CGJ/SP: Registro de imóveis – Alienação fiduciária – Constituição em mora dos garantidores fiduciantes – Intimação na pessoa do procurador – Ausência de poderes expressos para receber intimação na procuração – Ademais, necessidade de ser apresentada certidão da procuração pública dentro do prazo de validade de 90 (noventa) dias – Pedido indeferido – Recurso não provido.

Número do processo: 1006146-71.2021.8.26.0077

Ano do processo: 2021

Número do parecer: 194

Ano do parecer: 2023

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1006146-71.2021.8.26.0077

(194/2023-E)

Registro de imóveis – Alienação fiduciária – Constituição em mora dos garantidores fiduciantes – Intimação na pessoa do procurador – Ausência de poderes expressos para receber intimação na procuração – Ademais, necessidade de ser apresentada certidão da procuração pública dentro do prazo de validade de 90 (noventa) dias – Pedido indeferido – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça,

Trata-se de apelação interposta por Banco Santander (Brasil) S.A. contra a r. decisão que manteve o indeferimento do pedido de intimação dos garantidores fiduciantes na pessoa do procurador que os representou quando da celebração do contrato com garantia de alienação fiduciária para a purgação da mora (fls. 126/127).

Em suas razões, o recorrente afirmou que a intimação deve ser feita na pessoa do procurador, cujos poderes que lhe foram outorgados à época da celebração do contrato com garantia de alienação fiduciária são mais do que suficientes para a prática do ato pretendido, observado, ainda, que a procuração pública outorgada perante o Consulado Brasileiro localizado em Nagoia, Japão, se deu por prazo indeterminado, sem sido verificado o substabelecimento ou a revogação (fls. 134/144).

A douta Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 351/353).

É o relatório.

Opino.

De início, impende consignar que, apesar da interposição do recurso com o nome de apelação, cuida-se de procedimento administrativo comum e, por conseguinte, recurso administrativo (artigo 246 do Código Judiciário do Estado de São Paulo), cujo processo e julgamento competem a esta Corregedoria Geral da Justiça.

O apelante, credor fiduciário, formulou requerimento de intimação dos devedores e garantidores fiduciantes para a purgação da mora, deflagrando assim o procedimento extrajudicial de consolidação da propriedade imobiliária, nos termos da Lei nº 9.514/1997.

Ocorre que os garantidores fiduciantes Abigail Socorro Lourenzo Borges e Waldir Borges, proprietários do imóvel matriculado sob nº 16.486 do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de Birigui, não foram encontrados. Diante disso, o credor fiduciário postulou que suas intimações fossem realizadas em nome daquele que os representou quando da celebração do contrato com garantia de alienação fiduciária, o que, contudo, foi indeferido, pois a procuração não outorgou poderes para tanto e, como foi lavrada há mais de 4 anos, necessária a apresentação de certidão (segunda via) dentro do prazo de validade de 90 (noventa) dias (fls.41/42).

E razão assiste ao Registrador.

O procedimento de intimação do fiduciante deve obedecer ao rito minudenciado no artigo 26 da Lei nº 9.514/1997, estabelecendo o §3º o seguinte:

§ 3º A intimação far-se-á pessoalmente ao fiduciante, ou ao seu representante legal ou ao procurador regularmente constituído, podendo ser promovida, por solicitação do oficial do Registro de Imóveis, por oficial de Registro de Títulos e Documentos da comarca da situação do imóvel ou do domicílio de quem deva recebê-la, ou pelo correio, com aviso de recebimento.

Analisada a procuração (fls. 77/80), não se verificou a outorga de poderes ao procurador para o recebimento de intimações, sobretudo a intimação em questão que, para além das consequências naturais da constituição do devedor fiduciante em mora, permite, não havendo a purgação, a consolidação da propriedade em nome do credor fiduciário.

A intimação sobre a constituição em mora é de extrema relevância para o devedor fiduciante, cuja posse e propriedade de seu bem estão em risco, de modo a exigir que a procuração traga de forma expressa o poder para o recebimento de intimações.

Logo, o poder expresso e específico outorgado para que o determinado imóvel fosse dado em garantia de alienação fiduciária não elide a necessidade de constar poder expresso para receber intimação.

Se mais não fosse, pelo tempo decorrido desde a lavratura da procuração na Repartição Consular Brasileira (em Nagoia, Japão), mais de 4 anos, era de rigor que se comprovasse que ainda estava em vigor. Para tanto, o credor deveria ter solicitado uma certidão (segunda via) da procuração registrada no posto consular, observado o prazo de validade de 90 (noventa) dias (itens 15, e 42c, 45h e 89.1, do Capítulo, XVI, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça).

Note-se que o apelante só adotou providências perante o Consulado para obter informações sobre eventual substabelecimento ou revogação da procuração no curso deste procedimento, em sede recursal (fls. 140).

Em suma, não há mesmo como se proceder à intimação da forma como pretendida.

Ante o exposto, o parecer que submeto à elevada consideração de Vossa Excelência é no sentido de ser recebida a apelação como recurso administrativo, na forma do artigo 246 do Código Judiciário Estadual, e a ele ser negado provimento.

Sub censura.

São Paulo, 13 de junho de 2023

Caren Cristina Fernandes de Oliveira

Juíza Assessora da Corregedoria

DECISÃO: Vistos. Aprovo o parecer da MM. Juíza Assessora desta Corregedoria Geral da Justiça e, por seus fundamentos, ora adotados, recebo a apelação como recurso administrativo e a ele nego provimento. São Paulo, 14 de junho de 2023. (a) FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA, Corregedor Geral da Justiça. ADV: RICARDO RAMOS BENEDETTI, OAB/SP 204.998.

Diário da Justiça Eletrônico de 21.06.2023

Decisão reproduzida na página 090 do Classificador II – 2023

Fonte: INR Publicações.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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Procedimento de Controle Administrativo – Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais – Lei 9.514/1997 – Alienação fiduciária de coisa imóvel – Forma de celebração – Escritura pública ou instrumento particular – Poder regulamentar – Limites – Provimentos 260/2013, 299/2015, 345/2017 e 93/2020 – Flagrante ilegalidade – Inocorrência – Pedido julgado improcedente – 1. Procedimento de Controle Administrativo proposto contra ato de Tribunal que restringiu às entidades integrantes do Sistema de Financiamento Imobiliário, às Cooperativas de Crédito e às Administradoras de Consórcio de Imóveis a celebração de contratos de alienação fiduciária de bens imóveis e negócios conexos por meio de instrumento particular – 2. O entendimento sufragado pelo Tribunal mineiro é razoável e encontra ressonância na legislação de regência, de modo que refoge ao Conselho Nacional de Justiça intervir no ou mesmo expedir ato normativo para os órgãos do Poder Judiciário com vistas a disciplinar a matéria – 3. In casu, a intromissão do CNJ pode afetar incontáveis contratos de alienação fiduciária celebrados no âmbito do Estado de Minas Gerais, cuja (in)validade será discutida justamente na esfera jurisdicional – 4. Improcedência do pedido.

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO – 0000145-56.2018.2.00.0000

Requerente: ALESAT COMBUSTIVEIS S.A.

