1VRP/SP: Registro de Imóveis. Inventário. ITCMD. A atribuição da totalidade do imóvel em usufruto à viúva meeira e o recebimento da nua propriedade pelo herdeiro em pagamento de seu quinhão não caracterizam, a princípio, doação, pelo que indevido o recolhimento do imposto inter vivos.


  
 

Processo 1139216-18.2021.8.26.0100

Dúvida – Registro de Imóveis – Paulo Isidro Silva – – Katia Rosario Silva – Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a dúvida suscitada para afastar os óbices registrários. Regularize, a serventia judicial, o polo passivo deste procedimento, a fim de que seja integrado somente por Paulo Isidro Silva. Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios. Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe. P.R.I.C. – ADV: NIVEA ARAUJO PIOTTO (OAB 427585/SP)

Íntegra da decisão:

SENTENÇA

Processo Digital nº: 1139216-18.2021.8.26.0100

Classe – Assunto Dúvida – Registro de Imóveis

Suscitante: 17º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

Suscitado: Paulo Isidro Silva e outro

Juiz(a) de Direito: Dr(a). Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Vistos.

Trata-se de dúvida suscitada pelo Oficial do 17º Registro de Imóveis da Capital a requerimento de Paulo Isidro Silva, diante de negativa em se proceder ao registro da escritura de inventário e partilha dos bens deixados pelo espólio de Isidro Silva, lavrada pelo 21º Tabelião de Notas desta Capital (livro 3985, páginas 349/353), com partilha do imóvel descrito na matrícula n.11.877 daquela serventia.

A devolução do título se deu em razão da utilização, como base de cálculo do imposto sobre transmissão causa mortis e doação (ITCMD), do valor correspondente a 50% do imóvel partilhado, muito embora a partilha tenha instituído o usufruto vitalício da totalidade do bem a favor da viúva, Iolinda Piva Silva, e atribuído a nua-propriedade integral do imóvel ao herdeiro Paulo Isidro Silva; que deveria ter sido utilizado, como base de cálculo, o valor correspondente, respectivamente, a 1/3 e 2/3 do imóvel (§ 2º, do artigo 9º, da Lei n. 10.705/2000); que se faz necessária a exibição de declaração relativa à parte doada da viúva-meeira ao herdeiro, com comprovação de recolhimento do tributo devido e exibição da respectiva guia original ou cópia autenticada (prenotação n.251.536). Documentos vieram às fls.06/62.

A parte suscitada manifestou-se às fls.67/70, aduzindo que a partilha foi realizada de acordo com a vontade das partes, maiores e capazes, com atribuição do usufruto da totalidade do imóvel à viúva e a nua-propriedade ao único herdeiro-filho; que o recolhimento do imposto foi efetuado de acordo com a legislação competente, estando corretos os cálculos de acordo com precedentes neste sentido.

O Ministério Público opinou pela improcedência, com afastamento dos óbices (fls.74/77).

É o relatório.

Fundamento e decido.

No mérito, a dúvida improcede. Vejamos os motivos.

De início, vale ressaltar que o Oficial dispõe de autonomia no exercício de suas atribuições, podendo recusar títulos que entender contrários à ordem jurídica e aos princípios que regem sua atividade (art. 28 da Lei n. 8.935/1994), o que não se traduz como falha funcional.

Esta conclusão se reforça pelo fato de que vigora, para os registradores, ordem de controle rigoroso do recolhimento do imposto por ocasião do registro do título, sob pena de responsabilidade pessoal (art. 289 da Lei n.6.015/73; art.134, VI, do CTN e art.30, XI, da Lei 8.935/1994).

Por outro lado, verifica-se que o C. Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a fiscalização devida não vai além da aferição sobre a existência ou não do recolhimento do tributo (e não se houve correto recolhimento do valor, sendo tal atribuição exclusiva do ente fiscal, a não ser na hipótese de flagrante irregularidade ou irrazoabilidade do cálculo):

“Ao oficial de registro incumbe a verificação de recolhimento de tributos relativos aos atos praticados, não a sua exatidão” (Apelação Cível 20522-0/9- CSMSP – J.19.04.1995 – Rel. Antônio Carlos Alves Braga).

“Todavia, este Egrégio Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a qualificação feita pelo Oficial Registrador não vai além da aferição sobre a existência ou não de recolhimento do tributo, e não sobre a integralidade de seu valor” (Apelação Cível 996-6/6 CSMSP, j. 09.12.2008 – Rel. Ruy Camilo).

“Este Egrégio Conselho Superior da Magistratura já fixou entendimento no sentido de que a qualificação feita pelo Oficial Registrador não vai além da aferição sobre a existência ou não de recolhimento do tributo, e não sobre a integralidade de seu valor” (Apelação Cível 0009480- 97.2013.8.26.0114 Campinas – j. 02.09.2014 – Rel. des. Elliot Akel).

No caso concreto, em que pese a cautela do Oficial, não há obstáculo real ao registro.

De fato, o valor informado pelo inventariante na declaração do ITCMD identifica-se com aquele adotado para fins de inventário (itens 9 e 10 – fl. 24 e 29).

A tributação com base no valor venal do imóvel na data do óbito não se mostra flagrantemente incorreta. Eventual diferença em relação ao valor recolhido, portanto, deve ser discutida na via adequada.

A atribuição da totalidade do imóvel em usufruto à viúva meeira e o recebimento da nua propriedade pelo herdeiro em pagamento de seu quinhão não caracterizam, a princípio, doação, pelo que indevido o recolhimento do imposto inter vivos.

Neste sentido (destaque nosso):

“Inventário e partilha. Decisão que determinou que fosse dada vista à Fazenda Estadual para manifestação sobre o “inter vivos”. Insurgência. Alegação de inexistência de doação. Renúncia de meação e instituição de usufruto vitalício em favor da viúva meeira. Partilha amigável. Usufruto que pode ser destacado da nua propriedade, já que possui expressão econômica. Doação não configurada. Jurisprudência deste E. Tribunal. Não incidência do tributo ‘inter vivos’. Recurso provido” (AI n. 2103742-51.2016.8.26.0000 – 4ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo – Des. Fábio Quadros – j.11.10.2018).

“Registro de imóveis – Escritura pública de inventário e partilha – Cessão da meação da viúva meeira e instituição de usufruto – Divisão entre meação e herança por meio de constituição de usufruto e transmissão da nua propriedade – Apresentação de guia de recolhimento do ITCMD – Dúvida improcedente – Recurso provido para afastar a exigência” (Apelação n.1001328-44.2020.8.26.0584 – Corregedor Geral da Justiça Des. Ricardo Anafe – j. 02/12/2021).

Diante do exposto, JULGO IMPROCEDENTE a dúvida suscitada para afastar os óbices registrários. Regularize, a serventia judicial, o polo passivo deste procedimento, a fim de que seja integrado somente por Paulo Isidro Silva.

Deste procedimento não decorrem custas, despesas processuais ou honorários advocatícios.

Oportunamente, ao arquivo com as cautelas de praxe.

P.R.I.C.

São Paulo, 25 de janeiro de 2022.

Luciana Carone Nucci Eugênio Mahuad

Juíza de Direito (DJe de 27.01.2022 – SP)

Fonte: DJe/SP.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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