Direito Processual Civil – Recurso Especial – Protesto contra alienação de bem de família – Legítimo interesse – Não prejudicialidade da efetiva medida – Recurso desprovido – 1. “A averbação, no Cartório de Registro de Imóveis, de protesto contra alienação de bem, está dentro do poder geral de cautela do juiz (art. 798, CPC) e se justifica pela necessidade de dar conhecimento do protesto a terceiros, prevenindo litígios e prejuízos para eventuais adquirentes” (EREsp 440.837/RS, Rel. Ministra Eliana Calmon, Rel. p/ Acórdão Ministro Barros Monteiro, Corte Especial, julgado em 16/08/2006, DJ 28/05/2007) – 2. Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, o protesto contra a alienação de bens, previsto no art. 869 do CPC/1973 (art. 301 do CPC/2015), pressupõe dois requisitos: legítimo interesse e não prejudicialidade efetiva da medida. Precedentes – 3. Em relação ao bem de família, o protesto contra alienação de bens não possui o objetivo de obstar ou anular o negócio jurídico de venda do imóvel impenhorável, mas somente de informar terceiros de boa-fé a respeito da pretensão do credor de penhora do bem, na hipótese de afastamento da proteção conferida pela Lei n. 8.009/1990 – 4. Assim, estão presentes os pressupostos para o protesto contra a alienação de bens, tendo em vista que a publicidade da pretensão é essencial para proteção de terceiros de boa-fé e preservação do direito do executante de futura constrição do imóvel, no caso da perda da qualidade de bem de família – 5. Recurso especial a que se nega provimento.

RECURSO ESPECIAL Nº 1.236.057 – SP (2011/0020152-8)

RELATOR : MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA

RECORRENTE : ANTÔNIA CARLA DEL CLARO

ADVOGADO : CLITO FORNACIARI JÚNIOR E OUTRO(S) – SP040564

RECORRIDO : TRICURY FACTORING SOCIEDADE DE FOMENTO COMERCIAL LTDA

ADVOGADO : PAULO CAPRETTI DEL FIORI E OUTRO(S) – SP296884

EMENTA

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. RECURSO ESPECIAL. PROTESTO CONTRA ALIENAÇÃO DE BEM DE FAMÍLIA. LEGÍTIMO INTERESSE. NÃO PREJUDICIALIDADE DA EFETIVA MEDIDA. RECURSO DESPROVIDO.

1. “A averbação, no Cartório de Registro de Imóveis, de protesto contra alienação de bem, está dentro do poder geral de cautela do juiz (art. 798, CPC) e se justifica pela necessidade de dar conhecimento do protesto a terceiros, prevenindo litígios e prejuízos para eventuais adquirentes” (EREsp 440.837/RS, Rel. Ministra ELIANA CALMON, Rel. p/ Acórdão Ministro BARROS MONTEIRO, CORTE ESPECIAL, julgado em 16/08/2006, DJ 28/05/2007).

2. Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, o protesto contra a alienação de bens, previsto no art. 869 do CPC/1973 (art. 301 do CPC/2015), pressupõe dois requisitos: legítimo interesse e não prejudicialidade efetiva da medida. Precedentes.

3. Em relação ao bem de família, o protesto contra alienação de bens não possui o objetivo de obstar ou anular o negócio jurídico de venda do imóvel impenhorável, mas somente de informar terceiros de boa-fé a respeito da pretensão do credor de penhora do bem, na hipótese de afastamento da proteção conferida pela Lei n. 8.009/1990.

4. Assim, estão presentes os pressupostos para o protesto contra a alienação de bens, tendo em vista que a publicidade da pretensão é essencial para proteção de terceiros de boa-fé e preservação do direito do executante de futura constrição do imóvel, no caso da perda da qualidade de bem de família.

5. Recurso especial a que se nega provimento.

ACÓRDÃO 

Após o voto-vista do Ministro Raul Araújo negando provimento ao recurso, acompanhando o relator, a Quarta Turma, por unanimidade, negou provimento ao recurso especial, nos termos do voto do relator. Os Srs. Ministros Luis Felipe Salomão (Presidente), Raul Araújo (voto-vista) e Maria Isabel Gallotti votaram com o Sr. Ministro Relator.

Ausente, justificadamente, o Sr. Ministro Marco Buzzi. Presidiu o julgamento o Sr. Ministro Luis Felipe Salomão.

Brasília-DF, 06 de abril de 2021 (Data do Julgamento)

Ministro ANTONIO CARLOS FERREIRA

Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA (Relator): Trata-se de recurso especial interposto contra acórdão do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, assim ementado (e-STJ fl. 531):

MEDIDA CAUTELAR – Protesto contra alienação de bens – Medida acautelatória que visa resguardar direitos e prevenir responsabilidade – Averbação no Registro de Imóveis – Medida que altera o caráter informativo da cautelar, impondo observar o princípio do contraditório e da defesa – Alegação inconsistente – Art. 871 do CPC – Providência admitida como poder geral de cautelar justificada na necessidade de dar conhecimento do protesto a terceiros de boa-fé, não alterando o caráter informativo da medida – Decisão mantida – Recurso improvido.

Os embargos de declaração foram rejeitados (e-STJ fls. 542/546).

Inconformada, a recorrente interpôs o presente recurso especial, com fundamento no art. 105, III, alíneas “a” e “c”, da CF, apontando violação dos arts. 867 do CPC/1973 e 1º da Lei n. 8.009/1990. Informa que a recorrida propôs “ação monitória, buscando a cobrança de seu suposto crédito, na qual se saiu vitoriosa, mas não conseguiu êxito na realização do direito material, dado que a devedora, ora recorrente, nada mais possuía além do apartamento em que reside. Malograda a execução, requereu, então, protesto contra alienação de bens em relação ao imóvel reconhecido como bem de família, que lhe foi deferido, antes da oitiva da recorrente, inclusive com averbação do protesto na matrícula do imóvel” (e-STJ fl. 550).

Sustenta que “o protesto contra alienação de bens tem por finalidade retirar o imóvel do comércio e, em termos práticos e objetivos, consegue alcançar seu intento. Com seu deferimento, nele, então, ficará residindo até morrer a recorrente, sendo privada de transferir sua moradia ou alienar o imóvel, a fim de atender a outras necessidades.  Quando, então, finalmente, falecer aí existirá, sem problemas, a penhora” (e-STJ fls. 552/553).

