Consulta – Provimento CNJ 45/2015 – Lançamento de despesas – Locação de bens móveis e imóveis utilizados na prestação dos serviços cartorários – Propriedade do próprio interino – Inexistência de vedação na norma de regência – Possibilidade de remuneração do interino mediante recursos públicos – Observância das condições em que a relação entre custo e benefício esteja devidamente parametrizada pelos preços de mercado e por regulamentação adequada – 1. Consulta acerca da interpretação do art. 8º, letra “a”, do Provimento CNJ 45/2015, no que tange à autorização de que os preços correspondentes às locações de bens móveis e imóveis, de propriedade do próprio interino e utilizados na prestação de serviços notariais e de registro, sejam lançados como despesas das serventias extrajudiciais – 2. O Provimento CNJ 45/2015 consolidou as normas relativas à manutenção e escrituração dos livros Diário Auxiliar, Visitas e Correições e Controle de Depósito Prévio, normas estas aplicáveis tanto aos delegatários quanto aos responsáveis interinos do serviço notarial e de registro – 3. À luz de sua sistemática normativa, não há vedação para que o responsável interino seja remunerado pela locação, paga com recursos públicos, previamente autorizada pela Corregedoria local, de bens móveis e imóveis de sua propriedade necessários e úteis postos à disposição da serventia extrajudicial vaga, em condições nas quais a relação entre custo e benefício esteja devidamente parametrizada pelos preços de mercado e por regulamentação adequada – 4. Relativamente às serventias extrajudiciais vagas, na ausência de norma federal, compete ao Estado, no exercício de sua autonomia, decidir sobre as melhores condições para a prestação do serviço público que retornou à sua esfera de atribuições, de sorte que, a partir da extinção da delegação, lhe cabe avaliar se irá preservar as condições sob as quais o serviço outrora delegado era prestado, bem como se irá introduzir (ou não) novos critérios para definição e execução de despesas – 5. Por fim, a assunção do encargo de interino implica na submissão do interessado à legislação vigente e, nesta perspectiva, estabelece a impossibilidade de ressarcimento para quaisquer despesas continuadas (com locações, inclusive), pretéritas ou atuais, que não tenham sido previamente autorizadas pelo Poder Judiciário – 6. Consulta respondida. (ementa oficial)


  
 

Autos: CONSULTA – 0007639-30.2022.2.00.0000

Requerente: CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA DO ESTADO DO PARANÁ – CGJPR

Requerido: CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA

EMENTA

CONSULTA. PROVIMENTO CNJ 45/2015. LANÇAMENTO DE DESPESAS. LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS E IMÓVEIS UTILIZADOS NA PRESTAÇÃO DOS SERVIÇOS CARTORÁRIOS. PROPRIEDADE DO PRÓPRIO INTERINO. INEXISTÊNCIA DE VEDAÇÃO NA NORMA DE REGÊNCIA. POSSIBILIDADE DE REMUNERAÇÃO DO INTERINO MEDIANTE RECURSOS PÚBLICOS. OBSERVÂNCIA DAS CONDIÇÕES EM QUE A RELAÇÃO ENTRE CUSTO E BENEFÍCIO ESTEJA DEVIDAMENTE PARAMETRIZADA PELOS PREÇOS DE MERCADO E POR REGULAMENTAÇÃO ADEQUADA. 

1. Consulta acerca da interpretação do art. 8º, letra “a”, do Provimento CNJ 45/2015, no que tange à autorização de que os preços correspondentes às locações de bens móveis e imóveis, de propriedade do próprio interino e utilizados na prestação de serviços notariais e de registro, sejam lançados como despesas das serventias extrajudiciais.

2. O Provimento CNJ 45/2015 consolidou as normas relativas à manutenção e escrituração dos livros Diário Auxiliar, Visitas e Correições e Controle de Depósito Prévio, normas estas aplicáveis tanto aos delegatários quanto aos responsáveis interinos do serviço notarial e de registro.

3. À luz de sua sistemática normativa, não há vedação para que o responsável interino seja remunerado pela locação, paga com recursos públicos, previamente autorizada pela Corregedoria local, de bens móveis e imóveis de sua propriedade necessários e úteis postos à disposição da serventia extrajudicial vaga, em condições nas quais a relação entre custo e benefício esteja devidamente parametrizada pelos preços de mercado e por regulamentação adequada.

