TST:Recurso de Revista interposto na vigência da Lei 13.467/2017 – Acidente de trabalho – Responsabilidade civil – Manutenção de calhas – Queda do telhado que causou a morte do trabalhador – Indenização por danos moral e material – Transcendência política – A jurisprudência majoritária desta Corte firmou-se no sentido de a ausência de contrato de emprego, como nos casos de trabalho autônomo ou contratação de empresa especializada, não afasta o dever de indenizar decorrente de ato ilícito em acidentes de trabalho, ao contrário do que decidiu o regional – Reconhecida a transcendência política do debate trazido no recurso de revista – Recurso de Revista interposto na vigência da Lei 13.467/2017 – Acidente de trabalho – Responsabilidade civil – Manutenção de calhas – Queda do telhado que causou a morte do trabalhador – Indenização por danos moral e material – Transcendência política – Controvérsia sobre a responsabilidade civil por acidente de trabalho para fins de indenização por danos morais e materiais – O trabalhador – pai e esposo dos autores – sofreu uma queda de uma altura de dez metros enquanto executava serviços de manutenção das calhas da sede da ré, sem o uso de EPI’s, falecendo em decorrência de traumatismo crânio-encefálico – Os autores alegaram que a ré contratou o de cujus como autônomo para a execução dos serviços – A ré defendeu-se, aduzindo ter contratado a empresa Portal Calhas, especializada na execução desses serviços, a qual era composta pelo de cujus e dois dos autores, seus filhos – O Regional acolheu a tese de defesa e manteve a improcedência dos pedidos – Consignou que a ré “na condição de tomadora dos serviços, não tinha o dever legal de vigilância e fiscalização próprios de um contrato de emprego”, tampouco “ingerência sobre as atividades desempenhadas” pelo trabalhador “no sentido de coagi-lo a adotar as medidas de segurança necessárias à integridade física” – Concluiu que o acidente fatal decorreu de culpa exclusiva da vítima ao não tomar as devidas cautelas diante da atividade que desenvolvia – Em fundamento adicional, a respeito da tese recursal dos autores, registrou que: o “trabalhador autônomo é aquele que conduz e assume os riscos da própria atividade. Cabia, portanto, ao Sr. Antonio arcar com os equipamentos necessários não somente para a execução dos serviços, mas para o desenvolvimento seguro da atividade. Nessas condições, a ré não concorreu para o infortúnio, não tendo como ser responsabilizada.” – Nos termos da jurisprudência reiterada desta Corte a responsabilidade decorrente de acidente do trabalho apresenta natureza jurídica civil, em razão de culpa aquiliana por ato ilícito, consoante previsão dos arts. 186 e 927, caput e parágrafo único, do Código Civil e dos artigos art. 7º, caput e XXVIII, bem como do § 6º do art. 37 da Constituição Federal – Desse modo, o fato de o acidente ocorrer em relação de emprego, de trabalho autônomo, em contrato de empreitada ou mesmo de terceirização de serviços, não afasta a responsabilização do contratante e o respectivo dever de indenizar, caso presentes os requisitos respectivos – dano, nexo causal e culpa – Assim, o acidente fatal enquanto laborava para a ré demonstra o dano e o nexo causal – E a permissão, por parte da ré, de ocorrência de trabalho em sua sede, sem o uso de qualquer EPI, demonstra a culpa, na modalidade de negligência, a qual concorreu para o infortúnio – Patente o ato ilícito, impõe-se a responsabilização civil da ré e o consequente dever de indenizar os danos morais e materiais – Recurso de revista conhecido e parcialmente provido


  
 

ACÓRDÃO 

(6ª Turma)

GMACC/aol-lm/mrl/M

RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE CIVIL. MANUTENÇÃO DE CALHAS. QUEDA DO TELHADO QUE CAUSOU A MORTE DO TRABALHADOR. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAL E MATERIAL. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA. A jurisprudência majoritária desta Corte firmou-se no sentido de a ausência de contrato de emprego, como nos casos de trabalho autônomo ou contratação de empresa especializada, não afasta o dever de indenizar decorrente de ato ilícito em acidentes de trabalho, ao contrário do que decidiu o regional. Reconhecida a transcendência política do debate trazido no recurso de revista. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI 13.467/2017. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE CIVIL. MANUTENÇÃO DE CALHAS. QUEDA DO TELHADO QUE CAUSOU A MORTE DO TRABALHADOR. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAL E MATERIAL. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA. Controvérsia sobre a responsabilidade civil por acidente de trabalho para fins de indenização por danos morais e materiais. O trabalhador – pai e esposo dos autores – sofreu uma queda de uma altura de dez metros enquanto executava serviços de manutenção das calhas da sede da ré, sem o uso de EPI’s, falecendo em decorrência de traumatismo crânio-encefálico. Os autores alegaram que a ré contratou o de cujus como autônomo para a execução dos serviços. A ré defendeu-se, aduzindo ter contratado a empresa Portal Calhas, especializada na execução desses serviços, a qual era composta pelo de cujus e dois dos autores, seus filhos. O Regional acolheu a tese de defesa e manteve a improcedência dos pedidos. Consignou que a ré “na condição de tomadora dos serviços, não tinha o dever legal de vigilância e fiscalização próprios de um contrato de emprego”, tampouco “ingerência sobre as atividades desempenhadas” pelo trabalhador “no sentido de coagi-lo a adotar as medidas de segurança necessárias à integridade física”. Concluiu que o acidente fatal decorreu de culpa exclusiva da vítima ao não tomar as devidas cautelas diante da atividade que desenvolvia. Em fundamento adicional, a respeito da tese recursal dos autores, registrou que: o “trabalhador autônomo é aquele que conduz e assume os riscos da própria atividade. Cabia, portanto, ao Sr. Antonio arcar com os equipamentos necessários não somente para a execução dos serviços, mas para o desenvolvimento seguro da atividade. Nessas condições, a ré não concorreu para o infortúnio, não tendo como ser responsabilizada.” Nos termos da jurisprudência reiterada desta Corte a responsabilidade decorrente de acidente do trabalho apresenta natureza jurídica civil, em razão de culpa aquiliana por ato ilícito, consoante previsão dos arts. 186 e 927, caput e parágrafo único, do Código Civil e dos artigos art. 7º, caput e XXVIII, bem como do § 6º do art. 37 da Constituição Federal. Desse modo, o fato de o acidente ocorrer em relação de emprego, de trabalho autônomo, em contrato de empreitada ou mesmo de terceirização de serviços, não afasta a responsabilização do contratante e o respectivo dever de indenizar, caso presentes os requisitos respectivos – dano, nexo causal e culpa. Assim, o acidente fatal enquanto laborava para a ré demonstra o dano e o nexo causal. E a permissão, por parte da ré, de ocorrência de trabalho em sua sede, sem o uso de qualquer EPI, demonstra a culpa, na modalidade de negligência, a qual concorreu para o infortúnio. Patente o ato ilícito, impõe-se a responsabilização civil da ré e o consequente dever de indenizar os danos morais e materiais. Recurso de revista conhecido e parcialmente provido.

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-333-07.2017.5.09.0122, em que são Recorrentes MARIA APARECIDA MACHADO OLIVEIRA E OUTROS e Recorridos INESCAP INDUSTRIA DE ESCAPAMENTOS E PECAS LTDA e SOMPO SEGUROS S.A..

O Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região, por meio do acórdão de fls. 453-460 (numeração de fls. verificada na visualização geral do processo eletrônico – “todos os PDFs” – assim como todas as indicações subsequentes), negou provimento ao recurso dos reclamantes.

Embargos declaratórios dos reclamantes às fls. 467-470, aos quais se negou provimento às fls. 471-477.

Os sucessores do de cujus interpuseram recurso de revista às fls. 484-509, com fulcro no art. 896, alínea c, da CLT. É incontroverso, que o de cujos Antonio Sergio Pires de Oliveira foi contratado, como trabalhador autônomo, pela empresa INESCAP – IND. DE ESCAPAMENTOS E PEÇAS LTDA., para realizar serviços de manutenção de calha e telhado no barracão da empresa. No dia em que prestava os serviços, o Sr. Antonio sofreu uma queda a 10 metros de altura e veio a óbito. No caso em tela é pleiteada indenização por danos morais e materiais em razão de omissão da tomadora de serviços em fornecer os equipamentos de proteção necessários para o trabalho e de não fiscalizar o uso. Aponta violação do art. 7º, XXII e XXVIII da Constituição Federal, arts. 186, 927 e 942 do Código Civil de 2002.

O recurso foi admitido às fls. 550-556.

Contrarrazões foram apresentadas às fls. 560-567.

Os autos não foram enviados ao Ministério Público do Trabalho, por força do artigo 95 do Regimento Interno do Tribunal Superior do Trabalho.

É o relatório.

VOTO

O recurso é tempestivo (fls. 550), subscrito por procurador regularmente constituído nos autos (fl. 14) e é desnecessário o preparo.

Convém destacar que o apelo em exame rege-se pela Lei 13.467/2017, tendo em vista haver sido interposto contra decisão publicada em 16/6/2020 – fl. 478, após iniciada a eficácia da aludida norma, 11/11/2017, que alterou o art. 896-A da CLT, passando a dispor:

“Art.896-A – O Tribunal Superior do Trabalho, no recurso de revista, examinará previamente se a causa oferece transcendência com relação aos reflexos gerais de natureza econômica, política, social ou jurídica.

§ 1º São indicadores de transcendência, entre outros:

I – econômica, o elevado valor da causa;

II – política, o desrespeito da instância recorrida à jurisprudência sumulada do Tribunal Superior do Trabalho ou do Supremo Tribunal Federal;

III – social, a postulação, por reclamante-recorrente, de direito social constitucionalmente assegurado;

IV – jurídica, a existência de questão nova em torno da interpretação da legislação trabalhista.

§ 2º Poderá o relator, monocraticamente, denegar seguimento ao recurso de revista que não demonstrar transcendência, cabendo agravo desta decisão para o colegiado.

§ 3º Em relação ao recurso que o relator considerou não ter transcendência, o recorrente poderá realizar sustentação oral sobre a questão da transcendência, durante cinco minutos em sessão.

§ 4º Mantido o voto do relator quanto à não transcendência do recurso, será lavrado acórdão com fundamentação sucinta, que constituirá decisão irrecorrível no âmbito do tribunal.

§ 5º É irrecorrível a decisão monocrática do relator que, em agravo de instrumento em recurso de revista, considerar ausente a transcendência da matéria.

§ 6º O juízo de admissibilidade do recurso de revista exercido pela Presidência dos Tribunais Regionais do Trabalho limita-se à análise dos pressupostos intrínsecos e extrínsecos do apelo, não abrangendo o critério da transcendência das questões nele veiculadas.”

Insta frisar que o Tribunal Superior do Trabalho editou novo Regimento Interno – RITST, em 20/11/2017, adequando-o às alterações jurídico-processuais dos últimos anos, estabelecendo em relação ao critério da transcendência, além dos parâmetros já fixados em lei, o marco temporal para observância dos comandos inseridos pela Lei 13.467/2017:

“Art. 246. As normas relativas ao exame da transcendência dos recursos de revista, previstas no art. 896-A da CLT, somente incidirão naqueles interpostos contra decisões proferidas pelos Tribunais Regionais do Trabalho publicadas a partir de 11/11/2017, data da vigência da Lei n.º 13.467/2017.”

Evidente, portanto, a subsunção do presente recurso de revista aos termos da referida lei.

ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO EMPREGADOR. TRABALHADOR AUTÔNOMO. INDENIZAÇÃO

Conhecimento

Ficou consignado no acordão regional:

Acidente de trabalho – responsabilidade da ré – indenizações por danos materiais e morais

Colhe-se da decisão primeira:

“a) Acidente trabalho

Afirmam os reclamantes que o Sr. Antonio Sergio Pires de Oliveira foi contratado, como trabalhador autônomo, pela primeira reclamada, para prestar serviços de manutenção de calha e telhado no barracão da empresa. No dia em que prestava os serviços, o Sr. Antonio sofreu uma queda a 10 metros de altura e veio a óbito. Pretendem indenização por danos morais e materiais em razão da omissão da tomadora de serviços em fornecer os equipamentos de proteção necessários à realização do trabalho contratado.

A primeira reclamada, por sua vez, nega a condição de trabalhador autônomo do Sr. Antonio. Alega que contratou os serviços da empresa “Portal Calhas” formada pelo Sr. Antonio e os filhos.

Com efeito, há evidências suficientes de exploração de atividade empresarial pelo de cujus e os filhos. O fato de a “Portal Calhas” não estar formalmente constituída não prejudica essa conclusão.

A reclamada junta à fl. 139 recibo dos serviços prestados, assinado por um dos filhos do Sr. Antonio, Robson, ora reclamante. Apesar de impugná-lo, a parte autora não se insurge contra a assinatura ali aposta, tampouco justifica o fato de constar no documento “Portal Calhas” e dados referentes a ela, como endereço e telefone. Do mesmo modo, não justifica o recibo de fl. 140, também assinado pelo reclamante Robson, e com a mesma aparência do documento de fl. 130. Nota-se que o recibo de fl. 140 foi conferido à empresa diversa, empreiteira de obras, em 14/08/2017, ou seja, dois anos e oito meses depois do falecimento do Sr. Antonio, o que sugere que a atividade empresarial continuou sendo desenvolvida pelos filhos, mesmo com o advento da morte do pai. No depoimento prestado à autoridade policial, o reclamante Robson declara que ele e seu irmão acompanhavam o pai no dia do acidente para a realização dos serviços (fls. 158/159).

Nessas condições, não há como reconhecer a condição de trabalhador autônomo do Sr. Antonio. Por outro lado, ainda que se admitisse essa condição, não haveria como imputar qualquer responsabilidade à reclamada.

Os próprios reclamantes atribuem o acidente ao fato de o Sr. Antonio não utilizar equipamentos de proteção na ocasião. Ao contrário do sustentado, a reclamada não estava obrigada a fornecer os EPIs. O trabalhador autônomo é aquele que conduz e assume os riscos da própria atividade. Cabia, portanto, ao Sr. Antonio arcar com os equipamentos necessários não somente para a execução dos serviços, mas para o desenvolvimento seguro da atividade. Nessas condições, a ré não concorreu para o infortúnio, não tendo como ser responsabilizada.

