1VRP/SP: Registro de Imóveis. Alienação Fiduciária. Impossibilidade de registro do instrumento particular do novo negócio, aditamento que altera a estrutura contratual da alienação fiduciária original, modificando o elemento subjetivo do negócio jurídico pactuado, mediante a inclusão de uma nova coproprietária do imóvel e devedora fiduciante, que não figurava no primeiro título (há novação).

Processo 1115879-92.2024.8.26.0100

Pedido de Providências – Registro de Imóveis – Bárbara Fonseca Felizatto – Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido de providências para manter o óbice registrário. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo. P.R.I.C. – ADV: BÁRBARA FONSECA FELIZATTO (OAB 425099/SP), EVERTON LOPES BOCUCCI (OAB 299868/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo nº: 1115879-92.2024.8.26.0100

Classe – Assunto Pedido de Providências – Registro de Imóveis

Requerente: Décimo Cartório de Registro de Imóveis

Requerido: Bárbara Fonseca Felizatto

Juíza de Direito: Dra. Renata Pinto Lima Zanetta

Vistos.

Trata-se de pedido de providências formulado pelo Oficial do 10º Registro de Imóveis da Capital, a requerimento de Everton Lopes Bocucci e Bárbara Fonseca Felizatto, diante de negativa em se proceder à averbação de instrumento particular de aditamento, envolvendo o imóvel objeto da matrícula n. 127.392 daquela serventia.

O Oficial informa que os suscitados apresentaram instrumento particular de aditamento, protocolado sob o n. 622.340, visando incluir, na matrícula n. 127.392, como coproprietária e devedora fiduciante, a suscitada Bárbara Fonseca Felizatto, alegando que houve erro e omissão, quando da formalização do instrumento particular de financiamento para aquisição de imóvel, venda e compra e constituição de alienação fiduciária que deu origem aos registros nºs. 13 e 14 na matrícula n. 127.392 do 10º RI; que, tratando-se de ato de averbação, e não de ato de registro em sentido estrito, nos termos do item 39.7 do Cap. XX das NSCGJ, requer seja o presente acolhido como pedido de providências; que em 01 de dezembro de 2023, fora registrado na matrícula n. 127.392 o “instrumento particular de financiamento para aquisição de imóvel, venda e compra e constituição de alienação fiduciária, entre outras avenças”, pelo qual Everton Lopes Bocucci adquiriu o referido imóvel, o qual foi alienado fiduciariamente, em ato subsequente, ao Banco Bradesco S/A.

O Oficial informa que o título objeto da prenotação foi desqualificado, pois o negócio jurídico celebrado está perfeito e acabado, inclusive produzindo seus efeitos “erga omnes” a partir do registro do título (art. 172 da LRP), não podendo ser admitida a inclusão de uma segunda compradora e devedora fiduciante, com base em aditamento do título original; que a parte suscitada aduz que “o título registrado pelo oficial de registro de imóveis contém um erro crasso em sua formação, pois uma das pessoas constantes do negócio jurídico entabulado desde o início não estava presente no referido instrumento registrado, o que torna um título anulável, tratando-se de nulidade relativa”, que entende poder ser sanada com o registro do instrumento particular de aditamento.

O Oficial esclarece que o registro retrata exatamente o título que lhe deu causa, não tendo havido erro ou omissão na transposição de elementos do instrumento apresentado a registro que pudesse agora ser inserido, conforme faculta o art. 213, I, da Lei n. 6.015/73; que, além disso, a alteração pretendida modifica substancialmente o negócio jurídico, produzindo efeitos “erga omnes” a partir do registro; que eventual vício na formação do negócio é intrínseco e não pode ser avaliado nesta esfera administrativa (fls. 01/03).

Documentos vieram às fls. 04/80.

