, desaparecidas, sem que delas haja notícias.

Art. 2º A aplicação das disposições desta Lei e todos os seus efeitos orientar-se-ão pelo princípio de reconciliação e de pacificação nacional, expresso na Lei nº 6.683, de 28 de agosto de 1979 – Lei de Anistia.

Art. 3º O cônjuge, o companheiro ou a companheira, descendente, ascendente, ou colateral até quarto grau, das pessoas nominadas na lista referida no art. 1º, comprovando essa condição, poderão requerer a oficial de registro civil das pessoas naturais de seu domicílio a lavratura do assento de óbito, instruindo o pedido com original ou cópia da publicação desta Lei e de seus anexos.

Parágrafo único. Em caso de dúvida, será admitida justificação judicial.

Art. 4º Fica criada Comissão Especial que, face às circunstâncias descritas no art. 1º desta Lei, assim como diante da situação política nacional compreendida no período de 2 de setembro de 1961 a 5 de outubro de 1988, tem as seguintes atribuições:

I – proceder ao reconhecimento de pessoas:

a) desaparecidas, não relacionadas no Anexo I desta Lei;

b) que, por terem participado, ou por terem sido acusadas de participação, em atividades políticas, tenham falecido por causas não-naturais, em dependências policiais ou assemelhadas;

c) que tenham falecido em virtude de repressão policial sofrida em manifestações públicas ou em conflitos armados com agentes do poder público;

d) que tenham falecido em decorrência de suicídio praticado na iminência de serem presas ou em decorrência de seqüelas psicológicas resultantes de atos de tortura praticados por agentes do poder público;

II – envidar esforços para a localização dos corpos de pessoas desaparecidas no caso de existência de indícios quanto ao local em que possam estar depositados;

III – emitir parecer sobre os requerimentos relativos a indenização que venham a ser formulados pelas pessoas mencionadas no art. 10 desta Lei”.

Além disso, o art. 7º da Lei nº 9.140/95 conferiu à Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos – CEMDP competência para receber e decidir requerimentos visando o reconhecimento de pessoas desaparecidas nas circunstâncias previstas em seu art. 4º, inciso I:

“Art. 7º Para fins de reconhecimento de pessoas desaparecidas não relacionadas no Anexo I desta Lei, os requerimentos, por qualquer das pessoas mencionadas no art. 3º, serão apresentados perante a Comissão Especial, no prazo de cento e vinte dias, contado a partir da data da publicação desta Lei, e serão instruídos com informações e documentos que possam comprovar a pretensão.

§ 1º Idêntico procedimento deverá ser observado nos casos baseados na alínea b do inciso I do art. 4º.

§ 2º Os deferimentos, pela Comissão Especial, dos pedidos de reconhecimento de pessoas não mencionadas no Anexo I desta Lei instruirão os pedidos de assento de óbito de que trata o art. 3º, contado o prazo de cento e vinte dias, a partir da ciência da decisão deferitória”.

A par dessas atribuições, a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos – CEMDP, constituída em conformidade com a Lei nº 9.140/95, editou resolução e recomendação para a retificação da causa da morte no assento de óbito de pessoa falecida em razão de violações de direitos humanos (Resolução nº 02/2017 e Recomendação nº 07).

Neste caso concreto, o assento de óbito foi lavrado em (…), com anotação de que a morte foi reconhecida com fundamento no art. 3º da Lei nº 9.140/95 por estar o (…) desaparecido desde o ano de (…), com último domicílio em (…).

Não se diverge quanto à possibilidade de lavratura de assento de óbito mediante reconhecimento de que se cuida de pessoa desaparecida nas circunstâncias previstas na Lei nº 9.140/95, nem sobre a anotação de que o falecimento ocorreu por causas não naturais em razão das circunstâncias relacionadas nas alíneas “a” a “d” do inciso III de seu art. 4º.

A questão a ser apreciada, in casu, consiste em verificar se para a retificação do assento, visando constar que o óbito ocorreu: “… em razão de morte não natural, violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática e generalizada à população identificada como opositora política ao regime ditatorial de 1964 a 1985″ conforme consignado em atestado de óbito” expedido pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos – CEMDP (…), é necessário o recurso ao procedimento previsto no art. 109 da Lei nº 6.015/73, de jurisdição voluntária, ou se pode ser promovida na forma do art. 110 da referida Lei, diretamente na esfera administrativa.

Essa matéria foi objeto de análise pela Eg. Corregedoria Nacional de Justiça no Pedido de Providências nº0005326-38.2018.2.00.0000, que foi arquivado porque se considerou que as Corregedorias Gerais e Permanentes observam a Resolução nº 02/2017 da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos – CEMDP. Nesse sentido, consta na r. decisão prolatada pelo Exmo. Ministro Corregedor Nacional de Justiça:

“Diante da informação de que as Corregedorias locais estão observando a Resolução 02/2017 para correção das certidões de óbito, nada mais a prover nos presentes autos”.