A propósito:

“ACIDENTE TRABALHADOR AUTÔNOMO. CULPA EXCLUSIVA DA VÍTIMA. AUSÊNCIA DO NEXO DE CAUSALIDADE. EXCLUDENTE DE RESPONSABILIDADE DO TOMADOR DOS SERVIÇOS. INDENIZAÇÕES POR DANOS MORAIS E MATERIAIS INDEVIDAS. Os danos sofridos pelo reclamante tiveram como causa necessária e adequada seu ato imprudente, quando, atuando como trabalhador autônomo, por conta e risco próprios, descumpriu as orientações de segurança que lhe foram passadas, subiu em seu caminhão para executar atividades que não lhe cabia executar, vindo a desequilibrar-se e sofrer queda que lhe causou as lesões noticiadas nos autos. A circunstância de o acidente ter ocorrido nas dependências da ré, diversamente do alegado não conduz à condenação pretendida pois imprescindível a verificação de ato ilícito culposo do agente, a interferir no curso causal que levou à lesão, o que não ocorreu no caso concreto. Na qualidade de autônomo, competia ao reclamante gerir sua própria atividade e, em consequência, suportar os riscos daí advindos, não se extraindo, da conduta da ré, qualquer determinação anormal ou abusiva que pudesse, eventualmente, justificar uma responsabilização de sua parte. Ainda, conforme demonstrado pela prova oral, as rés possuiam procedimento de segurança próprio para o enlonamento do caminhão, todavia, o autor, imprudentemente, negou-se a observá-lo, descumprindo, assim, as orientações de segurança que lhe foram passadas. Comprovada, assim, a culpa exclusiva da vítima, exclui-se o nexo causal e fica obstado qualquer ressarcimento indenizatório. Sentença mantida”.(TRT-PR-01426-2013-026-09-00-7-ACO-22387-2015 – 6A. TURMA Relator: SUELI GIL EL RAFIHI Publicado no DEJT em 14-07-2015)

Rejeito, pois, todos os pedidos em face da primeira reclamada.”.

Os Reclamantes, em recurso, fazem alusão à NR 35 do MTE, afirmando que a Reclamada Inescap não garantiu o trabalho, em altura, com toda a segurança prevista na citada norma regulamentar. Sustentam, ainda, que a parte ré cometeu ato ilícito, na forma do art. 186 do CCB.

Sem razão.

O art. 19 da Lei n.º 8.213/1991 define acidente do trabalho como aquele que ocorre pelo exercício do trabalho a serviço da empresa ou pelo exercício do trabalho dos segurados referidos no inciso VII do artigo 11 desta lei, provocando lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte ou a perda ou redução, permanente ou temporária, da capacidade para o trabalho.

Inconteste a ocorrência do acidente de trabalho, verificando-se que o sr. Antonio, ao prestar serviços de manutenção de calha e telhado no barracão da empresa, sofreu uma queda a 10 metros de altura e veio a óbito.

No caso, não há referência à vinculação de emprego, ficando evidente nos autos que a Recorrida era tomadora dos serviços prestados, tendo o Juízo de origem rechaçado a tese da inicial, que não veio à lume em sede recursal, no sentido de ser trabalhador autônomo o sr. Antonio, cuja empresa dele, em verdade, veio a ser contratada.

No que respeita ao elemento culpa, forçoso concluir que a Recorrida, na condição de tomadora dos serviços, não tinha o dever legal de vigilância e fiscalização próprios de um contrato de emprego, descabendo, portanto, falar-se na incidência da NR 35 do MTE (dirigida a empregadores e empregados), tampouco ingerência sobre as atividades desempenhadas pelo sr. Antonio, no sentido de coagi-lo a adotar as medidas de segurança necessárias à integridade física. Assim, é possível concluir que o infortúnio decorreu de culpa exclusiva da vítima ao não tomar as devidas cautelas diante da atividade que desenvolvia.

Caso semelhante, envolvendo trabalhador autônomo que sofreu acidente de trabalho, foi examinado por este Tribunal, nos autos TRT-PR:00030-2016-663-09-00-0 (RO), 3ª Turma. Rel. Des. Thereza Cristina Gosdal, publ. em 15/7/2016, cujos fundamentos pelo licença para transcrever, a fim de subsidiar a análise do presente caso:

“EMENTA: ACIDENTE DE TRABALHO. TRABALHADOR AUTÔNOMO. RESPONSABILIDADE PELAS MEDIDAS DE SEGURANÇA. O trabalhador autônomo prestador de serviço especializado é o responsável pelos próprios serviços prestados, bem como, em face da ausência de subordinação, pelas observância das questões técnicas inerentes ao ofício e das normas de segurança. Isto porque se a empresa contrata profissional especializado em determinada atividade é, geralmente, em razão da ausência de empregado com as qualificações necessárias para realizá-la e, portanto, para fiscalizar sua realização. Neste contexto, seria necessária uma evidente e flagrante situação de risco criado ou acentuado pela empresa para que se chegue ao entendimento de que esta deveria intervir no serviço do especialista em manutenção de ar condicionado contratado, ou mesmo impedir a realização da atividade. No presente caso, a análise das circunstâncias mostra que a ré não concorreu para o acontecimento do acidente, uma vez que contratou os serviços de trabalhador autônomo especializado, o qual deveria ter a responsabilidade pelo cumprimento das normas de segurança e pelas precauções necessárias à execução de serviço, tendo o acidente ocorrido por sua culpa exclusiva. Recurso do autor a que se nega provimento”.

(…)

MÉRITO

Acidente de trabalho

(…)

Nota-se que se faz necessária a análise das circunstâncias do caso a fim de aferir se houve a responsabilidade da empresa tomadora no acidente do trabalhador autônomo. Evidenciando tal conclusão, com a pertinente ressalva sobre a responsabilidade do próprio prestador, observa Sebastião Geral de Oliveira:

“É certo que cabe indenização por responsabilidade civil decorrente de qualquer ato ilícito do tomador dos serviços que tenha causado danos à vítima, conforme preceitua o Código Civil, independentemente da sua condição de empregado. Nessa situação enquadram-se as hipóteses de acidentes com trabalhadores sem vínculo de emprego, tais como os estagiários, os cooperados, os autônomos, os empreiteiros, os representantes comerciais e os prestadores de serviço em geral. Todavia, convém assinalar que os deveres quanto às normas de segurança, higiene e saúde do simples tomador ou usuário de serviços são diferentes daqueles que são atribuídos ao empregador, em razão do caráter marcadamente tutelar da legislação trabalhista” (Indenizações por acidente do trabalho e doenças ocupacionais. São Paulo: LTr, 2013, p. 44, destaquei).

Neste contexto, seria necessária uma evidente e flagrante situação de risco criado ou acentuado pela empresa, para que se chegue ao entendimento de que esta deveria intervir no serviço do especialista em manutenção de ar condicionado contratado, ou mesmo impedir a realização da atividade, sendo necessária a análise das circunstâncias relacionadas ao acidente infelizmente ocorrido com o trabalhador.

(…)

Da análise das versões trazidas pelas partes nas alegações e nos depoimentos, tem-se como incontroversa a ocorrência de acidente consubstanciado na queda do reclamante de escada, numa altura aproximada de 7 metros, quando realizava manutenção do ar condicionado na empresa ré.

