STJ: É nula notificação que não indica corretamente o credor fiduciário

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu que há nulidade na notificação para constituir em mora o devedor fiduciante de imóvel quando dela consta nome de pessoa diversa do real credor fiduciário. No caso julgado, o credor era o Consórcio Nacional Cidadela, mas a notificação foi feita em nome da Caixa Econômica Federal.

Para a Turma, a notificação do devedor fiduciante possui requisitos especiais que, se não seguidos, acarretam nulidade: “A repercussão da notificação é tamanha que qualquer vício em seu conteúdo é hábil a tornar nulos seus efeitos, principalmente quando se trata de erro crasso, como há na troca da pessoa notificante.”

O recurso interposto pelo consórcio era contra decisão do Tribunal de Justiça do Paraná que reconheceu a nulidade da constituição em mora do devedor pela ausência da notificação e pela realização do ato por meio de cartório fora da situação do imóvel (artigo 26, paragrafo 3°, da Lei 9.514/97).

O credor sustentou o cabimento da notificação por cartório de comarca diversa da situação do imóvel ou do domicílio do devedor. Para ele, a errônea indicação do credor fiduciário na notificação extrajudicial não a torna nula, já que os dados referentes ao contrato celebrado e ao cartório de registro do imóvel estavam corretos, tratando-se de mero erro material, incapaz de gerar prejuízo ao devedor.

Segundo o credor, não havia dúvida de que a notificação era relativa ao imóvel objeto do pacto de alienação fiduciária celebrado entre as partes, e portanto ela cumpriu sua finalidade.

Domicílio diferente

Ao analisar o recurso, o relator, ministro Luis Felipe Salomão, afastou a tese de nulidade da notificação por ter sido expedida por cartório diverso da situação do imóvel ou do domicílio dos demandados.

De acordo com Salomão, a Segunda Seção pacificou o entendimento de que a notificação extrajudicial entregue no endereço do fiduciante, por via postal e com aviso de recebimento, é válida quando realizada por cartório de títulos e documentos de outra comarca, mesmo que não seja aquela do domicílio do devedor.

“A notificação é ato jurídico em sentido estrito, por meio do qual se dá ciência a alguém a fim de que realize ou se abstenha de determinada conduta, sob cominação de pena, sendo, portanto, instrumento de realização do direito que pode constituir, extinguir ou modificar relação jurídica com diversas consequências, tais como constituição em mora do devedor, conservação de direitos, prevenção de responsabilidades, extinção de contrato, interrupção da prescrição, entre outras”, acrescentou o ministro. 

Simples e rápido

Luis Felipe Salomão destacou que a alienação fiduciária de coisa imóvel veio definida pelo artigo 22 da Lei 9.514: é o negócio jurídico pelo qual o devedor, ou fiduciante, com o objetivo de garantia, contrata a transferência ao credor, ou fiduciário, da propriedade resolúvel de coisa imóvel.

Dessa forma, há a transmissão da propriedade do devedor fiduciante ao credor fiduciário como direito real de garantia de caráter resolúvel, mediante o registro, ocorrendo o desdobramento da posse, tornando-se o fiduciante possuidor direto e o fiduciário possuidor indireto do bem.

Para o relator, essa é uma forma de conferir procedimento legal específico muito mais rápido e simples do que a execução de hipoteca e demais garantias, pois permite agilidade na execução do bem para satisfação de eventual débito vencido e não pago.

De forma extrajudicial (o procedimento se dá apenas no cartório imobiliário), o agente notarial notifica o devedor fiduciante, constituindo-o em mora. Persistindo a inadimplência (período de 15 dias), consolida-se a propriedade do imóvel em nome do fiduciário, com a consequente e posterior venda do bem em leilão.

Nome errado

Já quanto ao erro na identificação do credor, Salomão destacou que não há notificação por parte do consórcio recorrente. O que há é uma notificação da Caixa Econômica Federal em desfavor dos recorridos. 

