TJ/SP – Registro de Imóveis – Incorporação imobiliária – Patrimônio de afetação já averbado – Requerimento para que seja incluído no patrimônio de afetação imóvel distinto daquele que recebeu a incorporação imobiliária, como garantia em favor dos adquirentes das futuras unidades autônomas – Ausência de previsão na Lei nº 4.591/64 – Recurso não provido.


  
 

Número do processo: 1002782-80.2019.8.26.0071

Ano do processo: 2019

Número do parecer: 485

Ano do parecer: 2019

Parecer

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CORREGEDORIA GERAL DA JUSTIÇA

Processo CG n° 1002782-80.2019.8.26.0071

(485/2019-E)

Registro de Imóveis – Incorporação imobiliária – Patrimônio de afetação já averbado – Requerimento para que seja incluído no patrimônio de afetação imóvel distinto daquele que recebeu a incorporação imobiliária, como garantia em favor dos adquirentes das futuras unidades autônomas – Ausência de previsão na Lei nº 4.591/64 – Recurso não provido.

Excelentíssimo Senhor Corregedor Geral da Justiça:

Trata-se de recurso interposto por Assuã Incorporadora Ltda. contra r. decisão que manteve a recusa do Sr. 1º Oficial de Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Bauru em averbar no imóvel objeto da matrícula n.º 125.708, indicado como de propriedade da recorrente, que foi afetado à incorporação imobiliária promovida no objeto da matrícula n.º 92.919.

O recorrente alegou, em suma, que pretende reverter para a incorporação imobiliária todo o ativo a ser obtido com a venda do imóvel objeto da matrícula n.º 125.708, visando assegurar o empreendimento denominado Terrazze Del Veneto, Torres 3 e 4, a ser construído no imóvel objeto da matrícula n.º 92.919. Disse que a instituição do patrimônio de afetação tem como efeito vincular o terreno, as acessões objeto da incorporação imobiliária, e os demais bens e direitos a ela vinculados para assegurar a consecução da incorporação e a entrega das unidades autônomas aos seus adquirentes. Afirmou que cabe ao incorporador instituir o patrimônio de afetação, conforme a sua conveniência, e que para essa finalidade pode atribuir imóvel distinto do que é objeto da incorporação imobiliária. Esclareceu que o patrimônio de afetação não altera a propriedade do imóvel, mas somente o destina à finalidade específica que é a de garantir a construção e a entrega das unidades autônomas aos adquirentes. Informou que promove a incorporação imobiliária com recursos próprios e que sua pretensão também tem amparo na autonomia da vontade por se tratar de relação de direito privado. Requereu a reforma da r. decisão para que o patrimônio de afetação seja averbado na matrícula n.125.708, visando garantir a incorporação imobiliária registrada na matrícula n.º 92.919 (fls. 74/79).

A douta Procuradoria Geral de Justiça manifestou-se pelo não provimento do recurso (fls. 96/99).

Opino.

Conforme informado pelo Sr. Oficial de Registro de Imóveis às fls. 48, o recorrente promoveu a incorporação imobiliária do imóvel objeto da matrícula n.º 92.919 em que foi averbada, sob n.º 333, a constituição do patrimônio de afetação.

Neste caso, o que se pretende é afetar o imóvel objeto matrícula n.º 125.708 ao regime do patrimônio de afetação constituído para assegurar a incorporação imobiliária prevista na matrícula n. 92.919 do 1º Registro de Imóveis, Títulos e Documentos e Civil de Pessoa Jurídica da Comarca de Bauru.

Contudo, o patrimônio de afetação, previsto nos arts. 31-A e seguintes da Lei nº 4.591/64, consiste na segregação dos bens e direitos que compõem a incorporação imobiliária para a consecução da finalidade específica de assegurar a sua conclusão.

Dessa forma dispõe o art. 31-A da Lei nº 4.591/64 que determina que o terreno e as acessões objeto da incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos vinculados à incorporação, podem se apartados do restante do patrimônio do incorporador mediante submissão ao regime da afetação:

“Art. 31-A. A critério do incorporador, a incorporação poderá ser submetida ao regime da afetação, pelo qual o terreno e as acessões objeto de incorporação imobiliária, bem como os demais bens e direitos a ela vinculados, manter-se-ão apartados do patrimônio do incorporador e constituirão patrimônio de afetação, destinado à consecução da incorporação correspondente e à entrega das unidades imobiliárias aos respectivos adquirentes.