(…)

Por fim, ficou também evidenciado que o autor efetivamente não utilizava nenhum equipamento de segurança no momento do acidente, embora admita que possuía o EPI, dizendo que não era possível instalá-lo na ré. Entretanto, ao que indicam as fotos de fls. 255-256 o local onde se encontravam os aparelhos de ar condicionado era bastante próximo do teto da empresa, aparentemente apenas alguns metros, onde poderia ter fixado o equipamento de segurança, não sendo razoável a alegação de que não haveria como utilizar equipamentos de segurança.

(…)

Diante das circunstâncias do acidente, entendo que se mostra correta a conclusão do juízo de origem.

Com efeito, no presente caso se tratava de atividade especializada, relativa à manutenção de ar condicionado, prestada por profissional autônomo, na qual o conhecimento sobre os EPIs que deveriam ser utilizados, assim como das normas de segurança relacionadas às funções a serem observadas, eram do próprio prestador. Veja-se que a empresa contratava esporadicamente os serviços de manutenção especializada, justamente porque não possuía em seu quadro quem tivesse as qualificações para desempenhar aquela atividade.

(…)

O reclamante, e não a ré, é quem detinha o conhecimento e a capacidade técnica para a realização das atividades a que se propunha, o que inclui também a adoção das medidas de segurança.

Ao se contratar serviços especializados, não se pode exigir que a empresa contratante (ou a pessoa física) detenha conhecimento e acompanhe de forma minuciosa as complexas normas de segurança inerentes ao serviço. Na verdade, a contratação se justifica exatamente pelo fato de que a contratante não detém a capacidade técnica para a realização dos serviços, procurando no mercado quem a tenha. Por esta razão é que se justifica a assunção pelo prestador de serviços (seja pessoa jurídica ou trabalhador autônomo) dos riscos e da responsabilidade pela observância das normas técnicas pertinentes, aí incluído o uso dos EPIs e dos demais equipamentos técnicos necessários.

Neste contexto, entendo que a responsabilização da ré poderia ocorrer em situações nas quais o dano decorresse de atitude sua, não relacionada com as exigências técnicas do serviço, ou que se revele a exposição a risco manifesto perceptível no padrão do homem médio e sem relação necessária com os cuidados específicos da profissão. O que não se verifica.

(…)

Tratando-se o autor de profissional autônomo, cabia a ele avaliar as condições de segurança e os equipamentos necessários à sua realização segura, utilizando algum tipo de sistema de ancoragem, ou mesmo outro equipamento para chegar à altura desejada, como um andaime, embora isso certamente fosse consumir tempo superior à utilização da escada.

(…)

Portanto, tem-se como correta a conclusão do juízo de origem no sentido de que o acidente decorreu de culpa exclusiva da vítima, a qual, na qualidade de trabalhador autônomo especializado (que disponibiliza para o mercado seus serviços) era responsável pela observância das normas de segurança.

(…)

E neste sentido também o seguinte Acórdão, relativo ao processo 02071-2011-091-09-00-0 (RO 3569/2014, publicado em 12/09/2014), de lavra da Exma. Desembargadora Neide Alves dos Santos:

“O MM. Juízo de origem indeferiu o pedido de indenização por danos materiais e morais decorrentes de acidente de trabalho por considerar que o reclamante era trabalhador autônomo, tendo atuado na obra da reclamada nesta qualidade, mediante pagamento de valor global e, por não estar subordinado à reclamada, tinha ampla liberdade de atuação e de execução de seus serviços, tendo montado o andaime que se quebrou e deixado de utilizar os EPI’s disponibilizados, por imprudência, o que configura culpa exclusiva da vítima (fls. 318/319).

(…)

Da prova oral, extrai-se que a reclamada contratou o senhor Luiz para execução de obra certa (instalação de forro), que contou com a ajuda do reclamante e, quando ambos estavam no andaime, o qual foi feito com material comprado pela reclamada, o mesmo quebrou ocasionando a queda tanto do reclamante quanto do Sr. Luiz.

Em interrogatório, o reclamante confessou que o andaime foi montado por ele e pelo Sr. Luiz, o que envolveu, inclusive, a colocação das vigas; não havia fiscalização da obra; havia EPIs, não sabendo especificá-los; o andaime caiu por quebra da viga, a qual era viga de pinheiro “cheia de nó”; não sabia que a viga poderia partir (fl. 198). A reclamada, por sua vez, confessou que comprou o material da obra (fl. 198).

Embora a primeira testemunha ouvida nos autos, a convite do reclamante, tenha afirmado que o reclamante era sócio do Sr. Luiz Cezar Novaski, este, também ouvido na qualidade de testemunha, porém a convite da reclamada, disse que o reclamante era seu ajudante, donde se conclui que o reclamante trabalhou para a reclamada, na qualidade de trabalhador autônomo, em decorrência de subcontratação de obra certa (fl. 199).

De acordo com a testemunha Luiz Cezar Novaski, “a obra possuía EPIs, consistentes em cinto de segurança e capacetes, os quais já estavam na obra; o andaime foi montado pelo depoente e reclamante; a viga do andaime era de pinheiro; o depoente também caiu; colocaram a viga corretamente, mas ela virou e quebrou; não utilizavam cinto quando do acidente; não era possível a utilização do cinto no momento, por se tratar da parte final do teto; caíram de cerca de 3,5m de altura” (fl. 199).

(…)

Diante desse conjunto probatório, conclui-se que na obra havia EPIs, consistentes em cinto de  segurança e capacetes, os quais poderiam ter evitado a queda, porém não foram utilizados pelo reclamante, o que caracteriza culpa exclusiva da vítima pelo trauma gerado na coluna em razão da queda, não sendo o caso de responsabilizar a reclamada por eventuais danos materiais ou morais.

Isso porque o reclamante não trabalhava na qualidade de empregado, mas sim como trabalhador autônomo, não subordinado à reclamada, tendo ampla liberdade de atuação e de execução de seus serviços, como exposto na origem. Também não se constata culpa da reclamada, pois não se extrai que o material comprado para a viga era imprestável.

Tratando-se a reclamada de dona da obra que foi subcontratada, não pode ser responsabilizada pelo infortúnio, pois não contratou nem deu ordens ao reclamante. A esse respeito, a seguinte ementa:

RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA. EMPREITADA. DONA DA OBRA. Extrai-se do acórdão que a siderúrgica Recorrente contratou a primeira Reclamada para realização de obra certa, que consistia na montagem eletromecânica de projetos de estação de tratamento de água (ETA) de máquinas de alto forno- (fl. 586). Está consignado, também, que a execução da obra se daria em prazo certo, de 08/09/1999 a 30/11/1999, e dentro desse lapso temporal o Reclamante sofreu acidente de trabalho. Ressalte-se que o Tribunal Regional não reconheceu a culpa da segunda Reclamada (Arcelormittal Brasil S.A.) pelo acidente de trabalho. Segundo a Orientação Jurisprudencial nº 191 da SBDI-1 desta Corte, não há responsabilidade, quer solidária quer subsidiária, do dono da obra por débitos trabalhistas devidos pelo empreiteiro. Aliás, o simples fato de a obra contratada ser útil ao processo produtivo da Recorrente não descaracteriza a sua condição de dona da obra, pois não é incorporadora ou construtora. Contrariedade à Orientação Jurisprudencial nº 191 da SBDI-1 reconhecida. Recurso de revista a que se dá provimento, para afastar a responsabilidade subsidiária atribuída à segunda Reclamada (Arcelormittal Brasil S.A.).’ (Processo: RR – 44100-24.2009.5.03.0064 Data de Julgamento: 23/11/2011, Relator Ministro: Fernando Eizo Ono, 4ª Turma, Data de Publicação: DEJT 19/12/2011)

No mesmo sentido já decidiu esta e.Turma nos autos 37329-2012-015-09-00-8 (ac. publ. em 1º/04/2014), em que funcionou como relator o Exmo. Desembargador Paulo Ricardo Pozzolo.