A r. decisão da Eg. Corregedoria Nacional de Justiça, ao determinar o arquivamento do Pedido de Providências, abrangeu o reconhecimento de que os atestados emitidos pela Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos – CEMDP são títulos hábeis para a retificação administrativa dos assentos de óbito que se referem os arts. 5º e 6º de sua Resolução nº 02/2017, assim redigidos:

“Art. 5º Cada pedido de retificação será autuado como procedimento administrativo no sistema SEI do Ministério dos Direitos Humanos (MDH) no âmbito do qual será emitida uma minuta de atestado, que, por sua vez, será submetida ao(s) familiar(es) interessado(s), em resposta pelo mesmo endereço eletrônico.

§1º Os atestados emitidos para fins de retificação de assentos de óbito devem indicar as circunstâncias da morte ou desaparecimento de mortos ou desaparecidos políticos, com base nos procedimentos administrativos da CEMDP e no Volume III do Relatório da CNV.

§2º Em caso de versões conflitantes entre as fontes acima citadas, prevalecerá a constante do Relatório da CNV, a menos que as circunstâncias apontadas pela CEMDP constituam fato novo apurado após o encerramento dos trabalhos da CNV, em dezembro de 2014.

§3º O atestado será assinado pela presidência da CEMDP e conterá, nos termos do art. 81, da Lei nº 6.015, de 1973 (LRP), com a maior especificidade possível, as circunstâncias da morte, tais como hora, data, local, e que a morte não foi natural, mas violenta, causada pelo Estado brasileiro, no contexto da perseguição sistemática à população identificada como dissidente política do regime ditatorial de 1964 a 1985.

§4º Como nome dos atestantes, conforme exigido pelo mesmo artigo da Lei nº 6.015, de 1973 (LRP), deverá constar dos assentos respectivos: “Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos”, com a indicação das páginas do Relatório da CNV ou do procedimento administrativo da CEMDP, de onde as afirmações foram extraídas.

Art. 6º Após a definição do texto final de cada atestado em conjunto com o(s) familiar(es) respectivo(s), este(s) deverá(ão) assinar a petição de que trata o art. 111, da Lei nº 6.015, de 1973 (LRP), e a CEMDP providenciará a retificação administrativa junto ao cartório e juízo de registros públicos onde a certidão original tiver sido emitida”.

Uma vez que já lavrado o assento de óbito com anotação de que a morte foi reconhecida com fundamento no art. 3º da Lei nº 9.140/95, e diante do que foi decidido pela Eg. Corregedoria Nacional de Justiça no Pedido de Providências nº 0005326-38.2018.2.00.0000, deve o recurso ser provido.

Ante o exposto, o parecer que submeto ao elevado critério de Vossa Excelência é no sentido de que seja dado provimento ao recurso para afastar a recusa da retificação administrativa do assento de óbito, a ser promovida conforme o atestado de óbito (…).

Retornando ao caso concreto, a questão deve seguir os trâmites administrativos pertinentes, competindo os respectivos requerimentos aos interessados.

Com a finalidade de propiciar ampla divulgação do último precedente administrativo acima transcrito, sugiro a publicação do parecer e decisão de Vossa Excelência no processo nº. 1045782-43.2019.8.26.0100, com a exclusão de todas as informações pessoais, notadamente nome, documentos e registros, no DJE, em três dias alternados.

Ante o exposto, o parecer que, respeitosamente, submete-se à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido da inexistência de falha do serviço extrajudicial no caso concreto e da publicação da decisão e do parecer contidos no processo nº. 1045782-43.2019.8.26.0100, expungidos todos os dados pessoais, com a finalidade da divulgação do atual precedente administrativo desta Corregedoria Geral da Justiça quanto a questão posta pelo D. Presidente da Comissão Permanente de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil – São Paulo.

Sub censura.

São Paulo, 21 de novembro de 2019.

Marcelo Benacchio

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM Juiz Assessor da Corregedoria e, por seus fundamentos que adoto, apresento a manifestação a E. Presidência do Tribunal de Justiça. Proceda-se a publicação da decisão e do parecer contidos no processo nº. 1045782-43.2019.8.26.0100, excluídos todos os dados pessoais, no DJE em três dias alternados. Encaminhem-se os autos à E. Presidência do Tribunal de Justiça. Publique-se. São Paulo, 25 de novembro de 2019. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça.

Diário da Justiça Eletrônico de 28.11.2019

Decisão reproduzida na página 206 do Classificador II – 2019

Fonte: INR Publicações.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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