1VRP/SP: Registro de Imóveis. O atendimento é realizado por “uma janela com vidro fechado, que impede contato físico”, sendo que notificação por hora certa não pôde ser feita justamente porque os porteiros recusaram-se a receber qualquer documento endereçado aos fiduciantes. Necessidade de notificação por edital.


  
 

Processo 1113354-11.2022.8.26.0100

Pedido de Providências – Retificação – Banco Pine S/A – Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido a fim de que o procedimento de consolidação da propriedade prossiga com a intimação por edital dos devedores fiduciários faltantes. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios. Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: TATIANA APARECIDA MUNHOZ (OAB 249350/SP), FABIANA BERNARDES FERNANDES (OAB 296425/SP), ERIKA ALVES DA SILVA GITTI (OAB 338394/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1113354-11.2022.8.26.0100

Classe – Assunto Pedido de Providências – Retificação

Suscitante: Banco Pine S/A

Suscitado: 7º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada por Banco Pine S/A em face do Oficial do 7º Registro de Imóveis da Capital em procedimento de consolidação da propriedade fiduciária relativa ao imóvel da matrícula n. 37.772 daquela serventia.

A parte aduz que, em sendo credora fiduciária, busca a intimação dos devedores para satisfação da dívida vencida. Após sucesso em relação a parte dos coobrigados e cônjuges, frustraram-se as tentativas de notificação dos fiduciantes Dercio Esteves Ruiz Filho, Rogerio Esteves Ruiz e Daniela Esteves Ruiz Martins, motivo pelo qual foi intimada para que formulasse requerimento relativo a novas diligências.

Entende que as intimações já efetivadas devem ser reputadas válidas, uma vez que os fiduciantes estão se ocultando, inclusive com orientação de funcionários da empresa devedora, de que são sócios-administradores, para que não recepcionem os comunicados.

Esta conclusão se reforça pelo fato de os cônjuges dos devedores Rogerio e Daniela, Luciana Crisci Gente Esteves Ruiz e Marçal de Freitas Martins, terem sido notificados. Caso não sejam reconhecidas como válidas, que se autorize notificação por edital.

Documentos vieram às fls. 11/125.

Tendo em vista que o ato buscado é de averbação (artigo 26, §7º, da Lei n. 9.514/97), o feito foi recebido como pedido de providências (fl. 126).

O Oficial informou que não se pode afirmar que os devedores Dercio, Rogerio e Daniela estejam em local incerto e não sabido, mas que apenas não estavam nos locais indicados para as diligências; que não há como considerar válidas as notificações, uma vez que devem ser feitas pessoalmente aos fiduciantes ou por meio de representante legal ou procurador constituído (§§3º, 3º-A e 4º, artigo 26, Lei n. 9.514/97, e itens 246 e 247.3, Cap. XX, NSCGJ).

Contudo, restando clara a ocultação dos devedores, possível que sejam notificados por edital com autorização deste juízo: processo de autos n. 1041250-55.2021.8.26.0100 (fls. 131/137).

Documentos vieram às fls. 138/488.

O Ministério Público manifestou-se pela notificação editalícia dos devedores (fls. 491/493).

Nova procuração foi produzida pela parte interessada às fls. 496/498.

É o relatório.

Fundamento e decido.

No mérito, o pedido deve ser acolhido em parte. Vejamos os motivos.

O Registro n. 5 da matrícula n. 37.772 do 7º RI atesta que os proprietários Branca de Carvalho Esteves Ruiz, Dercio Esteves Ruiz Filho, assistido por sua mulher Mônica Stankovic Esteves Ruiz, Alexandre Esteves Ruiz, assistido por sua mulher Luciana Lins de Albuquerque Cox, Rogerio Esteves Ruiz, assistido por sua mulher Luciana Crisci Gente Esteves Ruiz, e Daniela Esteves Ruiz Martins, assistida por seu marido Marçal de Freitas Martins Filho, alienaram fiduciariamente o imóvel ao Banco Pine S/A, parte ora interessada, para garantia do pagamento de obrigações contraídas por Dermiwil Indústria Plástica Ltda (fls. 187/188).

Ante a inadimplência, instaurou-se procedimento administrativo para consolidação da propriedade em nome da credora, com protocolo de requerimento para constituição dos devedores em mora em 20 de dezembro de 2021.

Durante o seu trâmite, os coobrigados Branca, Luciana Crisci e Marçal puderam ser notificados pessoalmente, enquanto Mônica, Alexandre e Luciana Lins, por estarem em local incerto e não sabido, foram notificados por edital.

Em relação aos devedores Rogerio Esteves Ruiz, Dercio Esteves Ruiz Filho e Daniela Esteves Ruiz Martins, as diligências restaram frustradas já que não localizados nos endereços conhecidos pesquisados (diligências feitas pelos Oficiais do 5º, 6º e 9º Registros de Títulos e Documentos da Capital):

No endereço da rua Parque da Fonte, n. 63, em visita realizada em 18/02/2022, o serventuário foi atendido pela senhora Rita, que se identificou como moradora e informou que o devedor Dercio havia se mudado há dez anos do local (fls. 222).

No endereço da rua Maria Curupaiti, n. 380, apto. n. 82, em visita realizada em 10/02/2022, o serventuário foi atendido por Washington dos Santos, porteiro do edifício, o qual informou que o devedor Rogerio mudara-se havia dois anos (fls. 240).