Ante o exposto, mantenho o r. julgado.” (destaquei)

Ressalte-se que não se está a afastar completamente a possibilidade de responsabilização da ré, mas sim a concluir que, diante das circunstâncias do caso, verifica-se que o reclamante era trabalhador especializado, decorrendo o acidente de negligência da sua parte, seja pela ausência de avaliação das condições de prestação do serviço, seja pela atitude insegura sem a utilização do EPI adequado, cuja responsabilidade era sua.

Diante do exposto, mantenho o decidido pelo juízo de origem, ficando afastada a responsabilidade da ré pelo acidente e prejudicados os pedidos quanto ao valor da indenização.” (grifos e destaques acrescidos)

A situação dos autos comporta interpretação idêntica ao julgado acima transcrito, à medida em que o falecido, sr. Antonio Sergio Pires de Oliveira, executava atividade especializada com autonomia, na qual o conhecimento sobre os EPIs a serem utilizados – assim como das normas de segurança – eram do próprio executor. Como dono de empresta prestadora de serviços ou profissional autônomo, cabia ao falecido avaliar as condições de segurança e os equipamentos necessários à proteção da sua integridade física. Não houve, no caso, exposição a risco manifesto, perceptível de plano por um homem médio e sem relação com os cuidados específicos da profissão, a se cogitar de culpa da Recorrida.

Pelo exposto, inviável atribuir responsabilidade a terceiros, como as Reclamadas, pelo evento danoso, porque a Ré Inescap, na condição de tomadora de serviços, não detinha o dever geral de cautela que incumbe ao empregador comum, na adoção de medidas eficazes de prevenção à saúde e à segurança dos trabalhadores e de fiscalização da prestação de serviços. Afastada a responsabilidade civil, não há falar no dever de indenizar. Por conseguinte, sequer subsiste razão a tese dos Recorrentes, no sentido de que houve violação ao artigo 186 do Código Civil.

Nada a prover-se.” (fls. 454-459 – grifos nossos).

Os sucessores do de cujus interpuseram recurso de revista às fls. 484-509, com fulcro no art. 896, alínea c, da CLT. Alegam ser incontroverso, que o de cujus Antonio Sergio Pires de Oliveira foi contratado, como trabalhador autônomo, pela ré, INESCAP – IND. DE ESCAPAMENTOS E PEÇAS LTDA., para realizar serviços de manutenção de calha e telhado no barracão da empresa. No dia em que prestava os serviços, o Sr. Antonio sofreu uma queda a 10 metros de altura e veio a óbito. Insistem no direito À indenização por danos morais e materiais em razão de omissão da tomadora de serviços em fornecer os equipamentos de proteção necessários para o trabalho e de não fiscalizar o uso respectivo. Apontam violação do art. 7º, XXII e XXVIII da Constituição Federal, arts. 186, 927 e 942 do Código Civil de 2002. Transcrevem arestos para o cotejo (fls. 503-505).

Inicialmente, por se tratar de recurso submetido às diretrizes da Lei 13.015/2014, necessário analisar o cumprimento dos requisitos do §1º-A do art. 896 da CLT.

No caso em tela, os recorrentes indicaram o trecho do acórdão regional que consubstancia o prequestionamento da controvérsia (fls. 496-500), com destaques de teses em negrito às fls. 497-498). Apresentaram impugnação fundamentada mediante cotejo analítico entre a decisão recorrida e o teor dos dispositivos constitucionais e legais que entende violados, bem como quanto aos arestos transcritos para comprovar divergência jurisprudencial (fls. 503-505). Satisfeitos, portanto, os requisitos do art. 896, § 1º-A, da CLT, com a redação dada pela Lei 13.015/2014.

Como se constata, o Regional manteve a sentença, na qual jugados improcedentes os pedidos de indenização por danos moral e material decorrentes de acidente de trabalho fatal. Julgou sob o fundamento de que teria ocorrido culpa exclusiva da vítima por se tratar de contratação de serviços de empresa especializada, não tendo a empresa contratante obrigação de fornecer e fiscalizar EPI’s, nem de fiscalizar o uso. Acrescentou que mesmo em se tratando de contratação do trabalhador falecido como autônomo, não remanesce o dever de fornecer e fiscalizar EPI’s.

Todavia, a jurisprudência majoritária desta Corte firmou-se no sentido de a ausência de contrato e emprego, como nos casos de trabalho autônomo ou contratação de empresa especializada, não afasta o dever de indenizar decorrente de ato ilícito em acidentes de trabalho. Desse modo, reconheço a transcendência política do debate trazido no recurso de revista.

Passo ao exame da questão de fundo.

RESPONSABILIDADE CIVIL. DANO MORAL E MATERIAL. ACIDENTE DE TRABALHO. FALECIMENTO DO TRABALHADOR AUTÔNOMO.

Trata-se de debate sobre a responsabilização civil da reclamada, formulada pela esposa e pelos três filhos, na qualidade de sucessores do trabalhador que sofreu acidente de trabalho fatal, ao cair de uma altura de 10 metros, do telhado do barracão da empresa, quando executava serviços de manutenção de calhas.

Os recorrentes alegam que o de cujus foi contratado pela ré como autônomo para os serviços de manutenção de calhas e que não foram observadas as regras de segurança para labor em altura. Entendem, desse modo, que há violação dos artigos 7º, XXII e XXVIII, da Constituição Federal, 186, 927 e 942 do Código Civil de 2002 e que há divergência jurisprudencial apta a autorizar o conhecimento e provimento do recurso (arestos transcritos às fls. 503-505).

A ré defende que não há violação e divergência jurisprudência a autorizar o êxito do recurso. Alega que contratou a empresa do de cujus, não tendo havido contratação do trabalhador como pessoa física e que, por isso motivo, não teria responsabilidade quanto ao fornecimento de EPI’s, pois contratou uma empresa especializada “Portal Calhas” para os serviços. Acrescentou que na empresa o de cujus executava o trabalho com dois filhos, como prestadores de serviços especializados e que não possuía qualquer ingerência ou possibilidade de exercer subordinação sobre os integrantes dessa empresa. Aduziu, também, que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima.