Alega que “não existe o direito que pretende a recorrida ver protegido, pois ela não tem direito a executar o imóvel sobre que versa o protesto, uma vez que, pela regra do art. 10 da Lei n. 8.009/90, ele é impenhorável (…). Se o bem é impenhorável, como reconhece expressamente o próprio acórdão, ele não pode ficar sujeito à constrição judicial, nem a medidas que venham a ensejar constrição futura, como é, claramente, o objetivo da cautelar de protesto contra a alienação de bens” (e-STJ fl. 553).

Afirma haver “falta interesse de agir à recorrida, pois o quanto objetiva é tão só impedir a concretização de algum negócio jurídico que venha a ser realizado e que, com relação ao bem de família, não tem lugar, pois não há direito da credora em preservar a sua manutenção pela devedora, dado que pode negociá-lo livremente, consoante decorre da regra do art. 40 da Lei n. 8.009/90” (e-STJ fls. 553/554).

Busca “seja afastado do protesto contra alienação de bens o imóvel residencial da recorrente, dado ser aquele o bem em que reside, tendo, portanto, a proteção da Lei n. 8.009/90” (e-STJ fl. 558).

Contrarrazões apresentadas a fls. 581/591 (e-STJ).

É o relatório.

VOTO

O EXMO. SR. MINISTRO ANTONIO CARLOS FERREIRA (Relator): Trata-se de medida cautelar de protesto contra alienação de bens ajuizada por TRICURY FACTORING SOCIEDADE DE FOMENTO COMERCIAL LTDA.

Na petição inicial da medida cautelar (e-STJ fls. 15/24), a autora informou que ajuizou ação monitória contra a recorrente, ANTÔNIA CARLA DEL CLARO, objetivando a conversão de notas promissórias vencidas e prescritas, originadas de mútuo financeiro, em título executivo, sendo julgada “procedente em parte a ação: a) rejeitando os embargos; b) constituindo de plena eficácia executiva a dívida constante das notas promissórias no valor de R$ 51.408,00; c) determinando o prosseguimento de execução contra devedor solvente do valor corrigido monetariamente (segundo a tabela prática de atualização do tribunal) desde 9 de novembro de 1994 e juros de mora de 6% ao ano a partir da citação. Diante da sucumbência recíproca, cada parte arcará com as custas processuais que dispensou e honorários do seu patrono” (e-STJ fl. 218).

ANTÔNIA CARLA DEL CLARO interpôs recurso de apelação, o qual foi julgado parcialmente procedente para “estabelecer a correção monetária a partir dos vencimentos dos títulos e os juros da citação, mantida, no mais, a r. sentença, inclusive quanto às verbas da sucumbência já que a recorrida decaiu de parte mínima do pedido” (e-STJ fl. 291), em acórdão assim ementado (e-STJ fl. 286):

EMENTA: APELAÇÃO – AÇÃO MONITÓRIA – EMBARGOS – NOTAS PROMISSÓRIAS PRESCRITAS – EMPRÉSTIMO – SUBSISTÊNCIA DO NEGÓCIO ORIGINÁRIO, A DESPEITO DA ANULAÇÃO DO CONTRATO DE COMPRA E VENDA COM PACTO DE RECOMPRA POR DECISÃO JUDICIAL TRANSITADA EM JULGADO, EM RAZÃO DA SIMULAÇÃO DA GARANTIA – EXISTÊNCIA DE ELEMENTOS DE PROVA DOCUMENTAL SUFICIENTES PARA O DESLINDE DA CAUSA – CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CARACTERIZADO – INEXISTÊNCIA DE PROVA DOCUMENTAL DE QUITAÇÃO – INADMISSIBILIDADE DE PROVA EXCLUSIVAMENTE TESTEMUNHAL – INTELIGÊNCIA DO ART. 940 DO CC DE 1916 – INVIABILIDADE DO RECONHECIMENTO DA POSTULADA COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS, À AUSÊNCIA DE PROVA DOCUMENTAL QUE EVIDENCIE A CERTEZA DO VALOR CORRESPONDENTE – PRELIMINAR REJEITADA – RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO APENAS NO QUE PERTINE AO TERMO DE INCIDÊNCIA DA CORREÇÃO MONETÁRIA, QUE É DEVIDA DAS DATAS DOS VENCIMENTOS DOS TÍTULOS E DO JUROS, QUE, A TEOR DO ART. 219 DO CPC, SÃO DEVIDOS DA CITAÇÃO.

Foi negado seguimento ao recurso especial interposto por ANTÔNIA CARLA DEL CLARO (e-STJ fls. 340/341), sendo iniciada, portanto, a execução da sentença condenatória.

Na petição da medida cautelar, afirmou a autora a necessidade do protesto contra alienação de bens por não ter sido satisfeito o débito “oriundo de descumprimento do pacto de mútuo financeiro entre Requerente e Requerida” (e-STJ fl. 19), especificando o cabimento da medida nos termos abaixo (e-STJ fls. 20/22):

No caso em tela, é notório que a Requerente corre sério risco de jamais reaver o valor despendido a título de mútuo financeiro firmado com a Requerida. Para se chegar a tal conclusão basta breve análise do processo principal, que foi interposto no ano 2000, sendo que até a presente data não foi possível a satisfação do débito por falta de bens penhoráveis.

d) Protesto Contra Alienação de Bens (art. 867, CPC).

22. Conforme explanado anteriormente, os bens imóveis descritos no item 14 são considerados impenhoráveis por força de lei, e assim entende o eminente professor Álvaro Villaça Azevedo:

(…).

23. Frisa-se, que por serem os únicos bens de propriedade da Requerida, a Requerente jamais alcançará o direito de excussão. A impenhorabilidade é um favor legal concedido ao devedor, para que este possa residir de maneira digna, ainda devendo.

24. Logo, esta impenhorabilidade é oriunda da vontade do legislador preservar a paz social, garantindo a tranqüilidade do devedor de não se ver desabrigado de um lar.

25. Não obstante tal, é certo que, futuramente, ocorrerá o evento óbito, quando então a Requerente poderá ser habilitada como credora do Espólio da Requerida, trata-se de fato certo, porém o momento é incerto.