Requerido: TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS – TJMG

EMENTA

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE MINAS GERAIS. LEI 9.514/1997. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA DE COISA IMÓVEL. FORMA DE CELEBRAÇÃO. ESCRITURA PÚBLICA OU INSTRUMENTO PARTICULAR. PODER REGULAMENTAR. LIMITES. PROVIMENTOS 260/2013, 299/2015, 345/2017 E 93/2020. FLAGRANTE ILEGAIDADE. INOCORRÊNCIA. PEDIDO JULGADO IMPROCEDENTE.

1. Procedimento de Controle Administrativo proposto contra ato de Tribunal que restringiu às entidades integrantes do Sistema de Financiamento Imobiliário, às Cooperativas de Crédito e às Administradoras de Consórcio de Imóveis a celebração de contratos de alienação fiduciária de bens imóveis e negócios conexos por meio de instrumento particular.

2. O entendimento sufragado pelo Tribunal mineiro é razoável e encontra ressonância na legislação de regência, de modo que refoge ao Conselho Nacional de Justiça intervir no ou mesmo expedir ato normativo para os órgãos do Poder Judiciário com vistas a disciplinar a matéria.

3. In casu, a intromissão do CNJ pode afetar incontáveis contratos de alienação fiduciária celebrados no âmbito do Estado de Minas Gerais, cuja (in)validade será discutida justamente na esfera jurisdicional.

4. Improcedência do pedido.

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

O Conselho, por unanimidade, julgou improcedente o pedido, nos termos do voto do Relator. Votou a Presidente. Ausente, circunstancialmente, o Conselheiro Marcio Luiz Freitas. Ausente, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário, 8 de agosto de 2023. Presentes à sessão os Excelentíssimos Senhores Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Marcio Luiz Freitas, Giovanni Olsson, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto, Mário Goulart Maia e Luiz Fernando Bandeira de Mello. Sustentaram oralmente: pela Requerente, o Advogado Rafael Siqueira Maia Vinagre Mocarzel – OAB/RJ 179.145; pelo Interessado Colégio Notarial do Brasil – Seção Minas Gerais, o Advogado Carlos Antônio Vieira Fernandes Filho – OAB/DF 34.472; e, pelo Requerido, o Procurador do Estado de Minas Gerais Gianmarco Loures Ferreira.

RELATÓRIO  

O EXMO. SR. CONSELHEIRO MÁRIO GOULART MAIA (RELATOR): Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) proposto por Alesat Combustíveis S.A. contra provimento do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG) que restringiu às entidades integrantes do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), às Cooperativas de Crédito e às Administradoras de Consórcio de Imóveis a celebração de contratos de alienação fiduciária de bens imóveis e negócios conexos por meio de instrumento particular (Provimento 345/2017 [1]).

A requerente afirma que o TJMG admite que qualquer pessoa física ou jurídica celebre contrato de alienação fiduciária em garantia de bem imóvel, porém, ao regulamentar a matéria, permitiu apenas às entidades integrantes do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), Cooperativas de Crédito e Administradoras de Consórcio de Imóveis a utilização do instrumento particular para formalização dos atos.

Assevera que a Lei 9.514, de 20 de novembro de 1997, não promove a distinção adotada pelo TJMG e que com o Provimento TJMG 299/2015, a Corregedoria Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais (CGJMG) autorizava o uso do instrumento particular para a constituição da alienação fiduciária em garantia de bem imóvel. Ressalta que inúmeros contratos foram celebrados dessa forma e que a oscilação de posicionamento causa insegurança jurídica.

Argumenta que o § 1º do art. 22 da Lei 9.514/1997 autoriza a contratação de alienação fiduciária em garantia de bem imóvel por qualquer pessoa física ou jurídica e que o caput do art. 38 da mesma lei admite o uso de escritura pública ou instrumento particular. Registra não ter localizado em outros Tribunais norma análoga ao ato impugnado e destaca entendimentos doutrinários e da Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo que abalizam sua tese.

Em caráter liminar, pediu a suspensão do trecho do Provimento TJMG 345/2017 que limitou o uso do instrumento particular às entidades integrantes do SFI e às Cooperativas de Crédito para celebração dos contratos de alienação fiduciária em garantia de bem imóvel. No mérito, requereu a confirmação da medida e a expedição de ato normativo pelo CNJ para vedar aos Tribunais a normatização da matéria nos termos propostos pelo TJMG.

O TJMG prestou esclarecimentos iniciais sob o Id 2359808 e complementares sob os Ids 2378008 e 2381710. Registrou que o art. 108 [2] do Código Civil estabelece, sob pena de nulidade, ser essencial para validade do negócio jurídico o uso da escritura pública para constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a 30 (trinta) vezes o maior salário mínimo vigente.

Destacou também que a Lei 9.514/1997 é norma especial que disciplina os objetivos e finalidades da alienação fiduciária em garantia de bem imóvel e, em razão disso, entende que a lei buscou facilitar e desburocratizar a constituição por entidades integrantes do SFI.

O Tribunal suscitou, ainda, a “teoria do diálogo de fontes” para defender o argumento de que as alienações fiduciárias em garantia de bens imóveis no valor superior a 30 (trinta) salários mínimos devem seguir a regra geral do Código Civil para entidades não integrantes do SFI. Oportunamente, afirmou que o Provimento 299/2015 em momento algum alterou o Provimento 260/2013 como sustentado pela requerente; apenas lhe conferiu “nova roupagem”, mantido o entendimento.

A Alesat Combustíveis S.A. apresentou nova petição para reiterar os argumentos da inicial, contestar as informações prestadas pelo TJMG e renovar o pedido liminar (Id 2361709), o que foi indeferido pelo então Conselheiro Fernando Cesar Baptista de Mattos, relator originário (Id 2368285). Pedidos análogos constantes dos Ids 2427159, 2573128, 2660652 e 3987228.

Diante das circunstâncias deduzidas nos autos, foram solicitadas então às Corregedorias dos Tribunais de Justiça informações sobre a (in)existência de ato análogo ao Provimento TJMG 345/2017, assim sintetizadas:

Id Tribunal Informação
1 2818635 Tribunal de Justiça do Est. do Rio Grande do Norte (TJRN) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
2 2877156 Tribunal de Justiça do Estado do Paraná (TJPR) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
3 2880125 Tribunal de Justiça do Estado do Pará (TJPA) Não admite o uso de instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
4 2888627 Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo (TJSP) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
5 2898215 Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territ. (TJDFT) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
6 2934129 Tribunal de Justiça do Estado de Alagoas (TJAL) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
7 2910688 Tribunal de Justiça do Estado do Acre (TJAC) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
8 2918145 Tribunal de Justiça do Estado de Tocantins (TJTO) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
9 2939616 Tribunal de Justiça do Estado do Espírito Santos (TJES) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
10 2947135 Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco (TJPE) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
11 2963132 Tribunal de Justiça do Estado do Ceará (TJCE) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
12 2968665 Tribunal de Justiça do Estado de Rondônia (TJRO) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
13 2972122 Tribunal de Justiça do Estado de Roraima (TJRR) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
14 2986147 Tribunal de Justiça do Estado do Maranhão (TJMA) Não admite o uso de instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
15 2990132 Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJRS) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
16 2991656 e 3653134 Tribunal de Justiça do Estado do Amazonas (TJAM) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
17 2992652 Tribunal de Justiça do Estado de Sergipe (TJSE) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
18 2994124 Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro (TJRJ) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
19 2994161 Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba (TJPB) Não admite o uso de instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
20 2995130 Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
21 2995162 Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (TJBA) Não admite o uso de instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
22 3027632 Tribunal de Justiça do Estado de Santa Catarina (TJSC) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
23 3201885 Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso do Sul (TJMS) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.
24 3610170 Tribunal de Justiça do Estado do Piauí (TJPI) Admite o uso de escritura pública ou instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.

