CSM/SP: Registro de imóveis – Regularização fundiária – Interesse social – Loteamento regularizado nos termos da Lei n.º 6.766/79 – Inadequação – Aquisição dos lotes que deve se dar pelos meios tradicionais – Lei nº 13.465/2017 que traz institutos excepcionais que não devem ser utilizados em situações ordinárias – Apelação não provida.


  
 

Apelação Cível nº 1005822-87.2021.8.26.0269

Espécie: APELAÇÃO

Número: 1005822-87.2021.8.26.0269

Comarca: ITAPETININGA

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1005822-87.2021.8.26.0269

Registro: 2023.0000816490

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1005822-87.2021.8.26.0269, da Comarca de Itapetininga, em que é apelante FAZENDA DO ESTADO DE SÃO PAULO, é apelado OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS E ANEXOS DA COMARCA DE ITAPETININGA.

ACORDAM, em Conselho Superior da Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, v u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores RICARDO ANAFE (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), GUILHERME GONÇALVES STRENGER (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), BERETTA DA SILVEIRA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO), WANDERLEY JOSÉ FEDERIGHI(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E FRANCISCO BRUNO (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL).

São Paulo, 14 de setembro de 2023.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator

APELAÇÃO CÍVEL nº 1005822-87.2021.8.26.0269

APELANTE: Fazenda do Estado de São Paulo

APELADO: Oficial de Registro de Imóveis e Anexos da Comarca de Itapetininga

VOTO Nº 39.069 

Registro de imóveis – Regularização fundiária – Interesse social – Loteamento regularizado nos termos da Lei n.º 6.766/79 – Inadequação – Aquisição dos lotes que deve se dar pelos meios tradicionais – Lei nº 13.465/2017 que traz institutos excepcionais que não devem ser utilizados em situações ordinárias – Apelação não provida.

Trata-se de apelação interposta pelo ESTADO DE SÃO PAULO contra a r. sentença de fls. 71/72 proferida pelo MM. Juiz Corregedor Permanente do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Itapetininga, que julgou procedente a dúvida e manteve a negativa de registro de requerimento de regularização fundiária do “Núcleo Jardim São Camilo”, objeto do imóvel matriculado sob o n.º 56.382.

Alega o apelante, em síntese, que a regularização fundiária, para fins de titulação em núcleos urbanos já registrados, é instrumento hábil e eficaz na redução da irregularidade dominial, amplamente utilizado em todo o Estado de São Paulo, já que largamente deferida por diversos Ofícios de Registro de Imóveis. A regularidade de alguns lotes não obsta a regularização fundiária plena, com a devida titulação de seus ocupantes por meio da legitimação fundiária (fls. 77/88).

A Douta Procuradoria Geral de Justiça opina pelo não provimento do recurso (fls. 161/163).

É o relatório.

O registro de requerimento de regularização fundiária do “Núcleo Jardim São Camilo”, tendo por objeto o imóvel matriculado sob o n.º 56.382, foi negado pelo registrador, que expediu nota de devolução nos seguintes termos (fls. 09):

“O empreendimento loteamento JARDIM SÃO CAMILO, já está registrado, na forma da Lei 6766/79, não podendo, assim, ser objeto de REGULARIZAÇÃO FUNDIÁRIA. O Município, através da PREFEITURA MUNICIPAL deverá outorgar os respectivos títulos de transmissão dos respectivos lotes, que já estão devidamente matriculados (matrículas 66271 a 66626), alguns já titulados. O requerimento ora apresentado é desvirtuamento da Regularização Fundiária. Nada há a ser regularizado. O Município deverá outorgar aos promitentes compradores os respectivos títulos. NÃO REGULARIZADO. O Município efetivou o parcelamento, nos termos da Lei 6766/79, não sendo possível sua omissão na outorga de escrituras definitivas. O item 275 das Normas de Serviço (Prov. CGJ/SP 58/89) não tem a leitura deste Oficial, para considerar que a loteadora (PREFEITURA MUNICIPAL) não tem condições de outorgar títulos definitivos dos lotes, já matriculados, considerando já existirem diversos lotes que estão registrados em nome dos beneficiários finais; inclusive o lote 28, da quadra G, matrícula 66459, registrado em nome de RODRIGO MOREIRA DOS SANTOS e s/mer. ZAINA TALITA GOMES DE OLIVEIRA DOS SANTOS; o lote 18 da quadra H, matrícula 66486, registrado em nome de MANOEL CORREA LIMA e s/mer, LAURIDES DE FIGUEIREDO LIMA; lote 15, quadra M, matrícula 66577, já registrado em nome de JOSÉ ANTONIO RODRIGUES MACHADO, este preterido por EDNA DA SILVA PINHO GARCIA e s/m. JOSÉ TORRE GARCIA JUNIOR, na titulação pretendida.”