26. Desta forma, quando não mais perdurar o motivo para incidência daquela proteção legal (evento óbito futuro), os imóveis deverão servir de garantia para a satisfação da obrigação.

27. Ademais, a presente cautelar visa que terceiros de boa-fé não sejam prejudicados por manobras da Requerida que possam gerar fraude de execução.

28. Note-se Exa., que existe ainda a possibilidade de que os bens sejam alienados pela Requerida, ocasionando o risco proeminente a terceiros de boa-fé, desavisados da existência de demanda em fase executória contra aquela, cujos os mesmos bens devem responder para a satisfação da obrigação.

29. Outra hipótese, é que a Requerente aliene o bem ainda em vida, tornando-se insolvente, dificultando ainda mais, ou até inviabilizando o cumprimento da execução, posto que o dinheiro produto da venda poderá ser desviado para locais inacessíveis e de difícil localização.

Dessa forma, a autora sustentou a necessidade da medida cautelar para “resguardar os direitos futuros da Requerente, assim como, alertar terceiros de boa-fé que são adquirentes em potencial dos bens imóveis de propriedade da Requerida” (e-STJ fl. 22). E consignou a possibilidade de, no caso de futuro óbito da devedora, “possa regularmente habilitar-se como credora do Espólio da Requerida, e impedir a alienação dos imóveis antes da satisfação do débito” (e-STJ fl. 22). Complementou, por fim, que “a Requerente tenta inclusive se resguardar da possibilidade de haver a alienação desses bens sem que haja a respectiva satisfação da execução” (e-STJ fl. 22).

Em 15/10/2008, foi deferida, pelo juízo de primeira instância, “a efetivação do protesto, com a notificação pessoal da executada, bem como com a averbação pelo Oficial de Registro de Imóveis competente nas matrículas nº 58.074 e 58.075 dos indigitados imóveis da existência do protesto contra a alienação dos mesmos em decorrência da tramitação da mencionada ação monitória, expedindo-se o quanto necessário para o cumprimento das medidas supra referidas” (e-STJ fl. 478), sob os seguintes fundamentos (e-STJ fl. 478):

Não há interesse na penhora dos bens e sim apenas de dar publicidade a terceiros da existência do referido credito para assegurar a integridade do imóvel, na hipótese de cessação da impenhorabilidade do bem de família por qualquer das hipóteses previstas em lei (venda do bem, alteração de residência da devedora, óbito da devedora).

Trata-se de uma medida que visa preservar o direito do credor de futura constrição do bem que integra o patrimônio do devedor caso fique superada a causa atual de impenhorabilidade, o que é perfeitamente admissível nos termos do artigo 867 do CPC.

O Tribunal de origem manteve o protesto contra a alienação do bem no registro de imóveis, cujas razões de decidir transcrevo (e-STJ fl. 533):

Não se sustenta a tese da recorrente, no sentido de que a averbação na matrícula do imóvel afasta o caráter informativo da medida, portanto, sendo o provimento nulo, por não observar o princípio do contraditório e da defesa.

É que a averbação tem na sua finalidade principal exatamente informar a necessidade de dar conhecimento do protesto perante terceiro de boa-fé, assim prevenindo litígios e prejuízos para eventuais adquirentes.

Desta feita, não se vislumbra que a objetada averbação no Registro de Imóveis possa alterar a natureza da cautelar, e, principalmente, a própria lei.

No julgamento dos embargos de declaração, esclareceu o Tribunal estadual (e-STJ fl. 545):

Com efeito, o pronunciamento colegiado deixou claro que a finalidade principal da averbação é informar terceiros de boa-fé sobre o protesto contra alienação de bens, portanto, mantendo inalterada a condição de impenhorabilidade, por se tratar de bem de família, fato este reconhecido pelo requerente, bem como, pela autoridade monocrática.

Ademais, a matéria “bem de família” ao que consta encontra-se apaziguada, tanto que sequer foi objeto de irresignação da recorrente, de sorte que não havia o que falar sobre bem de família, pois, o objetivo precípuo da medida é a averbação na matrícula do imóvel do protesto contra alienação, o que não retira a impenhorabilidade do bem.

Ora, se não houve alegação no recurso, o Acórdão não poderia ter falado sobre a matéria bem de família, logo, inviável falar em omissão.

Feitas essas considerações, cinge-se a controvérsia à possibilidade de consignar a existência de protesto contra a alienação do imóvel em sua matrícula, em caso de bem de família.

O protesto possui previsão legal no art. 867 do CPC/1973, segundo o qual “todo aquele que desejar prevenir responsabilidade, prover a conservação e ressalva de seus direitos ou manifestar qualquer intenção de modo formal, poderá fazer por escrito o seu protesto, em petição dirigida ao juiz, e requerer que do mesmo se intime a quem de direito”. O Código de Processo Civil de 2015, em seu art. 301, arrolou o registro de protesto contra alienação de bem como uma das formas de tutela de urgência de natureza cautelar.

Com o protesto, leva-se a conhecimento de terceiros a existência de pretensão sobre o bem por parte daquele que requer a medida. Segundo Humberto Theodoro Júnior, o protesto tem por objetivo: “(a) prevenir responsabilidade, como, por exemplo, o caso do engenheiro que elaborou o projeto e nota que o construtor não está seguindo seu plano técnico; (b) prover a conservação de seu direito, como no caso de protesto interruptivo de prescrição; (c) prover a ressalva de seus direitos, como no caso de protesto contra alienação de bens, que possa reduzir o alienante à insolvência e deixar o credor sem meios de executar seu crédito” (Curso de Direito Processual Civil. Teoria geral do Direito Processual Civil, Processo de Conhecimento e Procedimento Comum, vol. I. 56ª ed. Editora Forense. Rio de Janeiro: 2015).

A Segunda Seção do STJ, no julgamento dos EREsp n. 185.645/PR, manifestou-se quanto à finalidade do protesto contra alienação de bem:

EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. AÇÃO CAUTELAR DE PROTESTO CONTRA ALIENAÇÃO DE BENS. AVERBAÇÃO NO REGISTRO IMOBILIÁRIO. POSSIBILIDADE. PODER GERAL DE CAUTELA DO JUIZ. EMBARGOS ACOLHIDOS.