§ 1º O patrimônio de afetação não se comunica com os demais bens, direitos e obrigações do patrimônio geral do incorporador ou de outros patrimônios de afetação por ele constituídos e só responde por dívidas e obrigações vinculadas à incorporação respectiva (…)”.

Assim, o art. 31-A da Lei nº 4.591/64 não autoriza que imóvel distinto daquele que recebeu a incorporação imobiliária seja abrangido pelo regime da afetação, com isso visando garantir que não será atingido por eventuais outras obrigações de seu proprietário.

A par da ausência de previsão específica no art. 31-A da Lei nº 4.591/64, a inclusão de bens não vinculados à incorporação imobiliária não se coaduna com a finalidade do patrimônio de afetação que, reitero, é a de assegurar que o imóvel incorporado e os bens vinculados à incorporação imobiliária efetivamente sirvam para a sua conclusão que ocorrerá com o término da construção do edifício, o registro da instituição do condomínio e a transmissão das unidades autônomas aos seus adquirentes.

Para isso, a instituição do patrimônio de afetação acarreta deveres complementares ao incorporador que deve manter apartados os bens e direitos relativos a cada uma das incorporações imobiliárias que promover, de forma a evitar a confusão entre os patrimônios afetados e entre esses e o restante do seu patrimônio não segregado.

Esses deveres adicionais são previstos no art. 31-D da Lei nº 4.591/64 que dispõe:

“Art. 31-D. Incumbe ao incorporador:

I – promover todos os atos necessários à boa administração e à preservação do patrimônio de afetação, inclusive mediante adoção de medidas judiciais;

II – manter apartados os bens e direitos objeto de cada incorporação;

III – diligenciar a captação dos recursos necessários à incorporação e aplicá-los na forma prevista nesta Lei, cuidando de preservar os recursos necessários à conclusão da obra;

IV – entregar à Comissão de Representantes, no mínimo a cada três meses, demonstrativo do estado da obra e de sua correspondência com o prazo pactuado ou com os recursos financeiros que integrem o patrimônio de afetação recebidos no período, firmados por profissionais habilitados, ressalvadas eventuais modificações sugeridas pelo incorporador e aprovadas pela Comissão de Representantes;

V – manter e movimentar os recursos financeiros do patrimônio de afetação em conta de depósito aberta especificamente para tal fim;

VI – entregar à Comissão de Representantes balancetes coincidentes com o trimestre civil, relativos a cada patrimônio de afetação;

VII – assegurar à pessoa nomeada nos termos do art. 31-C o livre acesso à obra, bem como aos livros, contratos, movimentação da conta de depósito exclusiva referida no inciso V deste artigo e quaisquer outros documentos relativos ao patrimônio de afetação; e

VIII – manter escrituração contábil completa, ainda que esteja desobrigado pela legislação tributária” (grifei).

Destarte, o incorporador não pode incluir imóvel distinto do incorporado no regime de afetação, ainda que com a finalidade de assegurar em seu favor a existência de patrimônio suficiente para custear a incorporação imobiliária que promove com recursos próprios.

Essa possibilidade também não decorre da autonomia da vontade privada porque na incorporação imobiliária o regime de afetação é previsto na Lei nº 4.591/64 que contem regras próprias que asseguram que a cada incorporação são afetados bens e direitos específicos, de forma a que não ocorra confusão entre os bens integrantes da incorporação e os demais que integram o restante do patrimônio do incorporador.

Ante o exposto, o parecer que submeto à elevada apreciação de Vossa Excelência é no sentido de negar provimento ao recurso.

Sub censura.

São Paulo, 3 de setembro de 2019.

José Marcelo Tossi Silva

Juiz Assessor da Corregedoria

DECISÃO: Aprovo o parecer do MM. Juiz Assessor da Corregedoria, por seus fundamentos que adoto, e nego provimento ao recurso. Oportunamente, remetam-se os autos à Vara de origem. Intimem-se. São Paulo, 05 de setembro de 2019. (a) GERALDO FRANCISCO PINHEIRO FRANCO, Corregedor Geral da Justiça – Advogados: ANDRÉ LUIZ BIEN DE ABREU, OAB/SP 184.586 e LUIZ BOSCO JUNIOR, OAB/SP 95.451.

Diário da Justiça Eletrônico de 20.09.2019

Decisão reproduzida na página 178 do Classificador II – 2019

Fonte: INR Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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