Figuraram como interessados no presente PCA:

a Associação das Empresas de Loteamento e Desenvolvimento Urbano do Triângulo Mineiro e Alto Paranaíba – AELO/TAP, (Id 2950620/2950662), a qual apresentou manifestações sob as Ids 3579913, 3580019 e 3819622;

o Colégio Notarial do Brasil – Seção Minas Gerais (Ids 3578486 e 3757946);

a empresa Engisa Construções Ltda. (Id 3773985, 3773992); e

a Associação das Empresas de Loteamento e Desenvolvimento Urbano – AELO (Ids 3819622 e 4404207).

O procedimento foi incluído na pauta de julgamentos da 44ª Sessão Virtual, no entanto, a requerimento do TJMG (Id 3579782), foi retirado de pauta para reexame do Relator (Id 3587965).

Em 31.5.2021, a Corte requerida comunicou a alteração da redação do art. 852 do Provimento CGJMG 260/2013 pelo Provimento Conjunto 93/PR/2020, oportunidade em que defendeu a perda superveniente do objeto (Id 4374868).

Provimento nº 260/CGJ/2013

Art. 852. Os atos e contratos relativos à alienação fiduciária de bens imóveis e negócios conexos poderão ser celebrados por escritura pública ou instrumento particular, desde que, neste último caso, seja celebrado por entidade integrante do Sistema de Financiamento Imobiliário – SFI ou por Cooperativas de Crédito. (Redação dada pelo Provimento nº 345/2017)

Provimento Conjunto nº 93/PR/2020

Art. 954. Os atos e contratos relativos à alienação fiduciária de bens imóveis e negócios conexos poderão ser celebrados por escritura pública ou instrumento particular, desde que, neste último caso, seja celebrado por entidade integrante do Sistema de Financiamento Imobiliário – SFI, por Cooperativas de Crédito ou por Administradora de Consórcio de Imóveis.

Nos termos da petição Id 4375139, a requerente pugnou pelo indeferimento do pedido formulado pelo TJMG.

O Colégio Notarial do Brasil – Seção Minas Gerais, juntou substabelecimentos sob os Ids 4384454 e 4385403 e requereu a abertura de prazo para se manifestar acerca das novas informações prestadas pelo TJMG (Id 4384459).

Em dezembro de 2021, vieram-me os autos por redistribuição, a teor do artigo 45-A do RICNJ.

Ato contínuo, determinei a intimação do TJMG para prestar informações atualizadas (Id 4595999).

O Tribunal se manifestou no sentido de que o ato questionado (o Provimento 345/2017) não mais subsistia, pois alterado pelo Provimento Conjunto 93/2020 (Id 4614316/4617173).

A Alesat Combustíveis S.A (requerente) renovou o pedido e requereu o julgamento definitivo do feito.

O Colégio Notarial do Brasil – Seção Minas Gerais, apresentou manifestação pela regularidade do Provimento Conjunto 93/2020 (Ids 4632509/4876980).

É o relatório.

Brasília, data registrada no sistema.

Mário Goulart Maia

Conselheiro

[1] Provimento 345, de 5 set. 2017.

[2] Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

VOTO 

O EXMO. SR. CONSELHEIRO MÁRIO GOULART MAIA (RELATOR): Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) proposto por Alesat Combustíveis S.A. contra atos do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG) que limitaram a formalização da alienação fiduciária de bem imóvel às entidades integrantes do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), às Cooperativas de Crédito e às Administradoras de Consórcio de Imóveis.

Preliminarmente à análise da questão de fundo deste procedimento, é necessário ressaltar que o feito foi incluído na pauta de julgamentos da 44ª Sessão Virtual, realizada entre os dias 14.03.2019 e 22.03.2019. Embora o voto proferido pelo então Conselheiro Fernando Mattos tenha se tornado público, o julgamento não foi concluído em razão do pedido tempestivo formulado pelo TJMG no Id 3579782 para exclusão dos autos do ambiente eletrônico de julgamentos.

Neste Conselho, a submissão dos autos ao Plenário presencial reinicia o julgamento da causa e, por consequência, torna sem efeito os votos porventura proferidos no ambiente eletrônico. Portanto, deve ser registrado que este relator não está vinculado aos fundamentos do voto divulgado por ocasião da 44ª Sessão Virtual.

Com essas considerações, passo ao exame da matéria, registrando desde logo que o pedido não merece ser acolhido.

1. TJMG. Alienação fiduciária em garantia de bem imóvel. Regulamentação. Provimentos CGJMG 260/2013, 299/2015, 345/2017 e Provimento Conjunto 93/2020. Art. 954.

O controle de legalidade propugnado pela requerente está adstrito ao art. 954 do novel Provimento Conjunto TJMG 93/2020 [1]. Este dispositivo disciplina aspectos procedimentais (anteriormente regulados pelo Provimento CGJMG 260/2013 [2]) para constituição de alienações fiduciárias de bens imóveis no Estado de Minas Gerais e, expressamente, autoriza o registro dos atos por instrumento particular apenas quando celebrado por entidade integrante do SFI, Cooperativas de Crédito e Administradoras de Consórcio de Imóveis.

Confira-se a sucessão temporal das normativas baixadas pelo TJMG, para melhor compreensão:

Provimento CGJMG 260/2013 Provimento CGJMG 299/2015 Provimento CGJMG 345/2017 Provimento Conjunto 93/2020
Art. 852 Os atos e contratos relativos à alienação fiduciária de bens imóveis e negócios conexos poderão ser celebrados por escritura pública ou instrumento particular, desde que, neste último caso, seja celebrado por entidade integrante do Sistema de Financiamento Imobiliário – SFI ou por Cooperativas de Crédito. Art. 1º O art. 852 do Provimento nº 260, de 18 de outubro de 2013, passa a vigorar com a seguinte redação:
“Art. 852. Os atos e contratos relativos à alienação fiduciária de bens imóveis e negócios conexos poderão ser celebrados por escritura pública ou instrumento particular, nos termos do art. 38 da Lei nº 9.514, de 20 de novembro de 1997.”.
Art. 1º O art. 852 do Provimento nº 260, de 18 de outubro de 2013, passa a vigorar
com a seguinte redação:

“Art. 852. Os atos e contratos relativos à alienação fiduciária de bens imóveis e
negócios conexos poderão ser celebrados por escritura pública ou instrumento
particular, desde que, neste último caso, seja celebrado por entidade integrante do
Sistema de Financiamento Imobiliário – SFI ou por Cooperativas de Crédito.”.

Art. 954. Os atos e contratos relativos à alienação fiduciária de bens imóveis e negócios conexos poderão ser celebrados por escritura pública ou instrumento particular, desde que, neste último caso, seja celebrado por entidade integrante do Sistema de Financiamento Imobiliário –  SFI, por  Cooperativas de  Crédito  ou  por Administradora de Consórcio de Imóveis.

Da leitura dos dispositivos c/c as informações prestadas pelo Tribunal durante a instrução processual, extrai-se que o TJMG admite que qualquer pessoa física ou jurídica celebre contrato de alienação fiduciária em garantia de bem imóvel.