1. “A averbação, no Cartório de Registro de Imóveis, de protesto contra alienação de bem, está dentro do poder geral de cautela do juiz (art. 798 do CPC) e se justifica pela necessidade de dar conhecimento do protesto a terceiros, prevenindo litígios e prejuízos para eventuais adquirentes” (Corte Especial, EREsp nº. 440.837/RS).

2. Embargos de divergência acolhidos.

(EREsp 185.645/PR, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, SEGUNDA SEÇÃO, julgado em 09/12/2009, DJe 15/12/2009.)

Infere-se daí que o protesto busca preservar direitos preexistentes e, por ser medida administrativa determinada judicialmente, esgota-se no plano do registro da vontade do promovente. A inserção da informação no registro público do imóvel é uma forma de prevenir possível alienação fraudulenta, mediante divulgação erga omnes.

Portanto, a medida não impede a disposição do bem, mas obsta que terceiro adquirente possa alegar boa-fé, no caso de futura demanda judicial envolvendo o imóvel, razão pela qual a jurisprudência desta Corte Superior manifestou-se no sentido de que “o protesto contra alienação de bens não tem o condão de obstar o respectivo negócio tampouco de anulá-lo; apenas tornará inequívocas as ressalvas do protestante em relação ao negócio, bem como a alegação desse – simplesmente alegação – em ter direitos sobre o bem e/ou motivos para anular a alienação” (REsp 1.229.449/MG, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe 15/09/2011). A propósito:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. EMBARGOS DE TERCEIRO. FRAUDE À EXECUÇÃO. REGISTRO DE PENHORA DO BEM ALIENADO QUANDO DA CELEBRAÇÃO DA AVENÇA. INEXISTÊNCIA. PROTESTO CONTRA ALIENAÇÃO. PRESUNÇÃO DE MÁ-FÉ. RECONHECIMENTO DE FRAUDE À EXECUÇÃO. INSUFICIÊNCIA. APLICAÇÃO DA SÚMULA 375/STJ. DECISÃO AGRAVADA MANTIDA. EMBARGOS DECLARATÓRIOS RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL, AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

1. Em homenagem ao princípio da economia processual e com autorização do princípio da fungibilidade, devem ser recebidos como agravo regimental os embargos de declaração que contenham exclusivo intuito infringente.

2. “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”. Súmula 375/STJ.

3. “O protesto contra alienação de bens não tem o condão de obstar o respectivo negócio tampouco de anulá-lo; apenas tornará inequívocas as ressalvas do protestante em relação ao negócio, bem como a alegação desse – simplesmente alegação – em ter direitos sobre o bem e/ou motivos para anular a alienação” (REsp 1.229.449/MG, Relatora Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, DJe 15/09/2011).

4. Decisão hostilizada mantida.

5. EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO AGRAVO REGIMENTAL, AO QUAL SE NEGA PROVIMENTO.

(EDcl no Ag 1299990/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 19/02/2013, DJe 22/02/2013.)

E ainda, esta Corte Superior, no julgamento do RMS n. 35.481/SP, interpretando o art. 869 do CPC/1973, entendeu que o protesto contra alienação de bens pressupõe a existência de dois requisitos, quais sejam, legítimo interesse e não prejudicialidade efetiva da medida:

O primeiro requisito – legítimo interesse – se traduz na necessidade ou utilidade da medida para assegurar ao promovente o fim colimado. Assim, devem ser sumariamente indeferidos por falta de legítimo interesse os protestos formulados por quem não demonstra vínculo com a relação jurídica invocada ou que se mostrem desnecessários frente aos próprios fatos descritos na petição inicial.

Com relação ao segundo requisito – não-nocividade da medida – o protesto não pode atentar contra a liberdade de contratar ou de agir juridicamente, ou seja, o seu deferimento não deve dar causa a dúvidas e incertezas que possam impedir a formação de contrato ou a realização de negócio lícito.

Cito a ementa do julgado:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. PROTESTO CONTRA ALIENAÇÃO DE BENS. LIMITES. REQUISITOS. LEGÍTIMO INTERESSE. NÃO-NOCIVIDADE. PUBLICAÇÃO DE EDITAIS. INFORMAÇÃO DE INTERESSE COLETIVO. CABIMENTO.

1. O protesto contra alienação de bens não tem o condão de obstar o respectivo negócio tampouco de anulá-lo. Apenas tornará inequívocas as ressalvas do protestante em relação ao negócio, bem como que este alega – simplesmente alega – ter direitos sobre o bem e/ou motivos para anular a alienação.

2. O art. 869 do CPC subordina o protesto à presença de dois requisitos: legítimo interesse e não-prejudicialidade efetiva da medida.

3. O primeiro requisito – legítimo interesse – se traduz na necessidade ou utilidade da medida para assegurar ao promovente o fim colimado. Assim, devem ser sumariamente indeferidos por falta de legítimo interesse os protestos formulados por quem não demonstra vínculo com a relação jurídica invocada ou que se mostrem desnecessários frente aos próprios fatos descritos na petição inicial.

4. O segundo requisito – não-nocividade da medida – exige que o protesto não atente contra a liberdade de contratar ou de agir juridicamente, ou seja, o seu deferimento não deve dar causa a dúvidas e incertezas que possam impedir a formação de contrato ou a realização de negócio lícito. Esse impedimento, porém, é de natureza psicológica, porque o protesto não tem a força de direito de impedir qualquer negócio jurídico. Na prática, portanto, o Juiz deve tolher o uso abusivo da medida, como meio de suscitar suspeitas infundadas ou exageradas sobre o bem ou direito objeto do protesto, a ponto de afastar indevidamente o possível interesse de terceiros em firmar negócio jurídico envolvendo o mencionado bem ou direito.

5. Ainda que possa, eventualmente, ter reflexos negativos para o protestado, a publicação de editais deve ser deferida sempre que a publicidade for essencial à finalidade do protesto, notadamente nas situações em que a informação deva alcançar toda a coletividade.

6. Recurso especial a que se nega provimento.

(RMS 35.481/SP, Rel. Ministro MASSAMI UYEDA, Rel. p/ Acórdão Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 28/08/2012, DJe 10/09/2012 – grifei.)