4. Relativamente às serventias extrajudiciais vagas, na ausência de norma federal, compete ao Estado, no exercício de sua autonomia, decidir sobre as melhores condições para a prestação do serviço público que retornou à sua esfera de atribuições, de sorte que, a partir da extinção da delegação, lhe cabe avaliar se irá preservar as condições sob as quais o serviço outrora delegado era prestado, bem como se irá introduzir (ou não) novos critérios para definição e execução de despesas.

5. Por fim, a assunção do encargo de interino implica na submissão do interessado à legislação vigente e, nesta perspectiva, estabelece a impossibilidade de ressarcimento para quaisquer despesas continuadas (com locações, inclusive), pretéritas ou atuais, que não tenham sido previamente autorizadas pelo Poder Judiciário.

6. Consulta respondida.

ACÓRDÃO – Decisão selecionada e originalmente divulgada pelo INR –

O Conselho, por unanimidade, respondeu a consulta, no sentido de que: a) o Provimento CNJ 45/2015 não veda que o responsável interino seja remunerado pela locação, paga com recursos públicos, previamente autorizada pela Corregedoria local, de bens móveis e imóveis de sua propriedade necessários e úteis postos à disposição da serventia extrajudicial vaga, em condições nas quais a relação entre custo e benefício esteja devidamente parametrizada pelos preços de mercado e por regulamentação adequada; b) relativamente às serventias extrajudiciais vagas, na ausência de norma federal, compete ao Estado, no exercício de sua autonomia, decidir sobre as melhores condições para a prestação do serviço público que retornou à sua esfera de atribuições, de sorte que, a partir da extinção da delegação, lhe cabe avaliar se irá preservar as condições sob as quais o serviço outrora delegado era prestado, bem como se irá introduzir (ou não) novos critérios para definição e execução de despesas e c) a assunção do encargo de interino implica na submissão do interessado à legislação vigente e, nesta perspectiva, estabelece a impossibilidade de ressarcimento para quaisquer despesas continuadas (com locações, inclusive), pretéritas ou atuais, que não tenham sido previamente autorizadas pelo Poder Judiciário, nos termos do voto do Relator. Presidiu o julgamento a Ministra Rosa Weber. Plenário Virtual, 18 de agosto de 2023. Votaram os Excelentíssimos Conselheiros Rosa Weber, Luis Felipe Salomão, Vieira de Mello Filho, Mauro Pereira Martins, Salise Sanchotene, Jane Granzoto, Richard Pae Kim, Giovanni Olsson, João Paulo Schoucair, Marcos Vinícius Jardim Rodrigues, Marcello Terto e Mário Goulart Maia. Não votaram os Excelentíssimos Conselheiros Marcio Luiz Freitas, Luiz Fernando Bandeira de Mello e, em razão da vacância do cargo, o representante do Ministério Público da União.

RELATÓRIO

Trata-se de consulta formulada pela Corregedoria-Geral da Justiça do Estado do Paraná (CGJ/PR) sobre o Provimento 45/2015, da Corregedoria Nacional de Justiça, que consolida as normas relativas à manutenção e escrituração dos livros Diário Auxiliar, Visitas e Correições e Controle de Depósito Prévio pelos titulares de delegações e responsáveis interinos do serviço extrajudicial de notas e registros públicos.

A consulente aduz que, o normativo referenciado, ao disciplinar a manutenção e escrituração dos livros das serventias extrajudiciais sob responsabilidade de titulares e interino, estabelece que “as despesas serão lançadas no dia em que se efetivarem e sempre deverão resultar da prestação do serviço delegado, sendo passíveis de lançamento no Livro Diário Auxiliar todas as relativas investimentos, custeio e pessoal, promovidas a critério do delegatário, dentre outras: […] locação de bens móveis e imóveis utilizados para a prestação do serviço, incluídos os destinados à guarda de livros, equipamentos e restante do acervo da serventia.” (art. 8, letra “a”).

Nessa perspectiva, explica que, em 23/9/2022, o Conselho da Magistratura do TJPR, nos autos do Recurso Administrativo 0060351-62.2020.8.16.6000, teria assentado a possibilidade de escrituração do preço da locação de bens próprios do interino, desde que amparada em laudo elaborado por profissional que demonstre o valor médio de mercado para locação dos bens. Decidiu-se, ainda, pela imprescindibilidade de provocação do CNJ, para manifestação acerca da possibilidade da dedução assinalada na deliberação colegiada local.

