Questão esclarece acerca da descrição de imóvel rural em escritura pública de compra e venda.

Imóvel rural – descrição. Compra e venda – escritura pública.

Para esta edição do Boletim Eletrônico a Consultoria do IRIB selecionou questão acerca da descrição de imóvel rural em escritura pública de compra e venda. Veja como a Consultoria do IRIB se posicionou acerca do assunto, valendo-se dos ensinamentos de Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza.

Pergunta
A escritura pública de compra e venda de imóvel rural poderá apenas conter a indicação matricial deste ou deverá ser exigida sua descrição integral?

Resposta
Eduardo Pacheco Ribeiro de Souza, em recente trabalho publicado pelo IRIB, intitulado "Coleção Cadernos IRIB – vol. 7 – Os Imóveis Rurais Na Prática Notarial e Registral – Noções Elementares", p. 44-45, abordou este tema com muita propriedade. Vejamos o que ele nos ensina:

"7. A lavratura de atos notariais

Os tabeliães e seus prepostos, na lavratura de atos notariais envolvendo imóveis rurais, terão de observar normas específicas, além daquelas inerentes a todo e qualquer ato notarial.

São as seguintes as peculiaridades quanto aos imóveis rurais:

a) O imóvel deverá ser integralmente descrito no ato notarial, não se permitindo meramente a consignação do número do registro ou da matrícula, a localização do imóvel, o logradouro, o bairro, a cidade e o Estado, como sucede com os imóveis urbanos, nos termos da Lei nº 7.433/1985 e seu decreto regulamentador de nº 93.240/1986. É o que determina o art. 2º da Lei nº 7.433/1985, a contrario sensu: – ficam dispensados, na escritura pública de imóveis urbanos, sua descrição e caracterização, desde que constem, estes elementos, da certidão do Cartório de Registro de Imóveis -".

De importância também aqui observar, para eventual proveito, o que já temos como norma no Estado de São Paulo, mais precisamente no item 59, a.1, do Cap. XIV, destinado aos Notários do referido Estado, que autoriza mitigação de dados a especializar imóveis rurais, quando já apresentado no sistema registral com o georreferenciamento previsto na Lei 10.267/2001, cujo texto assim se mostra:

"59. As escrituras relativas a bens imóveis e direitos reais a eles relativos devem conter, ainda:

a.1) para imóveis rurais georreferenciados, o número do registro ou matrícula no Registro de Imóveis, sua localização, denominação, área total, o número do cadastro no INCRA constante do Certificado de Cadastro de Imóvel Rural (CCIR) e o Número de Imóvel Rural na Receita Federal (NIRF), enquanto para os demais imóveis rurais, particularmente os não georreferenciados e os objeto de transcrição, a descrição deve ser integral e pormenorizada, com referência precisa, inclusive, aos seus característicos e confrontações".

Tal norma no referido Estado de São Paulo passa aos Notários e Registradores entendimento de que a análise dos princípios da especialidade e da identidade registrária, também quando frente a instrumentos públicos a envolver imóveis rurais, deve obedecer ao que temos para imóveis urbanos, na Lei 7.433/85, e seu Decreto regulamentador, de número 93.240/86.

Desta forma, Notários e Registradores do referido Estado de São Paulo, não mais têm a necessidade de, respectivamente, descrever em suas escrituras o imóvel rural com todos os detalhes que temos para uma regular especialização do mesmo, quando frente a bem que já se encontra identificado nos assentos do Oficial com elementos georrefenciados; e em conferir os dados indicados no respectivo título com o que o Registrador vai ter em seu acervo.

Finalizando, recomendamos sejam consultadas as Normas de Serviço da Corregedoria-Geral da Justiça de seu Estado, para que não se verifique entendimento contrário ao nosso. Havendo divergência, proceda aos ditames das referidas Normas, bem como a orientação jurisprudencial local.

Fonte: IRIB (www.irib.org.br).

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Doação. Usufruto. Imóvel precariamente individualizado. Retificação.

A individuação do imóvel e sua coincidência com o registro anterior são requisitos indispensáveis para que se assegure o encadeamento dos atos registrais.

O Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul (TJRS) julgou, por meio de sua Décima Sétima Câmara Cível, a Apelação Cível nº 70054693676, onde se decidiu pela impossibilidade de registro de escritura pública de doação com reserva de usufruto de imóvel que se encontra sem a devida individualização. O acórdão teve como Relatora a Desembargadora Liége Puricelli Pires e o recurso foi, à unanimidade, improvido.

No recurso em análise, o apelante sustentou que estão presentes os requisitos ensejadores do registro, de modo a habilitar o proprietário de direito no Oficio competente, porquanto cumpridas as exigências do Oficial Registrador e perfeitamente individualizado o lote.