Nesse mesmo sentido:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. AÇÃO CAUTELAR DE PROTESTO DE ALIENAÇÃO DE BENS. ART. 869 DO CPC. PODER GERAL DE CAUTELA. ART. 798 DO CPC. LEGÍTIMO INTERESSE E NÃO NOCIVIDADE. REQUISITOS AUTORIZADORES SATISFEITOS. AGRAVO REGIMENTAL NÃO PROVIDO.

1. O protesto contra a alienação de bens, calcado no art. 869 do Código de Processo Civil, reclama a presença de dois requisitos: legítimo interesse e não prejudicialidade efetiva da medida.

2. “O primeiro requisito – legítimo interesse – se traduz na necessidade ou utilidade da medida para assegurar ao promovente o fim colimado. Assim, devem ser sumariamente indeferidos por falta de legítimo interesse os protestos formulados por quem não demonstra vínculo com a relação jurídica invocada ou que se mostrem desnecessários frente aos próprios fatos descritos na petição inicial. O segundo requisito – não-nocividade da medida – exige que o protesto não atente contra a liberdade de contratar ou de agir juridicamente, ou seja, o seu deferimento não deve dar causa a dúvidas e incertezas que possam impedir a formação de contrato ou a realização de negócio lícito. Esse impedimento, porém, é de natureza psicológica, porque o protesto não tem a força de direito de impedir qualquer negócio jurídico. Na prática, portanto, o Juiz deve tolher o uso abusivo da medida, como meio de suscitar suspeitas infundadas ou exageradas sobre o bem ou direito objeto do protesto, a ponto de afastar indevidamente o possível interesse de terceiros em firmar negócio jurídico envolvendo o mencionado bem ou direito” (RMS 35.481/SP, Rel. p/ Acórdão Ministra Nancy Andrighi, Terceira Turma, julgado em 28/08/2012, DJe 10/09/2012)

3. Ademais, esta Corte pacificou o entendimento quanto à legalidade do protesto contra alienação de imóvel, no julgamento dos Embargos de Divergência em Recurso Especial n. 440.837/RS, relator p/ acórdão o Ministro Barros Monteiro, DJ de 28/5/2007, que uniformizou a jurisprudência no sentido de se permitir a averbação dentro dos limites do poder geral de cautela do juiz.

4. Na espécie, o protesto foi postulado como forma de preservar parte do patrimônio dos impetrantes a fim de garantir o cumprimento de eventual condenação em outra ação judicial, sob o argumento de que os impetrantes estavam procurando alienar ou mesmo transferir bens de sua titularidade a terceiros. Desse modo, ressoa inequívoco o legítimo interesse e a não nocividade da medida.

5. Agravo regimental não provido.

(AgRg no RMS 48.140/GO, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 03/12/2015, DJe 11/12/2015 – grifei.)

Nesses termos, a legalidade do protesto pressupõe a análise dos requisitos de legítimo interesse e não prejudicialidade efetiva da medida.

Inicialmente, cumpre verificar o legítimo interesse da medida de protesto contra a alienação do bem.

Para efeitos da Lei n. 8.009/1990, considera-se bem de família impenhorável a constituição de residência em “um único imóvel utilizado pelo casal ou pela entidade familiar para moradia permanente” (art. 5º). Complementa no parágrafo único, “na hipótese de o casal, ou entidade familiar, ser possuidor de vários imóveis utilizados como residência, a impenhorabilidade recairá sobre o de menor valor, salvo se outro tiver sido registrado, para esse fim, no Registro de Imóveis e na forma do art. 70 do Código Civil”.

No entanto, “a finalidade da Lei nº 8.009/90 não é proteger o devedor contra suas dívidas, tornando seus bens impenhoráveis, mas, sim, reitera-se, a proteção da entidade familiar no seu conceito mais amplo” (REsp 1126173/MG, Rel. Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, TERCEIRA TURMA, julgado em 09/04/2013, DJe 12/04/2013). Sobre o tema:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE RESCISÃO DE CONTRATO CUMULADA COM PEDIDO DE PERDAS E DANOS. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. LEVANTAMENTO DE PENHORA SOBRE IMÓVEL CONSIDERADO COMO BEM DE FAMÍLIA. INDENIZAÇÃO CIVIL ORIUNDA DE CONDUTA TIPIFICADA COMO ILÍCITO PENAL. APLICAÇÃO ANALÓGICA DA EXCEÇÃO PREVISTA NO ART. 3º, VI, DA LEI 8.009/90. IMPOSSIBILIDADE. IMPENHORABILIDADE MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.

1. O escopo da Lei 8.009/90 não é proteger o devedor contra suas dívidas, mas visa à proteção da entidade familiar no seu conceito mais amplo, motivo pelo qual as hipóteses de exceção à impenhorabilidade do bem de família, em virtude do seu caráter excepcional, devem receber interpretação restritiva.

2. Impossibilidade, no caso concreto, de afastar a impenhorabilidade do bem de família, por interpretação analógica do art. 3º, VI, da Lei 8.009/90, sob o argumento de que a indenização civil é oriunda de conduta tipificada como ilícito penal (estelionato).

3. O art. 3º, VI, da Lei 8.009/90 representa norma de exceção à ampla proteção legal conferida ao bem de família. Dessa forma, a regra interpretativa aplicável não deve ser estendida a outras hipóteses não previstas pelo legislador.

4. No recurso especial, o Superior Tribunal de Justiça só pode examinar os fatos tais como delineados pelas instâncias ordinárias.Desse modo, o alegado fato novo (superveniência de sentença penal condenatória) não pode ser levado em consideração no julgamento do recurso, porque deve ser submetido previamente à consideração das instâncias ordinárias.

5. Agravo interno não provido.

(AgInt no REsp 1357413/SP, Rel. Ministro RAUL ARAÚJO, QUARTA TURMA, julgado em 18/10/2018, DJe 25/10/2018 – grifei.)

Logo, cessada a condição determinante da impenhorabilidade – proteção da entidade familiar –, pode haver a constrição sobre o bem imóvel.