Em manifestação dirigida ao Oficial, e em impugnação, a parte interessada sustentou que o Banco Bradesco, apesar de ter recebido todos os documentos dos compradores e devedores fiduciantes para formalização do “instrumento particular de financiamento para aquisição de imóvel, venda e compra e constituição de alienação fiduciária, entre outras avenças” deixou de incluir no contrato principal n. 9155850, como coproprietária e devedora fiduciante, a suscitada Bárbara Fonseca Felizatto; que o título foi registrado na matrícula (R.13 e R.14) apenas em nome do comprador e devedor fiduciante Everton Lopes Bocucci, o que não expressa a verdade dos fatos, vez que o imóvel foi comprado em conjunto com Bárbara Fonseca Felizatto, que pagou 50% do bem com recursos próprios; que a instituição financeira reconheceu o erro cometido no primeiro contrato e, visando corrigi-lo, elaborou instrumento particular de aditamento ao contrato n. 9155850, datado de 27/12/2023; que a desqualificação do instrumento de aditamento deve ser afastada, por entender que o contrato principal n. 9155850, já registrado, abarca nulidade relativa, em razão de equívoco perpetrado pelo Banco Bradesco, e que o negócio jurídico somente será considerado válido com o registro do instrumento de aditamento para correção do erro ocorrido; que, deste modo, requer o registro do título prenotado para correção do erro do título já registrado na matrícula n. 127.392 ou, alternativamente, a averbação do título prenotado, a fim de incluir a suscitada Bárbara como compradora e devedora fiduciante (fls. 13/22 e 81/93).

O Ministério Público ofertou parecer, opinando pela procedência da dúvida (fls. 96/100).

É o relatório.

FUNDAMENTO e DECIDO.

De início, vale ressaltar que, embora a parte interessada defenda que se trata de registro em sentido estrito, tendo em vista que o título devolvido destina-se apenas à retificação de registro já efetuado, estamos diante de hipótese de averbação.

No mérito, o pedido é procedente, para manter o óbice.

A parte busca o registro de instrumento particular de aditamento ao instrumento de financiamento para aquisição de imóvel, venda e compra e constituição de alienação fiduciária (contrato n. 9155850), o qual modifica a estrutura contratual para acrescentar um novo sujeito ao negócio jurídico anteriormente celebrado, visando incluir, na matrícula n. 127.392 do 10º Registro de Imóveis da Capital, como coproprietária e devedora fiduciante, a suscitada Bárbara Fonseca Felizatto.

Entretanto, constata-se que, em 01 de dezembro de 2023, fora ultimado o registro do “instrumento particular de financiamento para aquisição de imóvel, venda e compra e constituição de alienação fiduciária, entre outras avenças” (contrato n. 9155850) na matrícula n. 127.392 do 10º RI, pelo qual Everton Lopes Bocucci adquiriu o imóvel, o qual foi alienado fiduciariamente, em ato subsequente, ao Banco Bradesco S/A. (R.13/127.329 e R.14/127.392 – fl. 11).

O registro que se pretende alterar guardou perfeita consonância com o título que deu origem a ele (fls. 49/80), não se vislumbrando qualquer das hipóteses elencadas na Lei de Registros ou nas Normas de Serviço que possibilitam retificação.

De fato, no que tange à retificação, dispõem os artigos 110 e 213 da Lei de Registros Públicos:

“Art. 110. O oficial retificará o registro, a averbação ou a anotação, de ofício ou a requerimento do interessado, mediante petição assinada pelo interessado, representante legal ou procurador, independentemente de prévia autorização judicial ou manifestação do Ministério Público nos casos de:

I – erros que não exijam qualquer indagação para a constatação imediata de necessidade de sua correção;

II – erro na transposição dos elementos constantes em ordens e mandados judiciais, termos ou requerimento, bem como outros titulos a serem registrados, averbados ou anotados, e o documento utilizado para a referida averbação e/ou retificação dicará arquivado no registro no cartório;

(…)”.

“Art. 213. O oficial retificará o registro ou a averbação:

I – de ofício ou a requerimento do interessado nos casos de:

a) omissão ou erro cometido na transposição de qualquer elemento do título;

(…)

g) inserção ou modificação dos dados de qualificação pessoal das partes, comprovada por documentos oficiais, ou mediante despacho judicial quando houver necessidade de produção de outras provas;

(…)”

Nestes termos, ainda, os itens 135 e 135.1, Capítulo XX, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça do Tribunal de Justiça de São Paulo:

“135. A retificação administrativa de erro constante do registro será feita pelo Oficial de Registro de Imóveis ou através de procedimento judicial, a requerimento do interessado.

135.1 O oficial retificará o registro ou a averbação, de ofício ou a requerimento do interessado, quando se tratar de erro evidente e nos casos de:

a) omissão ou erro cometido na transposição de qualquer elemento do título;

(…)

g) inserção ou modificação dos dados de qualificação pessoal das partes, comprovada por documentos oficiais, exigido despacho judicial quando houver necessidade de produção de outras provas. (…)”.