Ao julgar o caso, o Relator entendeu que o recurso não merece provimento, eis que, o referido imóvel encontra-se dentro de um todo maior, sem sua devida individualização. Ademais, os documentos acostados aos autos não permitem a perfeita identificação do imóvel. Adotando o parecer do Ministério Público gaúcho como fundamento do decisum, a Relatora concluiu, em síntese, que “a individuação do imóvel e sua coincidência com o registro anterior são requisitos indispensáveis para que se assegure o encadeamento objetivo dos atos registrais, resguardando a segurança e a certeza que devem informar os atos do Registro de Imóveis” e que “para a conferência da disponibilidade, é necessário o procedimento retificatório, às avessas, já que haveria o desfalque e o registro do título formalizado.”

Diante do exposto, a Relatora votou pelo improvimento do recurso.

Clique aqui e confira a íntegra da decisão.

Fonte: IRIB (www.irib.org.br) – TJ/RS.

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Georreferenciamento em ações de desapropriação

* Júlio Cesar Bueno, Paulo Felipe Martins David e Patrícia Mendonça de Almeida

A lei 10.267/01 introduziu no ordenamento jurídico a obrigatoriedade de realização de georreferenciamento em todos os imóveis rurais do Brasil que sejam objeto de ações judiciais1. Referida lei foi motivada, sobretudo, pela necessidade de conferir maior precisão e segurança ao processo de identificação e delimitação dos imóveis rurais e alterou diversos dispositivos da lei de registros públicos e de outros diplomas.

O georreferenciamento, de forma simplificada, é uma técnica moderna de agrimensura, através da qual é possível documentar de forma precisa e pormenorizada a exata localização no globo terrestre de um bem imóvel. Consiste, pois, na descrição do imóvel através de informações geodésicas de seus vértices, georreferenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro, após a devida homologação da precisão posicional pelo INCRA.

Assim, além de haver a padronização dos procedimentos técnicos, a sistemática do georreferenciamento identifica de forma inequívoca os imóveis, na tentativa de impossibilitar a sobreposição de matrículas e a descrição pouco confiável dos imóveis, problemas, diga-se de passagem, outrora bastante comuns no Brasil.

O georreferenciamento, portanto, é exigido tanto para os casos de parcelamento, desmembramento ou alienação de imóveis rurais, quanto para os casos de litígio judicial envolvendo os imóveis.

Entretanto, a exigência do georreferenciamento vem sendo alvo de veladas críticas por parte de proprietários de imóveis rurais de todo o país, porquanto esbarra na ineficiência dos órgãos públicos responsáveis pela homologação do georreferenciamento. Tal fato, que acarreta em enorme demora na consecução dos pedidos submetidos ao INCRA, viola, por óbvio, diversos preceitos constitucionais, como o da eficiência da Administração Pública, da propriedade e da legalidade.

Além disso, a questão relacionada à exigência de realização do georreferenciamento também vem sendo objeto de discussão nos casos de desapropriação, uma vez que contraria os preceitos que regem esse tipo especial de procedimento judicial.

A desapropriação e seu processo são regulados pelos artigos 5º, inciso XXIV, da CF/88 e pelo decreto-lei 3.365/41. O objeto do processo expropriatório se limita, exclusivamente, à discussão acerca do valor indenizatório e da existência de algum vício processual, conforme determinam os artigos 9º2 e 203 do decreto-lei 3.365/41.

E, por conta de sua característica de compulsoriedade, no processo de desapropriação não há transmissão de propriedade, mas sim incorporação do bem ao patrimônio público, o que acarreta no modo originário — e não derivado — de aquisição de propriedade.

Sob este diapasão, esclarecedor o pontifício do Professor Hely Lopes Meirelles4 que ensina: "a desapropriação configura uma aquisição originária, porque não provém de nenhum título anterior, e, por isso, o bem expropriado torna-se insuscetível de reivindicação e libera-se de quaisquer ônus que sobre ele incidissem precedentemente, ficando os eventuais credores sub-rogados no preço".

Dessa maneira, percebe-se que a desapropriação engendra verdadeira ruptura da cadeia de sucessão dominial registrada na matrícula. Constitui o processo de desapropriação, em face de seu caráter excepcional, legítima exceção ao princípio da continuidade.

Dessa forma, a aquisição da propriedade pela via originária se dá livre de qualquer gravame, limitação, ônus ou embaraço decorrente de atos anteriores. Não se aplica a tais formas de obtenção da propriedade a regra basilar "nemo plus juris alium transferre potestquam ipse habet" (ninguém pode transferir a outrem mais direitos do que tem), pelo simples fato de que não cabe falar em transmissão.

E é justamente por essas razões que, estando o processo de desapropriação devidamente instruído com documentos necessários para individualizar com precisão a área sub judice, não há necessidade de homologação do INCRA dos documentos apresentados no processo para a procedência da ação.

Portanto, do ponto de vista jurídico, a necessidade do georreferenciamento homologado pelo INCRA não é requisito imprescindível para a propositura (e procedência) da ação, conforme bem observado por JOSÉ CARLOS DE MORAES SALLES5:

A lei não especifica o que deve constar da declaração de utilidade pública. É óbvio, entretanto, que o decreto respectivo deve individuar com precisão o bem declarado de utilidade pública, a fim de que não haja dúvida sobre o objeto da expropriação.