Respeitados os argumentos expendidos, a dúvida é procedente e a apelação não comporta provimento.

Pretende-se a regularização fundiária da área objeto da matrícula n.º 56.382 do Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoas Jurídicas da Comarca de Itapetininga.

Ocorre que consta do R. 3 da matrícula telada, datado de 06 de maio de 2003, que o terreno foi loteado nos termos da Lei Federal n.º 6.766/79, conforme certificado de aprovação n.º141/2000, expedido pelo Graprohab em 04 de abril de 2000 e Decreto n.º 33, de 04 de dezembro de 2001, emitido pela Prefeitura local, considerado de interesse público, com a denominação de JARDIM SÃO CAMILO (fls. 21/46).

Trata-se, pois, de loteamento já regularizado e registrado, nos termos da Lei Federal n.º 6.766/79, não havendo se falar em titulação dos adquirentes dos lotes por regularização fundiária.

A legislação instituidora da Regularização Fundiária Urbana (Lei nº 13.465/2017), como é cediço, visa adequar situações juridicamente irregulares, por meio de medidas (ambientais, urbanísticas, jurídicas e sociais) destinadas à incorporação de núcleos urbanos informais ao ordenamento territorial urbano, trazendo, assim, segurança jurídica aos seus ocupantes. Traz, contudo, institutos excepcionais que não devem ser utilizados em situações ordinárias quando a aplicação de métodos tradicionais seja viável, como ocorre na hipótese.

Tratando-se de empreendimento regular a aquisição dos lotes, como ponderado pelo Senhor Oficial, deverá ocorrer pelos meios ordinários, ou seja, mediante a lavratura de escrituras públicas ou mesmo instrumentos particulares para transmissão da propriedade aos adquirentes, com o correspondente pagamento de tributos.

Nesta linha, nos ensina Paola de Castro Ribeiro Macedo[1]:

“Permitir a titulação de unidades não advindas de regularização fundiária parece violar o direito à estabilidade do sistema registral imobiliário uma vez que os instrumentos de titulação aos ocupantes são devastadores aos proprietários dos imóveis.

A legislação da REURB traz institutos de exceção, devendo ser utilizados em situações extremas em que os métodos tradicionais não podem ser aplicados. Não é o caso dos imóveis regulares, pendentes de outorga de direitos reais pelos empreendedores. Se fosse possível utilizar a REURB para obter a transmissão de domínio em loteamentos regulares, as partes envolvidas evitariam, em tese, o pagamento de impostos ou a obrigatoriedade da lavratura de escrituras públicas, em possível burla ao arcabouço legal de transmissão da propriedade formal.

O sistema de regularização trazido pela Lei n.º 13.465/2017 não serve ao propósito de evitar pagamento de tributos, taxas ou permitir a perda de propriedade daqueles que cumpriram rigorosamente a legislação de parcelamento do solo. O sistema de REURB visa corrigir distorções causadas pela irregularidade na divisão da terra, que trouxe insegurança aos ocupantes sem títulos ao priva-los da possibilidade de transacionar suas propriedades. Claro que podem ocorrer situações excepcionais que justifiquem a REURB-titulação em imóveis já parcelados, mas essa hipótese deve ser vista com muita cautela por parte dos operadores da Reurb.”

Finalmente, não se desconhece o teor do item 275, do Cap. XX das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça que assim dispõe:

“275. Para a Reurb de núcleo urbano decorrente de empreendimento registrado, em que não foi possível realizar, por qualquer modo, a titulação de seus ocupantes, a CRF será apresentada de modo simplificado, devendo apenas atestar a implantação do núcleo nos exatos termos do projeto registrado e conter a listagem descrita no item VI.”

Contudo, in casu, não se demonstrou a impossibilidade da loteadora, PREFEITURA MUNICIPAL, em outorgar os títulos definitivos dos lotes, já matriculados. Ao contrário, como apontado na exordial pelo Senhor Oficial já existem lotes titulados em nome dos beneficiários finais a indicar sua viabilidade.

Ante o exposto, pelo meu voto, nego provimento à apelação.

FERNANDO ANTONIO TORRES GARCIA

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Nota:

[1] Macedo, Paola de Castro Ribeiro. Regularização Fundiária Urbana e seus Mecanismos de Titulação dos Ocupantes: Lei n.º 13.465/2017 e Decreto n.º 9.310/2018/Paola de Castro Ribeiro Macedo. – – São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022. – – (Coleção Direito Imobiliário; Vol. V / Alberto Gentil de Almeida Pedroso, coordenador). (DJe de 14.11.2023 – SP)

Fonte: DJE/SP

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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