Assim, ausente base legal, não se pode autorizar o ingresso de instrumento particular de aditamento pactuado com o intuito específico de modificar a essência de negócio já incluído regularmente no fólio real.

Segundo os suscitados, todos os contratantes reconhecem que o título registrado padeceria de vício intrínseco, em virtude de erro perpetrado pela instituição financeira, credora fiduciária.

Pelo princípio da legitimação (eficácia do registro), os vícios reconhecíveis na via administrativa são apenas aqueles comprováveis de pleno direito que resultem de erros evidentes extrínsecos ao título, sem necessidade de exames de outros documentos ou fatos (artigos 214, caput, e 252 da Lei n. 6.015/73).

Não é demais reforçar que este juízo possui competência administrativa e disciplinar e não pode analisar questões de direito material que envolvam o negócio jurídico, consoante reiterada jurisprudência da E. Corregedoria Geral da Justiça:

“NULIDADE DO REGISTRO. Artigo 214 da Lei de Registros Públicos. Nulidade do Registro (modo) e não do título. Somente é cabível na via administrativa o conhecimento de vício atinente à nulidade direta do registro e não do título (vício intrínseco). Nulidade do título somente é passível de conhecimento na via jurisdicional. Recurso não provido.” (CGJ proc. n. 1050759-49.2017.8.26.0100, DJ 13.03.2018)

“REGISTRO DE IMÓVEIS. Registro de alienação fiduciária. Eventuais vícios do título que só podem prejudicar o registro, por via oblíqua, mediante atuação da jurisdição. Via administrativa inapropriada. Art. 214, da Lei n° 6.015/73, inaplicável. Recurso desprovido.” (CGJ proc. n. 0006400-50.2013.8.26.0236, DJ 11/10/16)

“REGISTRO DE IMÓVEIS. Pedido de Providências que visa cancelar ou retificar o registro. Inexistência de nulidade formal e extrínseca, relacionada exclusivamente ao registro. Inaplicabilidade do artigo 214 da Lei de Registros Públicos. Vício exclusivo do título, de natureza intrínseca. Hipótese que se enquadra no artigo 216 da Lei de Registros Públicos. Recurso não provido.” (CGJ parecer n. 2015/76433, DJ 07/07/15)

Na doutrina de Narciso Orlandi Neto:

“Não se pode, à guisa de corrigir erros, modificar o negócio jurídico celebrado, substituindo-o por outro, como seria a transformação de uma venda e compra numa doação, ou vice-versa. Erro dessa espécie, que pode ter acontecido, pode ser corrigido, mas com a celebração do negócio realmente pretendido e a satisfação das exigências legais.” (Ata Notarial e a Retificação do Registro Imobiliário in Ata Notarial.

Amaro Moraes e Silva Neto et al.; coord. Leonardo Brandelli Porto Alegre: Instituto de Registro Imobiliários do Brasil: S. A. Fabris, 2004, p. 151/183).

Em outras palavras, o ato registral que se pretende modificar está formalmente perfeito e acabado, posto que adstrito ao título de origem, não comportando qualquer alteração.

Assim, para adequada solução do impasse, as partes que participaram do ato registrado podem formalizar requerimento unânime, na forma do artigo 252, inciso I, da Lei de Registros Públicos, para que se proceda o cancelamento dos registros precedentes (R.13/127.329 e R.14/127.392 – fl. 11) (por averbação), e, somente então, a efetivação dos atos de registro em sentido estrito (compra e venda e alienação fiduciária) concernentes ao título (contrato principal e seus aditamentos) em que constam como coproprietários e devedores fiduciantes Everton Lopes Bocucci e Bárbara Fonseca Felizatto.

Observa-se, ademais, que o novo negócio, aditamento firmado em 27 de dezembro de 2023, altera a estrutura contratual da alienação fiduciária original, modificando o elemento subjetivo do negócio jurídico pactuado em 16 de novembro de 2023, mediante a inclusão de uma nova coproprietária do imóvel e devedora fiduciante, que não figurava no primeiro título.

A ocorrência da novação, como forma indireta de extinção das obrigações, depende não só da intenção inequívoca de novar (art. 361 do Código Civil), mas da existência concreta de substituição de alguma das partes da relação obrigacional ou do objeto da prestação originária.