No endereço da rua Benta Pereira, n. 310, apto. n. 192, em visitas realizadas em 10/02/2022, 15/02/2022, 19/02/2022, 25/02/2022 e 10/03/2022, o serventuário foi atendido pelo senhor David, porteiro, e pelas senhoras Amanda, filha, e Patrícia, controladora de acesso ao condomínio, os quais informaram que a devedora Daniela reside no local, mas não tem horários fixos de saída e retorno (fl. 244).

Novas diligências foram realizadas nos dias 17/06/2022, 21/06/2022, 30/06/2022, 02/07/2022 e 08/07/2022, com informação pela senhora Paula, empregada, e pelos senhores Jefferson e Thiago, porteiros do condomínio, de que a devedora Daniela reside no local, mas que não se encontrava em nenhuma das oportunidades. Assim também se deu nos dias 20/08/2022, 25/08/2022, 31/08/2022, 06/09/2022 e 13/09/2022, ocasiões em que o serventuário foi atendido pelas senhoras Amanda, filha, e Patrícia, controladora de acesso ao condomínio (fl. 367 e 445).

No endereço da rua Paulo Andrighetti, em visitas realizadas em 14/06/2022, 27/06/2022 e 01/07/2022, o serventuário verificou que o prédio de n. 242 estava com placa de “aluga-se”, sendo que o prédio de n. 290 possuía um cartaz indicando que o atendimento se daria pela portaria situada rua Bernardo Saião, n. 137. Ao se dirigir ao local, foi informado pelo senhor Kleber da Silva, porteiro da empresa Dermiwil, que os devedores Rogerio, Dercio e Daniela ali trabalhavam, mas não se encontravam nas ocasiões (fls. 339, 348 e 358). Novas diligências foram realizadas nos dias 18/08/2022, 26/08/2022, 30/08/2022 e 12/09/2022, quando foram deixados avisos com os senhores Maria Regina, Cristiano e Cléber, controladores de acesso ao estabelecimento, a fim de que os devedores comparecem perante a serventia extrajudicial; que, diante de informações confusas e contraditórias quanto à presença dos devedores na empresa, onde exercem cargo de chefia, houve conclusão pela ocultação, com tentativa de notificação por hora certa, o que não foi possível diante de resistência ao recebimento de qualquer documento pela recepção em atendimento às ordens dos devedores, sendo que acesso à parte interna do empreendimento também não foi possível (fls. 406, 419 e 432).

É importante observar que a teoria da aparência não se aplica ao caso concreto: os devedores em questão são pessoas físicas, de modo que sua notificação deve ser pessoal ou por meio de representante legal ou procurador regularmente constituído, tudo na forma da lei (artigo 26, §3º, da Lei n. 9.514/97).

Neste mesmo sentido, o item 246, Cap. XX, das Normas de Serviço:

“cuidando-se de vários devedores, ou cessionários, inclusive cônjuges, necessária a promoção da intimação individual e pessoal de todos eles”.

Note-se que nem mesmo a intimação pela via postal se satisfaz com o mero recebimento no endereço do destinatário, sendo imprescindível que a correspondência seja entregue exclusivamente a ele (item 244, Cap. XX, das NSCGJ).

Não há, assim, como se reputarem notificados os fiduciantes em virtude da intimação de seus cônjuges ou pela suspeita de ocultação.

Por outro lado, todas as diligências empreendidas na tentativa de notificação em seu endereço profissional (empresa Dermiwil Indústria Plástica Ltda), no total de sete, evidenciam esforços para ocultação, notadamente porque acesso não é permitido pela portaria do estabelecimento.

De fato, o atendimento é realizado por “uma janela com vidro fechado, que impede contato físico”, sendo que notificação por hora certa não pôde ser feita justamente porque os porteiros recusaram-se a receber qualquer documento endereçado aos fiduciantes (fls. 406, 419 e 432).

No que diz respeito ao endereço residencial da codevedora Daniela, houve tentativa de diligências no local por quinze vezes.

Vale destacar que, em todas as oportunidades, aviso específico para comparecimento dos destinatários à serventia extrajudicial foi deixado, sem que se obtivessem outros endereços onde pudessem ser encontrados.

Neste contexto fático, possível aplicação da regra do item 247.5, Cap. XX, das NSCGJ, que assim dispõe:

“Considera-se ignorado o local em que se encontra o notificando quando não for localizado nos endereços conhecidos e, no momento da notificação, não existir qualquer outra informação sobre seu domicílio ou residência atual”.

Em outros termos, à vista de todas as diligências já empreendidas e da evidência de ocultação, com frustração da tentativa de notificação por hora certa por impossibilidade de acesso, os notificandos podem ser reputados como não localizados nos endereços conhecidos, de modo que incumbe ao Oficial de Registro de Imóveis promover a sua intimação por edital nos termos do item 247, Cap. XX, das NSCGJ.

Diante do exposto, JULGO PARCIALMENTE PROCEDENTE o pedido a fim de que o procedimento de consolidação da propriedade prossiga com a intimação por edital dos devedores fiduciários faltantes.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais e honorários advocatícios.

Oportunamente remetam-se os autos ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 09 de novembro de 2022.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juiz de Direito (DJe de 11.11.2022 – SP)

Fonte: Diário da Justiça Eletrônico

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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