O Regional acolheu a tese de defesa da ré. Reconheceu não se tratar de relação de emprego, tampouco de contratação do de cujus como pessoa física autônoma, tratando-se de contratação da empresa, “ficando evidente nos autos que a Recorrida era tomadora dos serviços prestados”. Fundamentou quanto ao “elemento culpa, forçoso concluir que a Recorrida, na condição de tomadora dos serviços, não tinha o dever legal de vigilância e fiscalização próprios de um contrato de emprego, descabendo, portanto, falar-se na incidência da NR 35 do MTE (dirigida a empregadores e empregados), tampouco ingerência sobre as atividades desempenhadas pelo sr. Antonio, no sentido de coagi-lo a adotar as medidas de segurança necessárias à integridade física. Assim, é possível concluir que o infortúnio decorreu de culpa exclusiva da vítima ao não tomar as devidas cautelas diante da atividade que desenvolvia”.

Pois bem.

O texto constitucional (art. 7º, caput e XXVIII) consagra a responsabilidade subjetiva, obrigação de indenizar o dano que causar, mediante comprovação de culpa ou dolo. O Código Civil (art. 927) consagra a responsabilidade objetiva, na qual não se faz necessária tal comprovação, pois fundada na teoria do risco da atividade econômica.

A primeira norma, constitucional, trata de garantia mínima do trabalhador e não exclui a segunda, que, por sua vez, atribui maior responsabilidade civil ao empregador, aplicável de forma supletiva no Direito do Trabalho, haja vista o princípio da norma mais favorável, mais o fato de o Direito Laboral primar pela proteção do trabalhador e pela segurança e medicina do trabalho, institutos destinados a assegurar a dignidade e a integridade física e psíquica do trabalhador no seu ambiente de labor.

Admite-se a responsabilidade objetiva, entretanto, quando o trabalho executado gere risco acentuado, sendo responsável o empregador ou do contratante, independente da comprovação do dolo ou culpa do agente causador do dano.

Ademais, nos termos da jurisprudência reiterada desta Corte a responsabilidade decorrente de acidente do trabalho apresenta natureza jurídica civil, em razão de culpa aquiliana por ato ilícito, consoante previsão dos arts. 186 e 927, caput, do Código Civil, ou mesmo do § 6º do art. 37 da Constituição Federal. Desse modo, o fato de o acidente ocorrer seja em relação de trabalho autônomo, contrato de empreitada (OJ 191 da SBDI-1 do TST) ou mesmo de terceirização de serviços (Súmula 331 do TST) não afasta a responsabilização do contratante e o respectivo dever de indenizar.

Nesse sentido, os seguintes precedentes desta Corte:

“I – AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. TRABALHADOR AUTÔNOMO. MESTRE DE OBRAS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAL E MATERIAL DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TOMADOR. Ante a possível violação do artigo 927, § único, do CC, impõe-se a reforma do r. despacho agravado, para melhor análise do recurso denegado. Agravo de instrumento conhecido e provido. II – RECURSO DE REVISTA. INTERPOSIÇÃO SOB A ÉGIDE DAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. TRABALHADOR AUTÔNOMO. MESTRE DE OBRAS. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAL E MATERIAL DECORRENTE DE ACIDENTE DE TRABALHO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TOMADOR. 1 – Esclareça-se que o fato de ser o de cujus profissional autônomo, por si só, não afasta a responsabilidade da empresa tomadora do serviço, devendo ser analisada a existência do nexo de causalidade entre o acidente sofrido e a culpa da tomadora de serviço para que se configure a existência do dano moral, bem como, por consequência, o dever de indenizar. 2 – No caso dos autos, o TRT consignou que “o só fato de não se estar diante de típica relação de emprego não afasta o dever do tomador dos serviços de indenizar, caso o conjunto fático-probatório indique presentes os requisitos caracterizadores da responsabilidade civil.” (fl.474). 3 – Nesse sentido, ficou destacado que o trabalhador sofreu acidente de trabalho no exercício das atividades de pedreiro para o Sindicato dos Empregados no Comércio de Viamão, em razão de queda de uma escada, enquanto descia do telhado, o que levou à sua morte. Veja-se que a Corte Regional, embora tenha optado pela teoria da responsabilização subjetiva, entendeu que não restou provada a culpa da parte ré, embora inexistindo dúvida quanto à evidência do dano – a morte do trabalhador (João Celso da Silva Paiva) e o nexo causal entre o acidente e as atividades realizadas no exercício profissional ao contratante, uma vez que “O perito médico nomeado para elaborar laudo concluiu que: “o óbito do de cujus ocorreu por acidente de trabalho típico, com fratura de crânio por hematoma subdural extenso”. (fl. 475) No entanto, a Corte Regional reformou a sentença, que julgou procedente a ação, por entender que não foi comprovada a culpa da parte reclamada, na medida em que “restou evidente a experiência do de cujus no ramo em que atuava, do que emerge a convicção de que ele era quem possuía condições técnicas de avaliar as circunstâncias do trabalho realizado – inclusive dependendo da altura se deveria subir com uma escada ou montar um andaime, bem como era dele a responsabilidade pela execução dos serviços da forma mais adequada e segura.” Consignou, ainda, que “como empreiteiro autônomo, era do de cujus a obrigação de observar as regras de segurança e os EPIs utilizados, ou a sua conveniência. Noto que a testemunha dos autores declarou que qualquer reclamação sobre falta de materiais e equipamentos era direcionada ao falecido, a ressaltar que era ele o responsável por isso. Em decorrência, inexistia a obrigação legal de o reclamado fornecer tais equipamentos de proteção, tampouco há prova de que tenha fornecido a escada de onde ele caiu, de modo que nem mesmo concorrente pode lhe ser atribuída culpa pelo infortúnio que acarretou a morte do trabalhador.” (fl.479) 4- No presente caso, está configurado o nexo de causalidade, uma vez que o trabalhador autônomo sofreu o acidente no momento em que prestava serviço nas dependências do recorrido. Já no tocante à culpa da ré, esta também está configurada, tendo em vista a situação em que o autor se encontrava, no alto de uma escada, enquanto descia do telhado, sem qualquer equipamento de proteção, demonstrando de forma clara a existência da culpa do réu. De qualquer sorte, a jurisprudência desta Corte tem considerado que a atividade de construção civil enseja ônus para os trabalhadores maior do que aqueles a que geralmente estão submetidos os trabalhadores das atividades em geral, o que permite a aplicação da responsabilidade objetiva prevista no art. 927, parágrafo único, do Código Civil. Precedentes. 5 – Ressalte-se ainda, que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Tema 932, do RE 828.040, fixou tese no sentido da possibilidade da aplicação da responsabilidade objetiva do empregador em caso de danos decorrentes de acidente de trabalho. Confira-se: ” O artigo 927, parágrafo único, do Código Civil é compatível com artigo 7º, inciso 28 da Constituição Federal, sendo constitucional a responsabilização objetiva do empregador por danos decorrentes de acidentes de trabalho nos casos especificados em lei ou quando a atividade normalmente desenvolvida por sua natureza apresentar exposição habitual a risco especial, com potencialidade lesiva e implicar ao trabalhador ônus maior do que aos demais membros da coletividade”. 6 – Dessa forma, o eg. Tribunal Regional ao afastar a responsabilidade do sindicato tomador, não levou em consideração tais circunstâncias nem os elementos probatórios constantes do próprio acórdão que demostram, além de risco da atividade, o dano (óbito), o nexo de causalidade e a ocorrência de culpa do recorrido. Assim, percebe-se que o eg. Regional não deu o melhor enquadramento aos fatos constantes dos autos, uma vez que presentes os elementos ensejadores da responsabilidade civil, decorrente do acidente que culminou na morte do trabalhador – Sr. João Celso. 7 – Conhecido o apelo por violação do artigo 927, parágrafo único, do CCB, o provimento se impõe para restabelecer a r. sentença de origem, no aspecto, que condenara o recorrido ao pagamento de indenização por danos morais e materiais. Recurso de revista conhecido por violação do artigo 927, parágrafo único, do CCB e provido” (RR-20078-80.2018.5.04.0411, 3ª Turma, Relator Ministro Alexandre de Souza Agra Belmonte, DEJT 17/12/2021).