Esclareço não desconhecer o entendimento desta Corte Superior quanto à ausência de interesse jurídico em tornar ineficaz futura venda do imóvel impenhorável, tendo em vista a impossibilidade de expropriação do bem para satisfazer a execução, pois a anulação da venda a terceiro ocasionaria apenas o retorno do imóvel ao patrimônio do devedor. Confiram-se:

PROCESSUAL CIVIL. BEM DE FAMÍLIA. IMPENHORABILIDADE. DECISÃO IRRECORRIDA. PRECLUSÃO. FRAUDE À EXECUÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. IRRELEVÂNCIA DO BEM PARA A EXECUÇÃO.

1. Decidida a questão da impenhorabilidade do bem de família, nos termos da Lei n.º 8.009/90, não é dado ao magistrado, ao seu talante, rever a decisão anterior, porquanto operada a preclusão quanto a matéria.

2. Não há fraude à execução na alienação de bem impenhorável nos termos da Lei n.º 8.009/90, tendo em vista que o bem de família jamais será expropriado para satisfazer a execução, não tendo o exequente nenhum interesse jurídico em ter a venda considerada ineficaz.

3. “O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova de má-fé do terceiro adquirente”. Súmula n.º 375/STJ.

4. Recurso especial não conhecido.

(REsp 976.566/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 20/04/2010, DJe 04/05/2010.)

TRIBUTÁRIO E PROCESSUAL CIVIL. ALIENAÇÃO DE BEM DE FAMÍLIA. EXECUÇÃO FISCAL EM CURSO. FRAUDE. NÃO-OCORRÊNCIA.

1. Não gera prejuízo para o Fisco o afastamento da fraude à execução em relação a imóvel considerado bem de família, impenhorável por força de lei. Caso se anulasse a venda a terceiro, a conseqüência seria o retorno do bem ao patrimônio do devedor. Inteligência do artigo 3º da Lei 8.009/90.

2. Recurso especial improvido.

(REsp 846.897/RS, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/03/2007, DJ 23/03/2007.)

No entanto, conforme esclarecido, o protesto contra alienação de bens não possui o objetivo de obstar ou anular o negócio jurídico de venda do imóvel impenhorável, mas somente informar terceiros de boa-fé a respeito da pretensão do credor de penhora da propriedade, no caso de sua futura descaracterização como bem de família, prevenindo possíveis prejuízos ao adquirente.

A impenhorabilidade do bem de família nada mais é do que uma garantia jurídica incidente sobre uma situação fática, qual seja, a moradia familiar. Com efeito, os fatos podem ser modificados por circunstâncias diversas, como, por exemplo, o recebimento de herança ou a compra de um segundo imóvel, além da mudança de residência da família.

Nesse aspecto, a proteção legal é pautada pelo enquadramento circunstancial no momento de sua análise, podendo ser revista em caso de alteração da situação fática.

Assim, ao perder a qualidade de bem de família, a venda posterior do imóvel com registro de protesto contra alienação de bens pode, numa análise casuística, configurar fraude à execução.

Em alguns julgados desta Corte Superior, inclusive, foi mantido o afastamento da proteção legal conferida pela Lei n. 8.009/1990, em razão de reconhecimento, pela instância originária, da ocorrência de fraude à execução. Confiram-se:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. IMPENHORABILIDADE DE BEM DE FAMÍLIA. FRAUDE À EXECUÇÃO RECONHECIDA EM AÇÃO PAULIANA. ACÓRDÃO EM SINTONIA COM O ENTENDIMENTO FIRMADO NO STJ. AUSÊNCIA DE PREQUESTIONAMENTO. RECURSO NÃO PROVIDO.

1.Reconhecida a fraude à execução, deve ser afastada a impenhorabilidade do bem de família. Precedentes desta Corte.

2. No presente caso, as conclusões relativas à caracterização de fraude à execução não podem ser revistas por esta Corte Superior, em sede de recurso especial, pois demandaria necessariamente, reexame de fatos e provas, o que é vedado em razão do óbice da Súmula 7 do STJ.

3. O tema inserto nos artigos 1°, 3°, caput, e 4°, da Lei n° 8.009/1990, tidos por contrariados, não foi objeto de debate no acórdão recorrido, tampouco foram opostos embargos de declaração a fim de suprir eventual omissão. É entendimento assente neste Superior Tribunal de Justiça a exigência do prequestionamento dos dispositivos tidos por violados, ainda que a contrariedade tenha surgido no julgamento do próprio acórdão recorrido. Incidem, na espécie, as Súmulas 282 e 356 do Supremo Tribunal Federal.

4. Agravo interno não provido.

(AgInt no AREsp 1097404/RS, Rel. Ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, julgado em 22/08/2017, DJe 28/08/2017.)

AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. FRAUDE À EXECUÇÃO. DESCARACTERIZAÇÃO. BEM DE FAMÍLIA. PENHORABILIDADE. AGRAVO REGIMENTAL IMPROVIDO.

1. Caracterizada a fraude a execução é de mister o afastamento da impenhorabilidade do bem de família. Precedentes.

2. Agravo regimental improvido.

(AgRg no REsp 1293150/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 17/03/2016, DJe 05/04/2016.)

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. IMPENHORABILIDADE. BEM DE FAMÍLIA. FRAUDE À EXECUÇÃO. SÚMULA 7/STJ.

1. Afasta-se a proteção conferida pela Lei 8.009/90, quando caracterizada fraude à execução.

2. É vedado, nesta instância especial, o reexame do conjunto fático-probatório. Incidência da Súmula 7/STJ.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no AREsp 334.975/SP, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 07/11/2013, DJe 20/11/2013.)

Ademais, a averbação da pretensão do credor no registro de imóveis proporciona segurança jurídica para o eventual adquirente do bem, notadamente quanto aos possíveis efeitos decorrentes da aquisição.

Estabelecidas tais premissas, conclui-se que está caracterizado o legítimo interesse do executante no registro do protesto contra alienação de bens, em razão da utilidade da medida para o fim colimado.

Passo à verificação do pressuposto da não prejudicialidade efetiva da medida de protesto contra a alienação do bem no registro da matrícula do imóvel.