Todavia, permite apenas às entidades integrantes do Sistema de Financiamento Imobiliário (SFI), Cooperativas de Crédito e Administradoras de Consórcio de Imóveis a utilização do instrumento particular para formalização dos atos.

Vejamos os dispositivos legais aplicáveis à espécie (Lei 9.514/1997 – dispõe sobre o Sistema de Financiamento Imobiliário e institui a alienação fiduciária de coisa imóvel):

Art. 1º O Sistema de Financiamento Imobiliário – SFI tem por finalidade promover o financiamento imobiliário em geral, segundo condições compatíveis com as da formação dos fundos respectivos.

Art. 2º Poderão operar no SFI as caixas econômicas, os bancos comerciais, os bancos de investimento, os bancos com carteira de crédito imobiliário, as sociedades de crédito imobiliário, as associações de poupança e empréstimo, as companhias hipotecárias e, a critério do Conselho Monetário Nacional – CMN, outras entidades.

[…]

Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.

§ 1º A alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica, não sendo privativa das entidades que operam no SFI, podendo ter como objeto, além da propriedade plena:  […]

Art. 38. Os atos e contratos referidos nesta Lei ou resultantes da sua aplicação, mesmo aqueles que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis, poderão ser celebrados por escritura pública ou por instrumento particular com efeitos de escritura pública.

Como se observa, inexiste dúvida quanto à possibilidade de a alienação fiduciária ser contratada por pessoa física ou jurídica, bem como ser celebrada por entidades que operam ou não o SFI.

A controvérsia recai, portanto, em saber se somente as entidades integrantes do SFI e as equiparadas (pelo objeto da atividade) é que poderão celebrar, via instrumento particular com força de escritura pública, a alienação fiduciária. Noutros termos, pode uma entidade que não opera o SFI celebrar a alienação fiduciária pelo uso de instrumento particular?

A requerente sustenta que sim, ante os preceitos da Lei 9.514/1997.

O TJMG, por sua vez, defende que a distinção promovida e prevista no Provimento Conjunto 93/2020 está alinhada aos objetivos da Lei 9.514/1997 que, em sua compreensão, buscou facilitar e desburocratizar a instituição das alienações fiduciárias por entidades integrantes do SFI.

Com apoio na “teoria do diálogo das fontes”, sustenta ser lícito aplicar o art. 108 do Código Civil e exigir o uso de escritura pública quando a garantia real for em valor superior a 30 (trinta) salários mínimos e constituída por entidade não integrante do SFI.

CC

Art. 108. Não dispondo a lei em contrário, a escritura pública é essencial à validade dos negócios jurídicos que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis de valor superior a trinta vezes o maior salário mínimo vigente no País.

Portanto, neste procedimento foram suscitadas questões ligadas ao poder regulamentar exercido pelo TJMG para disciplinar os procedimentos para constituição das alienações fiduciárias na forma prevista pela Lei 9.514/1997. Assim, cabe a este Conselho avaliar se os limites da atuação normativa do Tribunal foram respeitados.

2. Poder regulamentar. Limites. Lei. Tribunais. Aspectos procedimentais.

É certo que, no âmbito de sua competência, os Tribunais podem editar atos regulamentares para dirimir dúvidas, uniformizar procedimentos e otimizar a prestação dos serviços judiciais ou cartorários. Tal conduta constitui expressão da prerrogativa de autogestão constitucionalmente garantida aos órgãos do Poder Judiciário.

Art. 96. Compete privativamente:

I – aos tribunais:

a) eleger seus órgãos diretivos e elaborar seus regimentos internos, com observância das normas de processo e das garantias processuais das partes, dispondo sobre a competência e o funcionamento dos respectivos órgãos jurisdicionais e administrativos […]

Art. 99. Ao Poder Judiciário é assegurada autonomia administrativa e financeira.

Art. 125. Os Estados organizarão sua Justiça, observados os princípios estabelecidos nesta Constituição.

§ 1º A competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça.

Com efeito, a norma regulamentar não gera direitos e também não pode impor restrições ou contemplar situações que não estejam previamente disciplinadas pela lei editada.

A interpretação conferida pelo TJMG acerca da legislação de regência é no sentido de que “as facilitações e desburocratizações (propriamente a celebração da alienação fiduciária mediante instrumento particular) previstas na especialidade da Lei 9.514/197 só alcançam as Entidades integrantes do SFI, referidas no art. 2º da mencionada lei” (Id 2378008).

Logo, as “alienações fiduciárias em garantia, disciplinadas pela Lei 9.514/97, se versarem sobre bens imóveis com valor superior a 30 (trinta) salários-mínimos e desde que celebrados por Entidades não encampadas pelo SFI (critério material), deverão ser celebradas por escritura pública, sob pena de nulidade, nos termos do art. 108, 166, IV e V, do Código Civil” (Id 2378008).

Examinando as razões apresentadas pelo Tribunal e os julgados do próprio Órgão Especial do TJMG no exercício da atividade jurisdicional, não identifico fundamentos aptos a ensejar ou mesmo a autorizar o controle do ato pelo CNJ.

Primeiro, porque os documentos coligidos ao feito denotam que o Tribunal mineiro possui essa orientação desde (pelo menos) o ano de 2013 (Provimento 260/2013), inclusive, como dito, no âmbito jurisdicional (Vide Id 2378008, fls. 10/13).

EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. AUSÊNCIA DE PROVA DO DIREITO LÍQUIDO E CERTO. MATÉRIA DE MÉRITO. PROVIMENTO ALICERÇADO EM LEI FEDERAL. DENEGAÇÃO DA ORDEM.

– A pretensão do impetrante (resistida com base no Provimento impugnado) autoriza concluir pela adequação da via eleita, sendo o “writ” via possível para a solução da lide.

– A Lei 9.514/97, que rege o Sistema de Financiamento Imobiliário, autoriza a contratação de alienação fiduciária tanto na forma de escritura pública como por instrumento particular, conforme disciplina contida no seu artigo 38, mas tal fato não autoriza estender a particulares (situação não abrangida pela Lei) as mesmas prerrogativas ou possibilidades, circunscritas ao seu próprio e especial delineamento fático.

– Não tem o impetrante direito líquido e certo de realizar negócio independentemente da observância do disposto nos artigos 850 e 867, parágrafo 2º, do Provimento 260/CGJ/2013, sendo a escritura pública imprescindível para a validade da compra e venda de imóvel, a não ser para as empresas que integrem o SFI, na forma da Lei supra referida, na qual se sustenta o Provimento impugnado. (TJMG –  Mandado de Segurança 1.0000.14.013350-5/000, Relator(a): Des.(a) Wander Marotta , ÓRGÃO ESPECIAL, julgamento em 14/09/2016, publicação da súmula em 23/09/2016, grifo nosso).

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. PROCESSO CIVIL. REGISTROS PÚBLICOS. DÚVIDA. SUSCITAÇÃO. CARTÓRIO DE REGISTRO DE IMÓVEIS. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. INSTRUMENTO PARTICULAR. ENTIDADES NÃO AUTORIZADAS A OPERAR NO SISTEMA DE FINANCIAMENTO IMOBILIÁRIO – SFI. REGISTRO COM FORÇA DE ESCRITURA PÚBLICA. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTE DO ÓRGÃO ESPECIAL DESTE TJMG.

I. Não se conformando o apresentante com exigência formulada pelo Oficial ou, até mesmo, não podendo satisfazê-la, poderá requerer a suscitação de dúvida perante o juízo competente, nos termos do art. 198, da Lei n.º 6.015/73.