Segundo o ministro, não há como admitir que o ato do cartório tenha conseguido atingir seu objetivo de dar ciência ao devedor fiduciante da intenção do fiduciário em receber o que lhe é devido, no prazo legal, sob pena de perda da propriedade em favor do credor. 

De acordo com o ministro, a dívida vencida, por si só, não é bastante para caracterizar a mora do devedor fiduciante. Ele esclareceu que, apesar de a mora do devedor ocorrer quando ele não faz o pagamento nas condições combinadas, na alienação fiduciária de imóvel, por imposição legal, essa mora precisa ser exteriorizada, reconhecendo-se o inadimplemento em cartório e rompendo-se definitivamente a relação contratual.

O relator destacou ainda que o princípio dies interpellat pro homine (o dia interpela pelo homem) não é suficiente para assegurar o direito do credor fiduciário, pois, de acordo com o artigo 26 da Lei 9.514, impõe-se obrigatoriamente a constituição em mora do devedor fiduciante, o que atrai a incidência do artigo 397, parágrafo único, do Código Civil.

A notícia refere-se ao seguinte processo: REsp 1172025.

Fonte: STJ | 25/11/2014.

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STJ: DIREITO CIVIL. ERRO NA INDICAÇÃO DO CREDOR FIDUCIÁRIO EM NOTIFICAÇÃO EXTRAJUDICIAL.

É nula a notificação extrajudicial realizada com o fim de constituir em mora o devedor fiduciante de imóvel, quando na referida comunicação constar nome diverso do real credor fiduciário. A notificação em questão (art. 26 da Lei 9.514/1997), para além das consequências naturais da constituição do devedor fiduciante em mora, permite, em não havendo a purgação da mora, o surgimento do direito de averbar na matrícula do imóvel a consolidação da propriedade em nome do credor notificante, isto é, do fiduciário. Justamente por isso que a referida notificação/intimação do devedor fiduciante possui requisitos especiais que, se não seguidos, acarretam sua nulidade. Desse modo, a repercussão da notificação é tamanha que qualquer vício em seu conteúdo é hábil a tornar nulos seus efeitos, principalmente quando se trata de erro crasso, como há na troca da pessoa notificante. REsp 1.172.025-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 7/10/2014. 

Fonte: Informativo nº. 0550 do STJ.

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CSM/SP: Registro de imóveis – Dúvida – Contrato de locação com cláusula de vigência superior a um ano – Alienação fiduciária sobre o imóvel locado – Necessidade da anuência do credor fiduciário para o registro da locação – Artigo 37-b da lei n. 9.514/97 – Recusa do oficial adequada – Recurso não provido.

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação n° 0065836-57.2013.8.26.0100

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n° 0065836-57.2013.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante AUTO POSTO MELLO PEIXOTO LTDA, é apelado 9º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "POR MAIORIA DE VOTOS, NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO. DECLARARÃO VOTOS CONVERGENTE O DES. ARTUR MARQUES DA SILVA FILHO E DIVERGENTE O DES. RICARDO MAIR ANAFE.", de conformidade com o voto do(a) Relator(a), que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores RENATO NALINI (Presidente), EROS PICELI, GUERRIERI REZENDE, ARTUR MARQUES, PINHEIRO FRANCO E RICARDO ANAFE.

São Paulo, 2 de setembro de 2014.

HAMILTON ELLIOT AKEL

CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Apelação Cível n° 0065836-57.2013.8.26.0100

Apelante: Auto Posto Mello Peixoto LTDA

Apelado: 9º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

VOTO N° 34.075

Registro de imóveis – Dúvida – Contrato de locação com cláusula de vigência superior a um ano – Alienação fiduciária sobre o imóvel locado – Necessidade da anuência do credor fiduciário para o registro da locação – Artigo 37-b da lei n. 9.514/97 – Recusa do oficial adequada – Recurso não provido.

AUTO POSTO MELLO PEIXOTO LTDA. Interpôs apelação contra a sentença das fls. 72/74, que julgou procedente dúvida suscitada pelo 9º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital, mantendo a recusa de registro do contrato de locação, com cláusula de vigência superior a um ano, do imóvel de matrícula 11.120, por falta de anuência do credor fiduciário nos termos do artigo 37-B da Lei n. 9.514/97.