Não obstante, considerando a urgente necessidade de preenchimento do vácuo normativo afeto à matéria, registra que a Corte Paranaense teria editado, em 6/10/2022, a Instrução Normativa nº 124/2022-GP-GC, que alterou a Instrução Normativa nº 10/2017-GC, permitindo-se, embora desaconselhável, a locação de imóveis de titularidade do interino, sendo que, nas hipóteses em que a locação do imóvel próprio se revelar imprescindível ao regular exercício da atividade, caberia ao responsável pelo serviço vago comprovar, perante o Juízo Corregedor local, a conveniência do interesse público ou a efetiva necessidade da medida, demonstrando a impossibilidade ou a inviabilidade de celebração de contrato locatício que tenha por objeto imóvel de terceiro.

No que tange aos equipamentos e outros bens móveis necessários ao regular exercício da atividade pelo interino, a novel legislação indica que deveriam ser, preferencialmente, locados. E aqueles que tenham sido adquiridos com recursos da serventia, antes da entrada em vigor da regulamentação superveniente, deverão ser objeto de levantamento, a fim de que passem a integrar o patrimônio do Poder Judiciário.

Ainda na esteira do raciocínio adotado na deliberação do Conselho de Magistratura do TJPR, pontua que, no projeto de revisão do Código de Normas do Foro Extrajudicial em andamento, estariam sendo desenvolvidos estudos sobre a possibilidade de inserção de dispositivo que condiciona a locação de imóvel próprio do interino à prévia avaliação do valor de mercado do bem, mediante laudo de profissional da área.

Em que pese a regulamentação da temática em âmbito local, a consulente entende que persiste a necessidade de pronunciamento de natureza normativa geral quanto à possibilidade de lançamento, como despesas da serventia, de gastos com aluguel de imóveis e móveis de propriedade do agente interino.

Nesse particular, sustenta, entre outros, que: i) a depender do enfoque dado à questão, o lançamento efetuado pelo interino pode ser considerado irregular; ii) o fato de que, ao simplesmente proibir tais lançamentos, estaria o Estado, enquanto Poder delegante, usufruindo gratuitamente de um espaço particular, gerando, por consequência, enriquecimento ilícito por parte da Administração; iii) restaria, ao agente designado, a opção de mudar a serventia de endereço, possibilitando, assim, o exercício do seu direito de dispor do imóvel como lhe aprouver e auferir renda mediante o aluguel do bem a terceiro, o que nem sempre atenderia ao interesse da população.

Conclui, desse modo, que, se por um lado não se pode obrigar o agente interino a disponibilizar sua propriedade ao Estado gratuitamente, por outro não é possível a manutenção dos lançamentos de valores estimados a título de aluguel, pelo uso de tais bens, porquanto, em tese, tal despesa não existe.

Diante desses fatos, apresenta as seguintes indagações:

a) o artigo 8º, letra “a”, do Provimento CNJ 45/2015, autoriza que os preços correspondentes às locações de bens móveis e imóveis, de propriedade do próprio interino e utilizados na prestação de serviços notariais e de registro, sejam lançados como despesas das serventias?

b) sendo positiva ou negativa a reposta anterior, quais medidas administrativas devem ser adotadas pelas Corregedorias Estaduais, à luz do disposto nos artigos 23 e 24 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro?

De modo a bem instruir o feito, a Coordenadoria de Gestão de Serviços Notariais e de Registro, da Corregedoria Nacional de Justiça, foi instada a se manifestar, tendo ofertado parecer técnico (Id. 5168707).

É o relatório.

VOTO

Considerando-se que os questionamentos ora formulados se amoldam às hipóteses previstas no art. 89, caput, do Regimento Interno do CNJ, a presente consulta comporta conhecimento.

Quanto ao mérito, as indagações submetidas ao crivo deste Conselho dizem respeito, fundamentalmente, à interpretação do art. 8º, letra “a”, do Provimento CNJ 45/2015, no que tange à autorização de que os preços correspondentes às locações de bens móveis e imóveis, de propriedade do próprio interino e utilizados na prestação de serviços notariais e de registro, sejam lançados como despesas das serventias extrajudiciais.

Cuida-se, portanto, de temática relacionada a normativo expedido pela Corregedoria Nacional de Justiça, no exercício de suas competências constitucionais, legais e regulamentares.