II. Segundo entendimento sedimentado pelo Órgão Especial deste egrégio Tribunal de Justiça de Minas Gerais, mesmo após a alteração do artigo 852, do Provimento nº 260/2013, a contratação de alienação fiduciária, por instrumento particular, apenas será concretizada por pessoas autorizadas a operar pelo Sistema de Financiamento Imobiliário (Mandado de Segurança nº 1.0000.14.013350-5/000).  (TJMG –  Apelação Cível 1.0000.16.057509-8/001, Relator(a): Des.(a) Washington Ferreira , 1ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 14/03/2017, publicação da súmula em 17/03/2017, grifo nosso).

Segundo, porque o Sistema Financeiro da Habitação (SFH), destinado a facilitar e promover a construção e a aquisição da casa própria ou moradia, possui regramento análogo à acepção defendida pelo TJMG (vide arts. 8º e. 61 [3], § 5º, da Lei 4.380/1964).

Art. 61. Para plena consecução do disposto no artigo anterior, as escrituras deverão consignar exclusivamente as cláusulas, têrmos ou condições variáveis ou específicas.

[…]

§ 5º Os contratos de que forem parte o Banco Nacional de Habitação ou entidades que integrem o Sistema Financeiro da Habitação, bem como as operações efetuadas por determinação da presente Lei, poderão ser celebrados por instrumento particular, os quais poderão ser impressos, não se aplicando aos mesmos as disposições do art. 134, II, do Código Civil, atribuindo-se o caráter de escritura pública, para todos os fins de direito, aos contratos particulares firmados pelas entidades acima citados até a data da publicação desta Lei. (Incluído pela Lei nº 5.049, de 1966).

Terceiro, porque a intromissão do CNJ no caso vertente pode afetar incontáveis contratos de alienação fiduciária celebrados no âmbito do Estado de Minas Gerais, cuja (in)validade será discutida justamente na esfera jurisdicional. Afinal, não se excluirá da apreciação jurisdicional ameaça ou lesão a direito (art. 5º, XXXV, CF).

Quarto, porque a hermenêutica jurídica e legislativa levada a efeito pelo TJMG é razoável e guarda sintonia com os entendimentos de outros tribunais, a exemplo do TJPA, TJMA, TJPB e TJBA, que também inadmitem o uso de instrumento particular para entidades não integrantes do SFI.

Quinto, porque não me parece acertada a compreensão de que compete ao CNJ definir a melhor interpretação da legislação federal em comento, dados os desdobramentos daí advindos (instabilidade jurídica na região, eventuais ações judiciais a discutir a questão, possível interferência na atividade jurisdicional, ausência de contraditório e ampla defesa aos diretamente atingidos pela deliberação, possível descontrole dos registros imobiliários da região, desorientação patrimonial, entre outros). Aliás, acredito que o CNJ agirá fora de seu espectro de competência se assim proceder.

É dizer, há razoabilidade no entendimento sufragado pelo TJMG a afastar a alegada “flagrante ilegalidade” defendida pela Alesat Combustíveis S.A.

Assim, em homenagem aos princípios da Administração Pública, à autonomia dos tribunais e às regras procedimentais aplicáveis à espécie, não identifico argumento idôneo a respaldar a anulação do ato do TJMG, apesar de todo o esforço argumentativo da requerente.

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido.

É como voto.

Intimem-se.

Publique-se nos termos do art. 140 do RICNJ. Em seguida, arquivem-se independentemente de nova conclusão.

Brasília, data registrada no sistema.

Mário Goulart Maia

Conselheiro

[1] Institui o Código de Normas da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais, que regulamenta os procedimentos e complementa os atos legislativos e normativos referentes aos serviços notariais e de registro do Estado de Minas Gerais.

[2] Codifica os atos normativos da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais relativos aos serviços notariais e de registro.

[3] Art. 61. Para plena consecução do disposto no artigo anterior, as escrituras deverão consignar exclusivamente as cláusulas, têrmos ou condições variáveis ou específicas.

[…]

§ 5º Os contratos de que forem parte o Banco Nacional de Habitação ou entidades que integrem o Sistema Financeiro da Habitação, bem como as operações efetuadas por determinação da presente Lei, poderão ser celebrados por instrumento particular, os quais poderão ser impressos, não se aplicando aos mesmos as disposições do art. 134, II, do Código Civil, atribuindo-se o caráter de escritura pública, para todos os fins de direito, aos contratos particulares firmados pelas entidades acima citados até a data da publicação desta Lei.

VOTO

A SENHORA CONSELHEIRA CANDICE LAVOCAT GALVÃO JOBIM (RELATORA): Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) proposto por Alesat Combustíveis S.A. contra o Provimento 345, de 5 setembro de 2017, ato do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais (TJMG) que alterou a redação do artigo 852 do Provimento 260, de 18 de outubro de 2013.

A requerente pugnou pela nulidade do art. 852 do Provimento CGJMG 260/2013, com redação dada pelo Provimento CGJMG 345/2017, na parte em que limita a formalização da alienação fiduciária de bem imóvel às entidades integrantes do Sistema Financeiro Imobiliário (SFI) e às Cooperativas de Crédito. Pediu, ainda, que a matéria fosse regulamentada de modo a vedar a expedição de atos normativos análogos ao dispositivo impugnado.

Preliminarmente à análise da questão de fundo deste procedimento, é necessário ressaltar que o feito foi incluído na pauta de julgamentos da 44ª Sessão Virtual. Embora o voto proferido por meu antecessor na vaga tenha se tornado público, o julgamento não foi concluído em razão do pedido tempestivo formulado pelo TJMG no Id3579782 para exclusão dos autos do ambiente eletrônico de julgamentos.

A submissão do feito ao plenário presencial reinicia o julgamento da causa e, por consequência, torna sem efeito os votos porventura proferidos no ambiente eletrônico. Portanto, deve ser registrado que esta relatora não está vinculada aos fundamentos do voto divulgado por ocasião da 44ª Sessão Virtual.

No mérito, a pretensão da requerente deve ser parcialmente acolhida pelos fundamentos a seguir expostos.

1. TJMG. Alienação fiduciária em garantia de bem imóvel. Regulamentação. Provimento CGJMG 260/2013. Art. 852.

O controle de legalidade propugnado pela requerente está restrito ao art. 852 do Provimento CGJMG 260/2013, com redação dada pelo Provimento CGJMG 345/2017. Este dispositivo disciplina aspectos procedimentais para constituição de alienações fiduciárias de bens imóveis no Estado de Minas Gerais e, expressamente, autoriza o registro dos atos por instrumento particular apenas quando celebrado por entidade integrante do SFI ou Cooperativas de Crédito. Confira-se:

Art. 852 Os atos e contratos relativos à alienação fiduciária de bens imóveis e negócios conexos poderão ser celebrados por escritura pública ou instrumento particular, desde que, neste último caso, seja celebrado por entidade integrante do Sistema de Financiamento Imobiliário – SFI ou por Cooperativas de Crédito.

A requerente sustentou que a Lei 9.514/1997 estabeleceu que as alienações fiduciárias podem ser celebradas escritura pública ou instrumento particular e contratadas por qualquer pessoa física ou jurídica, não sendo privativas das entidades que integram o SFI. Argumentou que o provimento do TJMG restringiu o uso do instrumento particular para celebração dos atos na norma regulamentar, embora a lei não tenha feito tal limitação.