A apelante sustenta que do instrumento de confissão de dívida e alienação fiduciária constou expressamente a descrição do imóvel de matrícula 11.120, o que evidenciaria a ciência do credor fiduciário quanto à locação, mesmo porque essa última é anterior à alienação fiduciária. Além disso, alega a impossibilidade de obter a anuência expressa do credor fiduciário, pois a fiduciante estaria "em processo de decretação de falência" e seu contrato poderá ser abruptamente rescindido caso não consiga a anuência do credor fiduciário (fls. 95/101).

A Procuradoria Geral de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fls. 112/114).

É o relatório.

O recurso não comporta provimento, impondo-se a manutenção da decisão proferida pelo Juiz Corregedor Permanente.

O registro do contrato de locação não pode ser deferido, ausente a anuência do credor fiduciário, destacando-se que não há como presumi-la do simples fato do contrato de locação ser anterior à alienação fiduciária, mesmo porque o primeiro sequer estava registrado ao tempo da constituição da garantia.

Além disso, o artigo 37-B da Lei n. 9.514/97 é expresso ao considerar ineficaz, e sem qualquer efeito perante o fiduciário ou seus sucessores, a contratação ou a prorrogação de locação de imóvel alienado fiduciariamente por prazo superior a um ano sem concordância por escrito do fiduciário.

A cláusula 3ª do Contrato de Locação em questão (fl. 05) prevê prazo de vigência de quinze anos, com início em 1º de janeiro de 2009 e término em 31 de dezembro de 2023. A concordância expressa do credor fiduciária era, pois, medida de rigor, salvo se houvesse cancelamento da propriedade fiduciária constituída por meio do R. 20 da matrícula 11.120.

As demais questões trazidas pelo recorrente não constituem justificativa a impor o registro pretendido. Assim, correta a recusa do Oficial de Registro de Imóveis.

Posto isso, nego provimento ao recurso.

HAMILTON ELLIOT AKEL

CORREGEDOR GERAL DA JUSTIÇA E RELATOR

Apelação Cível n° 0065836-57.2013.8.26.0100

Apelante: Auto Posto Mello Peixoto Ltda.

Apelado: 9º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo

DECLARAÇÃO DE VOTO CONVERGENTE

VOTO N. 27.515

1. Trata-se de autos de dúvida em que se interpôs apelação contra sentença pela qual o Juízo Corregedor Permanente manteve as exigências do 9º Ofício de Registro de Imóveis de São Paulo e denegou o registro stricto sensu de um contrato de locação com cláusula de vigência (LRP/1973, art. 167, I, 3), porque o imóvel foi alugado por prazo superior a um ano, sem anuência do credor fiduciário (Lei 9.514/1997, art. 37-B).

2. O eminente Desembargador Relator nega provimento à apelação para que seja mantido o óbice ao registro stricto sensu, pois a locação foi celebrada pelo prazo de quinze anos, e não há nada que indique ou permita presumir o consentimento do credor fiduciário.

Realmente, a lei exige que o credor fiduciário dê a sua concordância por escrito, ou seja, expressamente, e isso não se deu. Além disso, o só fato de a alienação fiduciária ser posterior à locação não se pode interpretar como anuência e, ainda que tal interpretação fosse cabível, não poderia ela afastar a exigência da Lei 9.514/1997, art. 37-B, que exige concordância por escrito. Isto é, há disposição legal expressa exigindo anuência firmada por escrito.

Observe-se, outrossim, que a Lei 9.514/1997, art. 37-B, estabelece que o contrato tem de ser considerado ineficaz e de nenhum efeito. Portanto, admitindo-se o registro seria dar-lhe alguma eficácia transversa, em detrimento do fiduciário, já que a oponibilidade da locação pode, indiretamente, prejudicar-lhe os interesses, se e quando se fizer conveniente a cessão da posição do fiduciante (Lei 9.514/1997, art. 29).