No caso, o novo negócio, aditamento firmado em 27 de dezembro de 2023, altera as partes da relação obrigacional do negócio celebrado em 16 de novembro de 2023, configurando novação. Por esse mesmo ângulo, mas tratando especificamente da garantia fiduciária, nega-se a averbação de aditamento contratual com alterações substanciais.

Destarte, mostra-se acertado o óbice registrário.

Diante do exposto, JULGO PROCEDENTE o pedido de providências para manter o óbice registrário.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo.

P.R.I.C.

São Paulo, 05 de agosto de 2024.

Renata Pinto Lima Zanetta

Juíza de Direito (DJe de 06.08.2024 – SP)

Fonte: DJE/SP.

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CNJ: Corregedoria investigará atuação de juízes de paz que se recusaram a realizar casamento homoafetivo.

O corregedor nacional de Justiça, ministro Luis Felipe Salomão, determinou a abertura de Pedido de Providências para apurar a conduta de juízes de paz da cidade de Redenção, no Ceará, que se recusaram a realizar a cerimônia de casamento de um casal homoafetivo.

Em sua decisão, Salomão destacou que a justificativa do princípio da “escusa de consciência religiosa” não encontra respaldo na Lei de Organização Judiciária do Estado do Ceará e que a celebração de casamento em cartório constitui ato de caráter civil, e não religioso.

A Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Ceará terá o prazo de cinco dias para prestar esclarecimentos sobre o caso e adotar as providências necessárias à celebração do casamento.

Resolução CNJ 175/2013 veda a recusa de celebração de casamento civil entre pessoas de mesmo sexo, bem como determina a imediata comunicação do caso ao juiz corregedor para as providências cabíveis.

Fonte: Conselho Nacional de Justiça.

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CNJ: Mesmo com mudanças sociais e culturais, ausência do nome do pai no registro ainda é desafio no país.

No Brasil, entre janeiro de 2016 e julho de 2024, dos 23,1 milhões de nascimentos, pouco mais de 1,2 milhão de crianças foram registradas somente com o nome da mãe. Neste Dia dos Pais, os dados divulgados no Portal da Transparência do Registro Civil, mostram uma realidade que altera o panorama social das famílias, sobrecarrega mães – emocional e financeiramente – e impõe às crianças um grave abandono afetivo. Para além da responsabilização, a ausência do nome do pai revela ainda o surgimento de novos contextos sociais que incluem a ruptura nos padrões convencionais de parentalidade.

O Conselho Nacional de Justiça vem atuando junto a tribunais e cartórios para assegurar esse direito básico. Desenvolvido pelo CNJ, e implantado nos 7.324 cartórios com competência para registro civil do país, o programa “Pai Presente”, por exemplo, busca identificar os pais que não registraram os filhos. O programa foi instituído em 2010 e tem por base os Provimentos 12 e 16 da Corregedoria Nacional de Justiça.

A iniciativa é replicada em diversos tribunais de todo o país. Seja em campanhas ou em ações pontuais, o Poder Judiciário vem intensificando os atendimentos a todos que necessitem identificar a paternidade. Nesses casos, os atendimentos também contemplam aqueles que já tenham processos em tramitação no Judiciário.

Em julho deste ano, o Tribunal de Justiça do Amapá (TJAP) realizou ação de reconhecimento de paternidade em uma unidade prisional. O processo de reconhecimento atende tanto pais de crianças quanto de pessoas adultas que nunca foram registradas. Ainda em âmbito estadual, neste mês de agosto, o Tribunal de Justiça do Mato Grosso (TJMT) disponibilizará serviços como agendamento de audiências e exames de DNA gratuitos, entre os dias 12 e 16. Os interessados poderão emitir, por meio do Cartório de Registro Civil, novas certidões de nascimento.

Afeto como condição

Se em um passado recente a filiação vinculada ao casamento filológico – entre pai e a mãe – determinava boa parte dos registros, a realidade atual contempla novos acordos, nos quais o afeto é a condição eleita para efetivar os registros civis. A multiparentalidade, conceito que reconhece outras estruturas socioafetivas e não se limita à conjugalidade ou à consanguinidade dos genitores, vem promovendo mudanças significativas no contexto social brasileiro.