Por sua vez, o Tribunal mineiro informou que a distinção promovida pela nova redação do art. 852 do Provimento CGJMG 260/2013 está alinhada aos objetivos da Lei 9.514/1997 que, em sua compreensão, buscou facilitar e desburocratizar a instituição das alienações fiduciárias por entidades integrantes do SFI. Com apoio na “teoria do diálogo das fontes”, defendeu ser lícito aplicar o art. 108 do Código Civil e exigir o uso de escritura pública quando a garantia real for em valor superior a 30 (trinta) salários mínimos e constituída por entidade não integrante do SFI.

Portanto, neste procedimento foram suscitadas questões ligadas ao poder regulamentar exercido pelo TJMG para disciplinar os procedimentos para constituição das alienações fiduciárias na forma prevista pela Lei 9.514/1997. Assim, cabe a este Conselho avaliar se os limites da atuação normativa do Tribunal foram respeitados.

2. Poder regulamentar. Limites. Lei. Tribunais. Aspectos procedimentais. Inovação jurídica. Impossibilidade.

É certo que, no âmbito de sua competência, os Tribunais podem editar atos regulamentares para dirimir dúvidas, uniformizar procedimentos e otimizar a prestação dos serviços judiciais ou cartorários. Tal conduta constitui expressão da prerrogativa de autogestão constitucionalmente garantida aos órgãos do Poder Judiciário, porém esta atuação é limitada pela lei.

Com efeito, a norma regulamentar não gera direitos e, nesta ordem de ideias, também não pode impor restrições ou contemplar situações que não estejam previamente disciplinadas pela lei regulamentada.

Acerca dos limites do poder regulamentar, é salutar trazer à colação a lição de Celso Antônio Bandeira de Mello [1]:

Há inovação proibida sempre que seja impossível afirmar-se que aquele específico direito, dever, obrigação, limitação ou restrição já estavam estatuídos e identificados na lei regulamentada. Ou, reversamente: há inovação proibida quando se possa afirmar que aquele específico direito, dever, obrigação, limitação ou restrição incidentes sobre alguém não estavam estatuídos e identificados na lei regulamentada. A identificação não necessita ser absoluta, mas deve ser suficiente para que se reconheçam as condições básicas de sua existência em vista de seus pressupostos, estabelecidos na lei e nas finalidades que ela protege. (sem grifos originais)

Em função da natureza complementar, o regulamento não pode ser utilizado para estabelecer pressupostos para aquisição de direitos ou restringi-los, uma vez que esta função é reservada à espécie normativa primária, qual seja, a lei. Esse foi o entendimento firmado pelo Superior Tribunal de Justiça no julgamento do REsp 665.880/SC, vejamos:

TRIBUTÁRIO. INSTRUÇÃO NORMATIVA/SRF Nº 25/99. LEI Nº 9.718/98. BENEFÍCIO FISCAL PREVISTO NO DECRETO-LEI Nº 1.598/77. CUSTO ORÇADO. IMPOSIÇÃO DE RESTRIÇÃO NÃO PREVISTA NA LEI. AFRONTA AO PRINCÍPIO DA LEGALIDADE. […] 8. O ato administrativo, no Estado Democrático de Direito, está subordinado ao princípio da legalidade (CF/88, arts. 5º, II, 37, caput, 84, IV), o que equivale a assentar que a Administração só pode atuar de acordo com o que a lei determina. Desta sorte, ao expedir um ato que tem por finalidade regulamentar a lei (decreto, regulamento, instrução, portaria, etc.), não pode a Administração inovar na ordem jurídica, impondo obrigações ou limitações a direitos de terceiros.  9. Consoante a melhor doutrina, “é livre de qualquer dúvida ou entredúvida que, entre nós, por força dos arts. 5, II, 84, IV, e 37 da Constituição, só por lei se regula liberdade e propriedade; só por lei se impõem obrigações de fazer ou não fazer. Vale dizer: restrição alguma à liberdade ou à propriedade pode ser imposta se não estiver previamente delineada, configurada e estabelecida em alguma lei, e só para cumprir dispositivos legais é que o Executivo pode expedir decretos e regulamentos.” (Celso Antônio Bandeira de Mello. Curso de Direito Administrativo, São Paulo, Malheiros Editores, 2002). […] (REsp 665.880/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 14/02/2006, DJ 13/03/2006, p. 199, grifamos)

De fato, segundo enuncia o inciso II do art. 5º da Constituição Federal, “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei”. O dispositivo constitucional não deixa margem para interpretações díspares, porquanto não é preciso nenhum esforço hermenêutico para chegar à conclusão que apenas a lei pode inovar no mundo jurídico e criar ou limitar o exercício de direitos.

As obrigações constantes em normas regulamentares são meramente acessórias, pois, seu fundamento de validade é a lei regulamentada. Eventualmente, podem colmatar lacunas, desde que o vácuo normativo esteja relacionado a procedimentos para fiel cumprimento do comando normativo primário.

Desse modo, o poder regulamentar dos Tribunais, além de não ser amplo (circunscreve-se a aspectos procedimentais), é margeado pela lei regulamentada. Assim, qualquer norma regulamentar ultra legem está eivada de ilegalidade e comporta controle por parte deste Conselho.

3. Provimento CGJMG 260/2013. Art. 842. Alteração. Fundamento. Teoria do diálogo das fontes. Inaplicabilidade.

No caso vertente, o TJMG assinalou que a alteração promovida no art. 852 do Provimento CGJMG 260/2013 operada pelo Provimento CGJMG 345/2017 observou a “teoria do diálogo das fontes” conjugação de normas da Lei 9.514/1997 e do Código Civil na formalização de alienações fiduciárias de bem imóvel.

Com a devida vênia aos argumentos do Tribunal mineiro, na hipótese dos autos, entendo não haver espaço para aplicar a “teoria do diálogo das fontes” no exercício da atividade regulamentar.

Com efeito, em síntese, a citada teoria prescreve que o ordenamento jurídico deve ser interpretado em bloco, de forma sistemática e concatenada para solução de antinomias. Para essa corrente, a aplicação das leis não é excludente, ao contrário, com base no diálogo entre as fontes, é admitida a complementariedade e subsidiariedade de normas, ou seja, é válido conjugar microssistemas jurídicos para extrair a melhor solução para a lide.

A meu sentir, os limites do poder regulamentar dos Tribunais não se compatibilizam com a “teoria do diálogo das fontes”. Conforme explicitado no item antecedente, a expedição de atos regulamentares deve se ater a aspectos procedimentais cujo fundamento de validade é a lei regulamentadora, apenas ela.

A “teoria do diálogo das fontes” pressupõe a existência de conflito de normas cuja solução demanda a agragação de leis e fontes normativas, medida que, certamente, não é compatível com a atividade regulamentar. Ademais, o âmbito administrativo não é a seara adequada para os Tribunais questionarem a ratio legis.

Portanto, na situação em exame, não cabe TJMG suscitar aspectos teleológicos da alienação fiduciária e valer-se do poder regulamentar para realizar uma verdadeira construção jurídica e limitar a abrangência da Lei 9.514/1997 no tocante aos sujeitos e às formas de instrumentalização da garantia real, quando a própria lei não o fez.