O protesto, nos moldes delineados, não impede, por si só, a liberdade de contratar da executada. O instituto apenas procura resguardar a penhora do imóvel pelo executante, no caso de sua descaraterização como bem de família, que pode ocorrer, inclusive, se provada a fraude à execução, como na hipótese trazida pelo art. 4º da Lei n. 8.009/1990, quando há aquisição, pelo devedor insolvente, de imóvel de maior valor, nele fixando residência, “desfazendo-se ou não da moradia antiga”:

Art. 4.º Não se beneficiará do disposto nesta Lei aquele que, sabendo-se insolvente, adquire de má-fé imóvel mais valioso para transferir a residência familiar, desfazendo-se ou não da moradia antiga.

§ 1º Neste caso, poderá o juiz, na respectiva ação do credor, transferir a impenhorabilidade para a moradia familiar anterior, ou anular-lhe a venda, liberando a mais valiosa para execução ou concurso, conforme a hipótese.

De fato, ainda que possa ter reflexos negativos para a recorrente, a publicidade da pretensão de futura penhora do bem é essencial para proteção de terceiros de boa-fé e preservação do direito do executante de futura constrição do bem imóvel.

Por fim, consigno a decisão monocrática proferida no REsp n. 1.645.639/PR, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Belizze, que entendeu ser possível a averbação premonitória na matrícula do imóvel considerado bem de família, nos seguintes termos:

De outra banda, não deve ser alterada a conclusão do acórdão quanto à notificação premonitória. Ainda que o imóvel tenha sido considerado bem de família, a averbação tem o condão de assegurar publicidade à situação do recorrente, e uma eventual alienação nas circunstâncias atuais poderia, em tese, acarretar prejuízo para terceiros. (Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, 22/02/2018)

Diante do todo o exposto, NEGO PROVIMENTO ao recurso especial.

É como voto.

VOTO-VISTA

EXMO. SR. MINISTRO RAUL ARAÚJO:

Relembro o caso.

Os autos historiam que a ora recorrida, TRICURY FACTORING SOCIEDADE DE FOMENTO COMERCIAL LTDA propôs medida cautelar de protesto de alienação de bens em desfavor da ora recorrente, ANTONIA CARLA DEL CLARO, visando a averbação de protesto nas duas matrículas de imóvel da ora recorrente, o qual é bem de família.

A exordial da medida cautelar (fls. 15-24) relata ter a recorrida, no ano 2000, ajuizado ação monitória (fls. 42-57), julgada procedente – sentença às fls. 217-218 e acórdão às fls. 286-291 -, para converter em título executivo as notas promissórias vencidas e prescritas, oriundas de mútuo financeiro firmado pelas ora litigantes, cuja dívida, em valor histórico, é de R$51.408,00 (cinquenta e um mil, quatrocentos e oito reais).

Na referida medida cautelar, posterior à ação monitória, pleiteou “(…) o registro da presente medida cautelar nas matrículas dos imóveis de propriedade da Requerida, para se dar conhecimento do protesto a terceiros e, evitar que mais pessoas sejam indevidamente lesadas” (fl. 23).

O il. Juízo da 21ª Vara Cível do Foro Central da Comarca de São Paulo/SP deferiu o pedido, nos termos da decisão assim vazada (fl. 478):

“Pretende o autor, mediante a presente medida cautelar onerar os bens imóveis que integram o patrimônio da requerida para a satisfação do débito judicial reconhecido em ação monitória que se processa perante a 21ª Vara Cível.

Não há interesse na penhora dos bens e sim apenas de dar publicidade a terceiros da existência do referido crédito para assegurar a integridade do imóvel, na hipótese de cessação da impenhorabilidade do bem de família por qualquer das hipóteses previstas em lei (venda do bem, alteração de residência da devedora, óbito da devedora).

Trata-se de uma medida que visa preservar o direito do credor de futura constrição do bem que integra o patrimônio do devedor caso fique superada a causa atual de impenhorabilidade, o que é perfeitamente admissível nos termos do artigo 867 do CPC.

Ante o exposto, DEFIRO a efetivação do protesto, com a notificação pessoal da executada, bem como com a averbação pelo Oficial de Registro de Imóveis competente nas matrículas n. 58.074 e 58.075 dos indigitados imóveis de existência do protesto contra a alienação dos mesmo em decorrência da tramitação da mencionada ação monitória, expedindo-se a quanto necessário para o cumprimento das medidas supra referida.” (grifou-se)

Inconformada, ANTONIA CARLA DEL CLARO interpôs agravo de instrumento, que foi desprovido pelo eg. TJ-SP, nos termos do v. acórdão assim ementado (fl. 531):

“MEDIDA CAUTELAR – Protesto contra alienação de bens – Medida acautelatória que visa resguardar direitos e prevenir responsabilidade – Averbação no Registro de Imóveis – Medida que altera o caráter informativo da cautelar, impondo observar o princípio do contraditório e da ampla devesa – Alegação inconsistente – Art. 871 do CPC – Providência admitida como poder geral de cautela justificada na necessidade de dar conhecimento do protesto a terceiros de boa-fé, não alterando o caráter informativo da medida – Decisão mantida – Recurso improvido.”

Irresignada, ANTONIA CARLA DEL CLARO aviou recurso especial apontando malferimento ao art. 867 do CPC/73 e ao art. 1º da Lei 8.009/90, sustentando, em apertada síntese, a impossibilidade do protesto, uma vez que seu imóvel, por ser bem de família, seria impenhorável e que a recorrida não teria interesse de agir, na medida em que sua pretensão seria apenas impedir futuro negócio jurídico envolvendo o bem de família.

O relator, eminente Ministro Antonio Carlos Ferreira, em sessão de julgamento na eg. Quarta Turma, apresentou voto pelo desprovimento do recurso especial.

Naquela assentada, pedi vista dos autos para exame mais próximo da controvérsia.

A ora recorrente pretende obter o cancelamento da aludida averbação imobiliária sobre seu bem de família, apontando no especial malferimento aos seguintes dispositivos legais:

– do CPC/73:

“Art. 867. Todo aquele que desejar prevenir responsabilidade, prover a conservação e ressalva de seus direitos ou manifestar qualquer intenção de modo formal, poderá fazer por escrito o seu protesto, em petição dirigida ao juiz, e requerer que do mesmo se intime a quem de direito.”