Márcia Fidélis, registradora civil de Belo Horizonte (MG) e presidente da Comissão Nacional de Registro Público do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), afirma que a estranheza provocada pelo nome de duas pessoas do mesmo sexo no campo de filiação está com os dias contados. “A multiparentalidade é a possibilidade de termos, por exemplo, duas irmãs como mães socioafetivas ou mesmo casais homoafetivos. No sentido prático é uma pequena mudança, mas no campo do direito das famílias é uma revolução. Saímos de uma família patriarcal para uma família plural”, destacou.

A omissão do pai – ou de uma das partes responsável – no registro e no cuidado ao longo da vida implica em uma sobrecarga para a mãe. “Se não houvesse uma mãe que estruturasse a família, assumindo a educação, a criação do filho e o sustento, talvez o número de pais ausentes seria diferente”, avalia Márcia.

Reconhecimento acessível

A ausência do nome do pai no registro impede que o genitor tenha legitimidade jurídica para exercer sua paternidade, sobretudo quando a criança é muito pequena. Para Márcia Fidélis, o não registro é, em essência, uma irresponsabilidade.

Embora a falta do nome paterno na certidão de uma criança não esteja diretamente ligada a uma ou outra classe social específica, é um fato mais presente na vida de pessoas que são mais vulneráveis social e economicamente como explica diretora do IBDFAM. “As mães mais novas, que viveram já em um ambiente desestruturado, enfrentam mais dificuldades. A falta de condição financeira, principalmente, torna mais complicada a contratação de um advogado que possa entrar com uma ação de investigação de paternidade”, completou.

A registradora Márcia Fidélis aponta as facilidades disponibilizadas pelos cartórios nos últimos anos, como a possibilidade que é facultada à mãe de indicar o nome do possível pai no ato do registro do nascimento. Neste caso, a mãe informa o endereço do suposto pai, que será intimidado a comparecer ao juiz da infância e juventude destacado para cuidar da situação. Se o pai se recusar a fazer esse reconhecimento, o caso é enviado ao Ministério Público, que entra com uma ação de reconhecimento de paternidade na qual haverá teste de DNA. Além disso, o ato de registro de reconhecimento de paternidade é gratuito em todo território brasileiro.

Desconstrução

Repensar e fortalecer a paternidade é um dos muitos objetivos da consultoria sobre Parentalidades, Equidade de Gênero e Economia do Cuidado, 4Daddy. Leandro Crespo, um dos fundadores da instituição, lembra que a falta de reconhecimento paterno pode gerar sentimentos de rejeição e insegurança, impactando negativamente a autoestima e o desenvolvimento emocional da criança. “A ausência paterna reforça estereótipos de gênero e perpetua a desigualdade. Isso perpetua a visão tradicional de gênero, na qual o homem é visto como o provedor financeiro e a mulher como a cuidadora, dificultando a construção de uma sociedade mais igualitária”, explicou.

A 4Daddy promove cursos de letramento, sensibilização e engajamento que contribuem para formação de novos homens, mais conscientes. “Ao abordar temas como paternidade responsável, igualdade de gênero, cultura antimachista, combate às violências, vieses inconscientes, estamos criando uma nova consciência entre os homens. Esses programas são projetados para alcançar homens de diferentes contextos sociais e econômicos, utilizando abordagens que ressoam com suas realidades e experiências”, ressaltou.

O trabalho de conscientização realizado por empresas sociais ou por políticas públicas promete mudar o quadro de abandono paterno. Na avaliação do presidente da Associação Nacional dos Registradores de Pessoas Naturais (Arpen-Brasil), Gustavo Fiscarelli, a mudança gradual vem acontecendo em todo o país há vários anos. No entanto, ações específicas ainda são necessárias. “Muitos lugares do Brasil, isolados, ainda demandam uma atuação pontual do Poder Público. Todas as esferas (judicial e extrajudicial) precisam se mobilizar para que a informação chegue e, junto com ela, a conscientização pelos direitos dessas crianças. Estamos falando de uma medida de direitos, mas também de uma questão de humanização”, afirmou.

Fiscarelli enfatiza que a criança tem direito ao pai e em ter na sua certidão o nome do seu pai. “Sabemos o que isso acarreta para a criança estruturalmente, psicologicamente. Ter o pai registral significa conferir à criança todos os direitos decorrentes dessa linhagem. Nesse sentido, é fundamental que possamos fomentar iniciativas que são a essência do registro civil”, concluiu.

Texto: Ana Moura
Edição: Lenir Camimura

Fonte: Conselho Nacional de Justiça.

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