“A) AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017. ACIDENTE NO TRABALHO. ÓBITO DO TRABALHADOR AUTÔNOMO. TOMADOR DE SERVIÇOS PESSOA FÍSICA. TRABALHO EM ALTURA. MANUTENÇÃO DE ELEVADOR DE GRÃOS EM SILO. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. Demonstrado no agravo de instrumento que o recurso de revista preenchia os requisitos do art. 896 da CLT, dá-se provimento ao agravo de instrumento, para melhor análise da arguição de violação do art. 927, parágrafo único, do CCB. Agravo de instrumento provido. B) RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/2017. ACIDENTE NO TRABALHO. ÓBITO DO TRABALHADOR AUTÔNOMO. TOMADOR DE SERVIÇOS PESSOA FÍSICA. TRABALHO EM ALTURA. MANUTENÇÃO DE ELEVADOR DE GRÃOS EM SILO. ATIVIDADE DE RISCO. RESPONSABILIDADE CIVIL OBJETIVA. Registre-se, inicialmente, que o TRT concluiu que restou comprovado nos autos que a relação existente entre o ” de cujus ” e o Reclamado (pessoa física) decorreu de contrato de prestação de serviços, sendo o Obreiro, trabalhador autônomo. Com efeito, a condição de trabalhador autônomo não afasta, por si só, a responsabilização do tomador de serviços, pois a indenização por danos morais e materiais resultantes de acidente do trabalho tem natureza jurídica civil , conforme previsto nos artigos 186 e 927, caput , parágrafo único, do Código Civil. Assim, para que se possa imputar responsabilização ao Reclamado pelo alegado acidente, mister se faz a conjugação dos seguintes requisitos: o dano; o nexo causal (que traduz a causalidade entre a conduta antijurídica e o dano sofrido); e, regra geral, a culpa. Não é o caso, contudo, de culpa presumida, que só pode ser reconhecida nas relações de emprego, em virtude de o empregador ter o controle e a direção sobre a estrutura, a dinâmica, a gestão e a operação do estabelecimento em que ocorrer o evento danoso. Nesse sentido, conforme leciona o professor Sebastião Geraldo de Oliveira: ” Se ocorrer acidente de qualquer natureza , tanto com o empregado doméstico quanto com o simples prestador de serviços sem vínculo de emprego, a vítima pode ter direito à indenização por responsabilidade civil, se estiverem presentes os pressupostos do dano, nexo causal e culpa do empregador ou tomador de serviços. O direito de qualquer lesado à reparação dos danos está consagrado de modo amplo no ordenamento jurídico nacional, em especial no código civil. Assim, não há fundamento legal ou lógico para afastá-lo nos danos oriundos dos acidentes ocorridos com os trabalhadores domésticos ou sem vínculo de emprego , a não ser que haja alguma das excludentes da responsabilidade, tais como a culpa exclusiva da vítima (ou fato da vítima), o caso fortuito ou força maior e o fato de terceiro. (…) .” (OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Indenizações por acidente do trabalho ou doença ocupacional. 12 ed. Salvador: Editora Juspodivm, 2021, pg. 607). No caso dos autos, segundo os dados que se extrai do acórdão, conclui-se como aplicável a responsabilidade objetiva, uma vez que a atividade desempenhada pelo Autor efetivamente representa um risco maior do que o vivenciado pelo indivíduo médio. O Tribunal Regional registrou ser: ” Incontroverso nos autos que Zelázio Jeremias sofreu acidente do trabalho fatal em 09/07/2017, enquanto realizava serviços de serralheria de manutenção de um elevador de grãos em silo de armazenagem de cereais na propriedade rural do reclamado , Antônio Taurino Patrício (fotos às fls. 34-36). Segundo consta do boletim de ocorrência anexado aos autos, ” a vítima realiza manutenção na estrutura de ferro quando ao pisar na escora de madeira a mesma quebrou ocasionando a queda ” . Enfatize-se, ademais, que a Corte Regional anotou que a ” análise do acidente de trabalho realizada pelo auditor fiscal do trabalho (fl. 281), que imputou ao demandado o dever de aplicação das normas de segurança do trabalho ” – dever esse, todavia, que não foi respeitado pelo tomador de serviços demandado, no caso dos autos. Anota-se que a controvérsia deve ser examinada sob o enfoque da responsabilidade objetiva da tomadora ante o risco acentuado a que estava exposto o de cujus (art. 927, parágrafo único, do CC c/c art. 7º, caput , da CF). Não há dúvida de que a atividade em altura, no exercício de manutenção de elevador, expõe o trabalhador a riscos mais acentuados do que aquele a que se submete a coletividade . No exercício de tais atividades, o trabalhador fica sujeito à possibilidade de quedas, muitas vezes fatais, o que potencializa o risco de acidentes. No acórdão recorrido, constata-se, ainda, o posicionamento firmado pelo Delegado de Polícia no relatório de investigação do acidente de trabalho, que vitimou o “de cujus”, no sentido de que ” os indicativos apontaram-no como sendo um dos responsáveis pela própria empreitada. Não bastasse esse mar de dúvidas aqui relatadas, ainda resta claro e previsível que qualquer um que ande por cima de tábuas, as quais se encontram posicionadas em cima de um poço, se autocoloca em uma situação de risco de, não sendo a mera entrega de equipamento individual suficiente a impedir a causa da morte “. Com efeito, resulta patente tratar-se de atividade de risco a ensejar a responsabilidade objetiva. Pode-se entender que, inclusive nas relações de trabalho autônomo , há a possibilidade de aplicação da teoria da responsabilidade civil objetiva, haja vista que a incidência da diretriz constante no art. 927, parágrafo único, do Código Civil, não se limita às relações jurídicas envolvendo os contratos de emprego. Por outro lado, esclareça-se, quanto à suposta culpa exclusiva da vítima , que o fato da vítima (denominado como culpa da vítima no CCB/2002 – art. 936) é fator excludente da reparação civil, por inexistência de nexo de causalidade do evento danoso com o exercício da atividade laboral. Nesse norte, a caracterização da culpa exclusiva da vítima é fator de exclusão do elemento “nexo causal” para efeito de inexistência de reparação civil no âmbito laboral quando o infortúnio ocorre por causa única decorrente da conduta do trabalhador , sem qualquer ligação com o descumprimento das normas legais, contratuais, convencionais, regulamentares, técnicas ou do dever geral de cautela por parte de quem o contratou , ou também sem qualquer ligação com os fatores objetivos do risco da atividade – o que não é o caso dos autos, haja vista que o acidente não ocorreu tendo como causa única conduta do trabalhador, estando diretamente atrelada aos fatores objetivos do risco da atividade, além do descumprimento do dever geral de cautela por parte do tomador de serviços. Logo, não há falar em culpa exclusiva da vítima. Ademais, a presença de culpa concorrente não é fator de exclusão da responsabilidade civil da tomadora, devendo ser considerada, no entanto, no momento do arbitramento dos valores das indenizações. Recurso de revista conhecido e provido no aspecto” (RR-736-95.2017.5.12.0023, 3ª Turma, Relator Ministro Mauricio Godinho Delgado, DEJT 17/12/2021).