– da Lei 8.009/90:

“Art. 1º O imóvel residencial próprio do casal, ou da entidade familiar, é impenhorável e não responderá por qualquer tipo de dívida civil, comercial, fiscal, previdenciária ou de outra natureza, contraída pelos cônjuges ou pelos pais ou filhos que sejam seus proprietários e nele residam, salvo nas hipóteses previstas nesta lei.”

Nos termos do voto do ilustrado relator, não se constata violação aos supratranscritos dispositivos legais, na medida em que, sob a alegação de impenhorabilidade do bem de família, sustenta a recorrente ser devido o cancelamento da referida averbação. No entanto, os referidos artigos de lei não levam a tal conclusão.

Com efeito, a impenhorabilidade do bem de família não foi maculada pela medida acautelatória, deferida em favor da ora recorrida.

Na realidade, sob o prisma do art. 869 do CPC/73, como salienta o eminente Relator, estão presentes os requisitos necessários ao questionado protesto. A ora recorrida tem legítimo interesse na medida, pois é credora da ora recorrente, do quantum de R$51.408,00, como se infere da cópia da sentença – datada de 09/11/2000 – exarada nos autos da ação monitória. E, como consta na exordial da medida cautelar, foram frustradas as anteriores tentativas para encontrar bens da ora recorrente, visando à satisfação do crédito cobrado.

Assim, também à luz do art. 867 do CPC/73, a pretensão da ora recorrida mostra-se cabível para “(…) ressalva de seus direitos ou manifestar qualquer intenção de modo formal, poderá fazer por escrito o seu protesto, em petição dirigida ao juiz”.

Por seu turno, não é afetada a garantia legal de impenhorabilidade do bem de família, pois o imóvel mantém sua condição de impenhorabilidade, conforme o art. 1º da Lei 8.009/90.

Com a medida deferida, apenas se previnem terceiros acerca do direito de crédito da ora recorrida, com possibilidade de embaraçar a eventual futura realização de negócio jurídico envolvendo o imóvel. A pretensão do credor é, portanto, legítima, pois somente afetará a garantia legal na eventual hipótese de o próprio titular do benefício resolver descaracterizar o prédio, como bem de família, disponibilizando-o para alienação. A averbação tratada em nada impede que a devedora e sua família continuem a residir e usufruir do bem de família. Somente no caso de pretender a recorrente alienar o imóvel a terceiro desprevenido, momento no qual o bem estará perdendo aquela mencionada característica, de bem de família, ficará a recorrente atrapalhada e, provavelmente, frustrada nesse ilegítimo desiderato, de prevalecer-se do bem de família para auferir vantagem econômica sem pagar dívidas preexistentes.

Como se vê, a averbação imobiliária do referido protesto é medida salutar não só para a credora, ora recorrida, como também para prevenir prejuízos ou aborrecimentos a terceiros de boa-fé.

A título de acréscimo de fundamentação, pode-se registrar, analogicamente, que o provimento buscado pela devedora, no recurso especial, conflita com a cautela exigida de credor para a caracterização de fraude à execução, conforme sintetizado na Súmula 375/STJ, que assim dispõe, in verbis:

“O reconhecimento da fraude à execução depende do registro da penhora do bem alienado ou da prova da má-fé do terceiro adquirente”.

Por analogia, verifica-se que a pretensão do recurso especial conflita com a atitude diligente que se exige de eventual credor para fins de reconhecimento de fraude contra credores, em caso de alienação de bem por devedor.

Com essas considerações, acompanho o judicioso voto do eminente Relator,  Ministro Antonio Carlos Ferreira.

É como voto. – – /

Dados do processo:

STJ – REsp nº 1.236.057 – São Paulo – 4ª Turma – Rel. Min. Antonio Carlos Ferreira – DJ 28.04.2021

Fonte: INR Publicações

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Portaria CORREGEDORIA NACIONAL DE JUSTIÇA – CNJ nº 38, de 27.04.2021 – D.J.E.: 28.04.2021.

Ementa

Determina a publicação do calendário de inspeções para verificação do funcionamento das corregedorias da Justiça Estadual, em maio de 2021.


CORREGEDORA NACIONAL DE JUSTIÇA, no uso de suas atribuições legais e regimentais,

CONSIDERANDO a atribuição da Corregedoria Nacional de Justiça de realizar inspeções para apuração de fatos relacionados ao conhecimento e à verificação do funcionamento dos serviços judiciais e auxiliares, havendo ou não evidências de irregularidades;

CONSIDERANDO o disposto nos artigos 48 a 53 do Regimento Interno do Conselho Nacional de Justiça;

CONSIDERANDO que o cumprimento do dever de zelar pelo aprimoramento dos serviços judiciários determina que a Corregedoria Nacional de Justiça fiscalize as diversas unidades do Poder Judiciário e os serviços por ele fiscalizados, nos termos do art. 103– B, §4º, da Constituição da República Federativa do Brasil,

RESOLVE:

Art. 1º Tornar público o calendário de inspeções a serem realizadas em maio de 2021, na modalidade a distância, nas corregedorias vinculadas aos Tribunais de Justiça, com vistas à verificação do funcionamento das atividades relacionadas às atribuições do foro extrajudicial:

Tribunal Unidade Data
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins Corregedoria 04/05/2021
Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro Corregedoria 04/05/2021
Tribunal de Justiça do Estado do Acre Corregedoria 11/05/2021
Tribunal de Justiça do Estado da Bahia Corregedoria 11/05/2021
Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso Corregedoria 18/05/2021
Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba Corregedoria 18/05/2021

Parágrafo único. O presente calendário não prejudica a realização das inspeções presenciais que serão oportunamente agendadas, inclusive as que se encontram temporariamente suspensas pela Portaria n. 18, de 1º de março de 2021.

Art. 2º Esta portaria entra em vigor na data de sua publicação.

Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA

Corregedora Nacional de Justiça


Nota(s) da Redação INR

Este texto não substitui o publicado no D.J.E-CNJ de 28.04.2021.

O conteúdo deste ato é coincidente com aquele publicado oficialmente. Eventuais alterações posteriores em seu objeto, ou sua revogação, não são consideradas, isto é, este ato permanecerá, na Base de Dados INR, tal qual veio ao mundo jurí­dico, ainda que, posteriormente, alterado ou revogado.

Fonte: INR Publicações

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