A tarefa interpretar as leis e dirimir eventuais incongruências, seja pelas formas tradicionais previstas no art. 4º da LINDB (analogia, costumes e princípios gerais do direito) ou pela moderna “teoria do diálogo das fontes”, é reservada à atividade jurisdicional no processo produção das decisões das lides.

4. Alienação fiduciária de bem imóvel. Formalização. Instrumento particular. Entidades não integrantes do SFI. Possibilidade. Lei 9.514/1997. Norma especial. Ausência de vedação.

Uma vez definidos os limites do poder regulamentar dos Tribunais e que a expedição de atos desta natureza está circunscrita aos aspectos procedimentais para execução das leis, sem possibilidade de inovação no mundo jurídico, estão presentes os fundamentos para o controle de legalidade do art. 852 do Provimento CGJMG 260/2013, com redação dada pelo Provimento CGJMG 345/2017.

Cumpre rememorar que o dispositivo impugnado pela requerente regulamenta a constituição de alienações fiduciárias de bens imóveis, instituídas pela Lei 9.514/1997, norma de caráter especial que disciplina esta modalidade de garantia real no ordenamento jurídico.

É indene de dúvidas de que a contratação da alienação fiduciária não é privativa de entidades que operam no SFI. Ao revés, o parágrafo único do art. 22 da Lei 9.514/1997 é expresso ao enunciar que a celebração pode ocorrer por qualquer pessoa física ou jurídica, observe-se:

Art. 22. A alienação fiduciária regulada por esta Lei é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o escopo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.

§1º A alienação fiduciária poderá ser contratada por pessoa física ou jurídica, não sendo privativa das entidades que operam no SFI, podendo ter como objeto, além da propriedade plena:

I – bens enfitêuticos, hipótese em que será exigível o pagamento do laudêmio, se houver a consolidação do domínio útil no fiduciário;

II – o direito de uso especial para fins de moradia;

III – o direito real de uso, desde que suscetível de alienação;

IV – a propriedade superficiária.

Quanto à forma de constituição das alienações fiduciárias de bens imóveis, também não há maiores dificuldades para se chegar à conclusão de que a formalização dos atos pode ocorrer por escritura pública ou por instrumento particular com efeitos de escritura pública. É o que se depreende da leitura do art. 38 da Lei 9.514/1997:

Art. 38. Os atos e contratos referidos nesta Lei ou resultantes da sua aplicação, mesmo aqueles que visem à constituição, transferência, modificação ou renúncia de direitos reais sobre imóveis, poderão ser celebrados por escritura pública ou por instrumento particular com efeitos de escritura pública.

Em minha compreensão, a regulamentação promovida pelo TJMG não se mostra necessária e contraria a Lei 9.514/1997. A leitura do §1º do art. 22 e do art. 38, ambos da Lei 9.514/1997 conduz ao entendimento de que as alienações fiduciárias de bem imóvel não são privativas de entidades integrantes do SFI e podem ser constituídas por qualquer pessoa física ou jurídica, podendo ser celebradas por escritura pública ou instrumento particular com efeitos de escritura pública.

Nesse cenário, há que se reconhecer que a restrição ao uso do instrumento particular para constituição das alienações fiduciárias de bens imóveis prevista no art. 260 do Provimento CGJMG 260/2013 vai de encontro à norma especial. A limitação não está expressamente prevista na Lei 9.514/1997 e tampouco há remissão para aplicação subsidiária da norma geral constante do art. 108 do Código Civil, na forma pretendida pelo TJMG.

Considerando que a Lei 9.514/1997 disciplina de modo específico as alienações fiduciárias, aplica-se o princípio lex specialis derogat legi generali e, por consequência, devem ser observadas as condições previstas na lei especial para o exercício do direito, bem como eventuais restrições.

Outrossim, conforme anteriormente assinalado, a atividade regulamentar dos Tribunais é balizada pela lei regulamentada. Em função disso, é defeso ao TJMG impor limites não previstos na norma primária.

Inexiste fundamento para acolher a tese de que as alienações fiduciárias de bens imóveis celebradas por entidades não integrantes do SFI ou por Cooperativas de Crédito devem ser formalizadas por escritura pública quando o valor for superior a 30 (trinta) salários mínimos, pois não é possível extrair essa assertiva da norma especial.

Desta feita, é inarredável concluir que o TJMG excedeu os limites do poder regulamentar ao impor restrições ao uso do instrumento particular para celebração de alienações fiduciárias de bem imóvel não previstas na Lei 9.514/1997. Em razão disso, a anulação parcial do art. 852 do Provimento CGJMG 260/2013 é medida que se impõe.

Quanto ao pedido da requerente para este Conselho editar ato normativo que vede aos Tribunais a expedição de normas que análogas ao dispositivo impugnado neste procedimento, não vislumbro motivos para tanto.

Durante a instrução deste PCA, foi determinada a oitiva das Corregedorias estaduais e apenas os Tribunais de Justiça dos Estados do Pará, Maranhão, Paraíba e Bahia informaram aplicar a regra geral do art. 108 do Código Civil para alienações fiduciárias de bem imóvel no valor superior a 30 (trinta) vezes o salário mínimo, tal como o TJMG.

Como se vê, em apenas cinco unidades da Federação há restrição ao uso do instrumento particular para constituição de alienações fiduciárias de bem imóvel. Assim sendo, este entendimento é minoritário e, na maior parte dos Estados, sequer há norma regulamentar acerca da matéria, dada a literalidade da Lei 9.514/1997.

Neste caso, a intervenção deste Conselho para exercício de seu poder regulamentador não se justifica, pois o julgamento deste procedimento fornece as diretrizes necessárias para uniformização da questão em relação aos Tribunais de Justiça que possuem entendimento dissonante.

5. Conclusão.

Ante o exposto, julgo o pedido parcialmente procedente para anular o art. 852 do Provimento CGJMG 260/2013, na parte que restringe o uso do instrumento particular para constituição das alienações fiduciárias de bem imóvel às entidades integrantes do SFI e Cooperativas de Crédito.

Determino, ainda, que no prazo máximo de 90 (noventa) dias, os Tribunais de Justiça que normatizaram os procedimentos para constituição de alienação fiduciária de bem imóvel adequem suas normas internas aos termos desta decisão, caso seja necessário.

Intimem-se os Tribunais de Justiça desta decisão.

É como voto.

Intimem-se. Em seguida, arquivem-se independentemente de nova conclusão.

Brasília, data registrada no sistema.

Candice Lavocat Galvão Jobim

Conselheira

[1] MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 27ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2010, p. 355. – – /

Dados do processo:

CNJ – Procedimento de Controle Administrativo nº 0000145-56.2018.2.00.0000 – Minas Gerais – Rel. Cons. Candice Lavocat Galvão Jobim – DJ 10.08.2023

Fonte: INR Publicações.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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Procedimento de Controle Administrativo – Corregedoria das comarcas do interior do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia – Provimento nº 77/2018 – Substituição de interinos – Ilegalidade – Inexistência – Ausência de elementos – Desnecessidade de processo administrativo – Precariedade da designação – Improcedência.

Autos: PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO – 0003320-19.2022.2.00.0000

Requerente: ASSOCIAÇÃO DOS NOTÁRIOS E REGISTRADORES DO BRASIL DA BAHIA – ANOREG/BA

Requerido: CORREGEDORIA DAS COMARCAS DO INTERIOR DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA – CCI/BA

EMENTA

PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. CORREGEDORIA DAS COMARCAS DO INTERIOR DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DA BAHIA. PROVIMENTO Nº 77/2018. SUBSTITUIÇÃO DE INTERINOS. ILEGALIDADE. INEXISTÊNCIA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS. DESNECESSIDADE DE PROCESSO ADMINISTRATIVO. PRECARIEDADE DA DESIGNAÇÃO. IMPROCEDÊNCIA.