Se se tratar de bem imóvel, devem ser mencionados, com toda clareza, sua situação, limites e confrontações, bem como, se possível, o número da matrícula ou da transcrição no registro imobiliário competente.

A fim de pacificar o tema, o Egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul proferiu importante decisão que, de forma bastante lúcida e clara, aborda o assunto e dá solução conveniente ao aparente conflito de normas existente:

REGISTRO DE IMÓVEIS. DÚVIDA. DESAPROPRIAÇÃO. SENDO A DESAPROPRIAÇÃO FORMA ORIGINÁRIA DE AQUISIÇÃO DA PROPRIEDADE IMOBILIÁRIA, DESPICIENDA A EXIGÊNCIA, PARA REGISTRO DO TÍTULO(ESCRITURA), DO GEORREFERENCIAMENTO DO IMÓVEL. POSSIBILIDADE DE ABERTURA DE NOVA MATRÍCULA A PARTIR DA ESCRITURA APRESENTADA A REGISTRO. PRECEDENTES. APELO PROVIDO

(…)

Com razão a parte recorrente. Ao contrário do que entendeu a douta registradora, não é preciso que a apelante apresente o georreferenciamento, memorial descritivo e planilha (além de outros documentos, relativos a períodos pretéritos, como, p.ex., guias de ITR de anos passados) uma vez que a aquisição da propriedade imobiliária pelo expropriante dá-se de modo originário (da mesma forma que ocorre com a usucapião, e.g.), que acarreta na abertura de uma nova matrícula, com novos dados ali insertos a partir do teor da Escritura de desapropriação.

No que pertine ao georreferenciamento, cumpre sinalar tratar-se de ato custoso e demorado, consistente na obtenção das coordenadas do mapa do bem a ser georreferenciados, conhecidos como pontos de controle, sendo estes locais que oferecem uma feição física perfeitamente identificável, tais como cruzamentos de estradas, de rios, cumes de montanhas, etc. Ou seja, em tese visaria a localizar e identificar o imóvel ainda não localizado.

(…)

Com a vênia da douta sentença, tem razão a recorrente. A exigência de toda uma gama de documentação relativas ao imóvel apenas se justificaria se se reputasse o ato como forma de aquisição derivada da propriedade.

(…)

Por corolário, não são necessários ao registro da área expropriada os laudos de georreferenciamento, memorial descritivo e laudos e documentos outros. Logo, a partir da escritura, viável a abertura de nova matrícula para registro da desapropriação em prol da apelante.

(…)

(TJ RS. Apelação Cível nº 70026441790. 19ª Câmara Cível. Des. Rel. José Francisco Pellegrini. Data de Julgamento: 18/08/2009. Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 28/08/2009 – sem grifos no original).

Dessa forma, tornar o georreferenciamento como requisito obrigatório da ação de desapropriação apenas serviria para atrasar a solução da lide e não interferiria em nada noquantum indenizatório, representando ônus desnecessário para quem desapropria e para quem é desapropriado.

Portanto, através da abertura de importante precedente jurisprudencial e pela aplicação de princípios cunhados pela CF, posicionamo-nos no sentido de não entender necessário o georreferenciamento de imóveis rurais que sejam objeto de ações expropriatórias, desde que o imóvel objeto da ação esteja devidamente individualizado e delimitado.

A questão, todavia, ainda prescinde de um maior debate nos Tribunais e somente será consolidada quando o STJ posicionar-se a respeito do tema e pacificar a discussão existente.

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1 – Artigo 225, § 3º, da Lei nº 6.015/73, alterado pela Lei nº 10.267/2001: “Nos autos judiciais que versem sobre imóveis rurais, a localização, os limites e as confrontações serão obtidos a partir de memorial descritivo assinado por profissional habilitado e com a devida Anotação de Responsabilidade Técnica – ART, contendo as coordenadas dos vértices definidores dos limites dos imóveis rurais, geo-referenciadas ao Sistema Geodésico Brasileiro e com precisão posicional a ser fixada pelo INCRA, garantida a isenção de custos financeiros aos proprietários de imóveis rurais cuja somatória da área não exceda a quatro módulos fiscais.”

2 – “Ao Poder Judiciário é vedado, no processo de desapropriação, decidir se se verificam ou não os casos de utilidade pública”.

3 – “A contestação só poderá versar sobre vício do processo judicial ou impugnação do preço; qualquer outra questão deverá ser decidida por ação direta”.

4 – Direito de Construir. Hely Lopes Meirelles, 9 ª Edição, 2005. Editora Malheiros, p. 179.

5 – SALLES, José Carlos de Moraes. A Desapropriação à luz da Doutrina e da Jurisprudência. São Paulo. Revista dos Tribunais. 6ªed. 2009. p. 90

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* Júlio Cesar Bueno e Paulo Felipe Martins David são advogadas e Patrícia Mendonça de Almeida é estagiária do escritório Pinheiro Neto Advogados.

Fonte: Migalhas I 16/09/2013.

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