3. Ante o exposto, nego provimento ao recurso de apelação.

ARTUR MARQUES DA SILVA FILHO

Presidente da Seção de Direito Privado

Apelação Cível n. 0065836-57.2013.8.26.0100

Apelante: Auto Posto Mello Peixoto LTDA

Apelado: 9º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital

TJSP – VOTO N° 19.331

DECLARAÇÃO DE VOTO DIVERGENTE

Registro de Imóveis.

Recurso contra decisão que negou o registro de contrato de locação com cláusula de vigência em caso de alienação, superior a um ano – Inteligência do artigo 167, 3, da Lei 6.015/73 e do artigo 37 – B da Lei 9.514/97 – Necessidade de concordância por escrito do credor fiduciário para eficácia do contrato em relação a este e seus sucessores – Existência, validade e eficácia: planos distintos que não impossibilitam o registro do contrato de locação, o qual existe, é válido e eficaz entre as partes contratantes (locador e locatário).

Recurso provido.

1. Cuida-se de apelação contra decisão proferida pelo Juízo Corregedor Permanente do 9º Oficial de Registro de Imóveis da Comarca da Capital, que negou pedido de registro de contrato de locação com cláusula de vigência em caso de alienação, superior a um ano, por força de restrição prevista no artigo 37-B da Lei 9.514 de 1997, a exigir anuência do credor fiduciário.

É o relatório.

2. Respeitado entendimento do Excelentíssimo Desembargador Relator Corregedor Geral da Justiça, ouso discordar, data venia.

De acordo com o artigo 167, 3, da Lei 6.015/73, será feito o registro "dos contratos de locação de prédios, nos quais tenha sido consignada cláusula de vigência no caso de alienação da coisa locada". Essa a hipótese dos autos (vide cláusula 19ª do contrato em questão — fl. 07).

Por outro lado, assim dispõe o artigo 37-B da Lei 9.514 de 1997, incluído pela Lei 10.931 de 2004:

Será considerada ineficaz, e sem qualquer efeito perante o fiduciário ou seus sucessores, a contratação ou a prorrogação de locação de imóvel alienado fiduciariamente por prazo superior a um ano sem concordância por escrito do fiduciário.

A anuência do credor fiduciário imposta pelo artigo 37-B da Lei 9.514 de 1997 ("por escrito") não é elemento de existência nem requisito de validade do contrato de locação, o qual existe, é válido e eficaz entre locador e locatário. [1] Feito o registro desse contrato será também eficaz em relação a terceiros, com exceção do credor fiduciário e sucessores, por não haver anuência escrita respectiva.

Importante anotar que para a existência e validade de um contrato de locação, não se exige do locatário o título dominial do bem locado, senão a posse direta. Essa posse está garantida ao fiduciante (artigo 23, parágrafo único, da Lei 9.514 de 1997).

Demais, eventual consolidação da propriedade em mãos do credor fiduciário levará, inexoravelmente, à extinção do contrato de locação, não obstante a cláusula de vigência, ex vi do disposto no artigo 27, § 7º, da Lei 9.514/97.

Mutatis mutandis, é o que se dá, por exemplo, quando se registra escritura de compra e venda em fraude à execução. O negócio jurídico existe, é válido e eficaz entre as partes contratantes (inclusive o respectivo registro, que não deverá ser anulado), mas será ineficaz em relação ao credor exequente.

Por epítome, porque a anuência do credor fiduciário não interfere nos planos da existência, validade e eficácia do contrato entre locador e locatário, é o caso de se deferir o registro do contrato de locação, nos moldes pleiteados.

3. Ante o exposto, pelo arrimo esposado, pelo meu voto, dá-se provimento ao recurso.

Ricardo Anafe

Presidente da Seção de Direito Privado.

Notas:

[1] A propósito, conferir AZEVEDO, Antônio Junqueira de. Negócio Jurídico: existência, validade e eficácia. 3ª ed. São Paulo: Saraiva, 200

Fonte: DJE/SP | 08/10/2014.

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