DECISÃO 

Trata-se de Procedimento de Controle Administrativo (PCA) apresentado pela Associação dos Notários e Registradores do Brasil da Bahia – ANOREG/BA em face da Corregedoria das Comarcas do Interior do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (CCI/BA), pelo qual se insurge contra decisões administrativas adotadas em decorrência do processo administrativo nº TJ-ADM-2020/36947, nas quais foram determinadas substituições de interinos em desconformidade com o Provimento nº 77/2018, da Corregedoria Nacional de Justiça.

A requerente alega ter sido instaurado o processo administrativo TJ-ADM-2020-36947, após determinação do Conselho Nacional de Justiça nos autos da Inspeção n. 0006607-92.2019.2.00.0000, realizada no Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, para adequação das interinidades das serventias extrajudiciais ao Provimento nº 77/2018.

Afirma que não obstante a instauração do aludido processo, os interinos não foram adequadamente citados e/ou intimados da existência do feito e nem da decisão final do procedimento, o que acarretou na substituição.

Após análise dos documentos juntados aos autos do PCA 0008878-06.2021.2.00.0000, determinei a autuação de procedimentos específicos para análise individualizada de cada serventia e a intimação da requerente para providenciar a juntada do Edital e da decisão respectiva proferida pela Corregedoria das Comarcas do Interior do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia (Id 4733328).

Este procedimento refere-se ao Registro Civil das Pessoas Naturais de Milagres/BA – Comarca de Amargosa/BA.

A ANOREG/BA não se manifestou, mesmo após a renovação da intimação (Id 4840065).

É o relatório. Decido.

O procedimento em apreço versa sobre eventual irregularidade ocorrida na aplicação do Provimento nº 77/2018 pela Corregedoria das Comarcas do Interior do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia no que tange à revisão da designação de interino para o Registro Civil das Pessoas Naturais de Milagres/BA – Comarca de Amargosa/BA.

Após análise dos autos, verifico que a requerente não apresentou cópia do processo administrativo respectivo que tramitou na origem em relação à serventia mencionada e, tampouco, juntou cópia do Edital publicado pelo Tribunal.

Dessa forma, não há como analisar eventuais irregularidades ocorridas na tramitação do feito. Não há sequer a relação das serventias com a correspondência do número do processo.

Todavia, o CNJ consolidou o entendimento de que inexiste obrigatoriedade de instauração de processos administrativos para destituição de interinos. Confira-se:

RECURSO ADMINISTRATIVO. PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ. SUBMISSÃO DAS DESIGNAÇÕES DE AGENTES INTERINOS AO CONSELHO DA MAGISTRATURA. ÓRGÃO COMPETENTE NA ESTRUTURA DO TRIBUNAL PARA REFERENDÁ-LAS. REVOGAÇÃO DA INTERINIDADE. CARÁTER PRECÁRIO DA DESIGNAÇÃO INTERINA. ATO SUJEITO À DISCRICIONARIEDADE DOS TRIBUNAIS. DESNECESSIDADE DE INSTAURAÇÃO DE PROCESSO ADMINISTRATIVO PRÉVIO. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO PARA DETERMINAR QUE O TJPR SUBMETA AS DESIGNAÇÕES AO REFERENDO DO CONSELHO DA MAGISTRATURA.

1. Pedido de anulação, por interina, do Decreto Judiciário 596, de 24 de julho de 2017, editado pelo Presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, que apenas deu cumprimento às decisões judiciais proferidas pelo Tribunal Regional Federal (TRF4) e pelo Supremo Tribunal Federal.

[…]

6. Quanto à nomeação da recorrente como interina, o Conselho da Magistratura deliberou que tal designação perduraria até ulterior deliberação. A designação de interino é ato precário e sujeito à discricionariedade do Tribunal. A dispensa do encargo prescinde de processo administrativo, mesmo nas hipóteses de quebra de confiança, por estar sujeita à conveniência e oportunidade do administrador e impossibilidade de aplicação de pena aos interinos. Precedentes do STJ e do CNJ.

7. Parcial provimento do recurso, a fim de determinar que o TJPR submeta apenas as nomeações contidas no Decreto Judiciário nº 596/2017 (e não a dispensa da recorrente) ao referendo do Conselho da Magistratura.

8. Recurso parcialmente provido. (CNJ – RA – Recurso Administrativo em PCA – Procedimento de Controle Administrativo – 0006201-42.2017.2.00.0000 – Rel. FERNANDO MATTOS – 270ª Sessão Ordinária – julgado em 24/04/2018).

RECURSO ADMINISTRATIVO NO PROCEDIMENTO DE CONTROLE ADMINISTRATIVO. TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL – TJRS. SUBSTITUTO INTERINO. QUEBRA DE CONFIANÇA. AFASTAMENTO A QUALQUER TEMPO. DECISÃO MOTIVADA. AUSÊNCIA DE ELEMENTOS NOVOS RECURSO CONHECIDO A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1- O Juiz Diretor do Foro ao verificar a prática de atos irregulares na condução da administração da serventia extrajudicial e fazendo uso do seu poder geral de rever os atos administrativos, por motivo de conveniência e oportunidade, de forma fundamentada e individualizada, aplicou o comando legal previsto no §1º do art. 3 da Resolução nº 80/2009 do CNJ.

2- A dispensa do substituto interino não exige a abertura de processo administrativo – com ampla defesa e em contraditório –, podendo se dar conforme a conveniência e a oportunidade do administrador público. Precedentes STJ e CNJ.

3- A mera repetição de argumentos já expostos na inicial e refutados na decisão monocrática não autorizam a reforma do julgado.

4- Recurso conhecido a que se nega provimento. (CNJ – RA – Recurso Administrativo em PCA – Procedimento de Controle Administrativo – 0006851-89.2017.2.00.0000 – Rel. ARNALDO HOSSEPIAN – 270ª Sessão Ordinária – julgado em 24/04/2018).

Portanto, se não há sequer exigência de processo administrativo, muito menos de observância das garantias a ele inerentes, dada a precariedade da relação existente com o interino.

Não obstante, várias situações análogas relacionadas à designação de interinos no Estado da Bahia foram analisadas por este Relator e em todos os casos verificou-se que a compreensão adotada pela Corregedoria das Comarcas do Interior do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia estava consentânea com o Provimento nº 77/2018, tanto que todos os procedimentos foram julgados improcedentes1.

Nesse contexto, considerando que não há elementos ou documentos a corroborar o alegado, o arquivamento é medida que se impõe.

Ante o exposto, julgo improcedente o pedido e determino o arquivamento dos autos.

Intimem-se.

Publique-se nos termos do art. 140 do RICNJ. Em seguida, arquivem-se independentemente de nova conclusão.

Brasília, data registrada em sistema.

Mário Goulart Maia

Conselheiro – – /

Dados do processo:

CNJ – Procedimento de Controle Administrativo nº 0003320-19.2022.2.00.0000 – Bahia – Rel. Cons. Mário Goulart Maia – DJ 14.08.2023

Fonte: INR Publicações.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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