Sendo assim, por inteira pertinência e adequação, compartilha-se o posicionamento técnico externado pelo Órgão Censor Nacional, o qual, adianto, adiro integralmente (Id. 5168707):

“[…] Na outorga de delegação notarial e de registro, o Estado transfere a execução do serviço público a um particular e mantém consigo a titularidade. A extinção da delegação estabelece cenário no qual se concentram novamente no Estado, em reversão, tanto a titularidade do serviço quanto a responsabilidade direta por sua execução.

A partir da extinção da delegação, a renda auferida com a arrecadação de tributos (emolumentos) na serventia extrajudicial vaga é recurso público, sujeito à matriz principiológica traçada pelos arts. 37 e 70 da Constituição Federal, notadamente pelos vetores da legalidade, legitimidade, impessoalidade, moralidade, publicidade, eficiência e economicidade.

O Provimento CNJ n. 45/2015 consolidou as normas relativas à manutenção e escrituração dos livros Diário Auxiliar, Visitas e Correições e Controle de Depósito Prévio, normas estas aplicáveis tanto aos delegatários quanto aos responsáveis interinos do serviço notarial e de registro.

Interpretado e aplicado à luz da matriz principiológica referida alhures, o Provimento CNJ n. 45/2015 não veda seja o responsável interino remunerado pela locação, paga com recursos públicos, previamente autorizada pela Corregedoria local, de bens móveis e imóveis de sua propriedade necessários e úteis postos à disposição da serventia extrajudicial vaga, em condições nas quais a relação entre custo e benefício esteja devidamente parametrizada pelos preços de mercado e por regulamentação adequada.

Nesta esteira de raciocínio, relativamente às serventias extrajudiciais vagas, sob ausência de norma federal, compete ao Estado, no exercício da autonomia que lhe é própria, decidir as melhores condições para a prestação do serviço público que lhe retornou à esfera de atribuições. A partir da extinção da delegação, compete ao Estado decidir se irá preservar as condições sob as quais o serviço outrora delegado era prestado, bem como se irá introduzir (ou não) novos critérios para definição e execução de despesas.

Por fim, importa deferir evidência ao dado de realidade pelo qual a interinidade de serventia extrajudicial é encargo voluntariamente aceito por aquele que pretenda tornar-se preposto do Estado. A assunção daquele encargo implica na submissão do interessado à legislação vigente e, nesta perspectiva, estabelece impossibilidade de ressarcimento para quaisquer despesas continuadas (com locações, inclusive), pretéritas ou atuais, que não tenham sido previamente autorizadas pelo Poder Judiciário. […]”

Ante o exposto, voto no sentido de CONHECER a consulta, para que, no mérito, seja respondida no sentido de que:

a) o Provimento CNJ 45/2015 não veda que o responsável interino seja remunerado pela locação, paga com recursos públicos, previamente autorizada pela Corregedoria local, de bens móveis e imóveis de sua propriedade necessários e úteis postos à disposição da serventia extrajudicial vaga, em condições nas quais a relação entre custo e benefício esteja devidamente parametrizada pelos preços de mercado e por regulamentação adequada.

b) relativamente às serventias extrajudiciais vagas, na ausência de norma federal, compete ao Estado, no exercício de sua autonomia, decidir sobre as melhores condições para a prestação do serviço público que retornou à sua esfera de atribuições, de sorte que, a partir da extinção da delegação, lhe cabe avaliar se irá preservar as condições sob as quais o serviço outrora delegado era prestado, bem como se irá introduzir (ou não) novos critérios para definição e execução de despesas.

c) a assunção do encargo de interino implica na submissão do interessado à legislação vigente e, nesta perspectiva, estabelece a impossibilidade de ressarcimento para quaisquer despesas continuadas (com locações, inclusive), pretéritas ou atuais, que não tenham sido previamente autorizadas pelo Poder Judiciário.

Cumpridas as comunicações de praxe, arquive-se o presente feito independentemente de nova conclusão.

Brasília, data registrada no sistema.

MAURO PEREIRA MARTINS

Conselheiro Relator – – /

Dados do processo:

CNJ – Consulta nº 0007639-30.2022.2.00.0000 – Paraná – Rel. Cons. Mauro Pereira Martins – DJ 22.08.2023

Fonte: INR Publicações.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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