“RECURSO DE REVISTA. ACIDENTE DE TRABALHO. TRABALHADOR AUTÔNOMO. RESPONSABILIDADE CIVIL DO TOMADOR DE SERVIÇOS. Conforme a jurisprudência majoritária desta Corte, o tomador de serviços deve ser responsabilizado em caso de acidente de trabalho, na hipótese de negligência em adotar medidas de segurança mínimas capazes de assegurar a integridade física dos trabalhadores que se encontrem em suas instalações, sejam eles empregados, terceirizados ou autônomos. Constata-se a negligencia da reclamada na fiscalização da segurança do trabalhador, sobretudo porque, havendo fonte de energia segura na obra, omitiu-se a empresa quanto à utilização de meio clandestino, por parte do prestador, externamente ao canteiro. Não se trata, no caso, de prestação de serviços perante pessoa física ou jurídica ignorante quanto aos aspectos técnicos dos serviços tomados, mas de empresa do ramo da construção civil, cujo know-how se presume. Por conseguinte, conclui-se que a tomadora não foi diligente em seu dever de cautela, devendo responder pela negligência que contribuiu com o acidente que vitimou o obreiro. Precedentes. Recurso de revista conhecido e não provido ” (RR-126100-20.2011.5.13.0004, 2ª Turma, Relatora Ministra Delaide Miranda Arantes, DEJT 03/05/2019).

“RECURSOS DE REVISTA DO RECLAMANTE E DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO INTERPOSTOS ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 13 . 015/2014. ANÁLISE CONJUNTA. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E MATERIAIS. ACIDENTE DE TRABALHO. ÓBITO. QUEDA DE TRABALHADOR AUTÔNOMO CONTRATADO PARA FAZER REPAROS NO TELHADO. RESPONSABILIDADE CIVIL DA EMPRESA TOMADORA DE SERVIÇOS CONFIGURADA. 1. Cinge-se a controvérsia em se definir se a empresa deve ser responsabilizada pelo acidente de trabalho que levou um trabalhador autônomo a óbito. Segundo descrição fática do TRT , ” o pai do reclamante, trabalhador autônomo do ramo da construção civil, foi contratado para efetuar um reparo no telhado do barracão da empresa reclamada, quando uma telha cedeu, ocasionando a queda que resultou na sua morte “. Para prover o recurso da empresa, o TRT fundamentou que ” não se vislumbra culpa da recorrente naquele evento”. 2. Ao contrário do que é asseverado pela Corte Regional, esta Corte Superior vem entendendo que nos contratos de prestação de serviços autônomos, assim como nos contratos de empreitada, cabe à empresa tomadora de serviços manter o meio ambiente de trabalho de modo a reduzir os riscos de acidente de trabalho (artigo 7º, XXII, da Constituição Federal). Ou seja, o fato de contratar um trabalhador autônomo não exime o tomador de serviços da obrigação de zelar pelo meio ambiente em que o trabalho é executado. 3. Na hipótese em exame , verifica-se que a conclusão do TRT no sentido de inexistência de culpa decorreu da premissa de que o tomador de serviços não deve ser responsabilizado civilmente, tampouco está obrigado a adotar medidas de segurança necessárias à integridade física do prestador de serviços autônomos. Considerando que o TRT adotou premissas contrárias ao entendimento desta Corte Superior, necessário se faz o conhecimento e provimento do recurso de revista para reconhecer a responsabilidade civil da empresa reclamada. 4. Considerando que ao prover o recurso ordinário da empresa, o TRT reputou prejudicados todos os demais temas que tratavam do valor das indenizações (em ambos os recursos ordinários), e levando-se em conta que a presente decisão reforma o acórdão regional para restabelecer a sentença que reconheceu a responsabilidade civil da empresa, necessário se faz o retorno dos autos ao Tribunal Regional para que sejam examinados os temas remanescentes dos recursos ordinários interpostos por ambas as partes, cujo exame restou prejudicado. Recursos de revista conhecidos e providos” (RR-2164400-75.2009.5.09.0011, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 08/06/2018).

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N.º 13.015/2014. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. DONO DA OBRA. ACIDENTE DO TRABALHO. PRETENSÃO DE NATUREZA CIVIL. INAPLICABILIDADE DA OJ N.º 191 DA SBDI-1 DO TST. Hipótese em que o Tribunal Regional manteve a decisão que afastou a incidência da OJ 191 da SDI-1 sob o fundamento de que houve o reconhecimento da responsabilidade civil das reclamadas. A jurisprudência desta Corte Superior consolidou o entendimento de que o contrato de empreitada de construção civil entre o dono da obra e o empreiteiro não enseja responsabilidade solidária ou subsidiária nas obrigações trabalhistas em sentido estrito. Tratando-se de casos envolvendo responsabilidade civil decorrente de acidente de trabalho, o dono da obra é responsável solidário pelo pagamento de compensação por danos morais e materiais em face da aplicação do artigo 942 do Código Civil, sendo inaplicável o entendimento da OJ 191 da SBDI-1 do TST. Precedentes . Óbice da Súmula 333/TST. Agravo de instrumento a que se nega provimento. (…)” (AIRR-10437-79.2015.5.15.0019, 2ª Turma, Relatora Ministra Maria Helena Mallmann, DEJT 07/08/2020).

“RECURSO DE REVISTA DA PRIMEIRA RECLAMADA. IRMÃOS MUFFATO & CIA. LTDA. 1. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. DONO DA OBRA. DANO MORAL E MATERIAL. ACIDENTE DE TRABALHO. MORTE DO EMPREGADO. NÃO CONHECIMENTO. A diretriz da Orientação Jurisprudencial nº 191 da SBDI-1 é no sentido de afastar a responsabilidade do dono da obra pelas obrigações contraídas pelo empreiteiro. A jurisprudência desta Corte Superior, todavia, é firme no sentido de que referido precedente é inaplicável quando se trata de responsabilidade civil, decorrente de acidente de trabalho sofrido por trabalhador contratado por interposta pessoa, caso em que o dono da obra permanece responsável pelo pagamento de compensação por danos morais e materiais. Precedentes da SBDI-1 e de Turmas. A responsabilidade do dono da obra, tomador de serviços, por ato ilícito (acidente de trabalho) é solidária, mesmo no caso de contratação lícita, em face da aplicação do artigo 942 do Código Civil. Recurso de revista de que não se conhece. 2. (…)” (RR-9951800-91.2005.5.09.0015, 4ª Turma, Relator Ministro Guilherme Augusto Caputo Bastos, DEJT 08/05/2020).

Ou seja, o contratante pode ser responsabilizado por acidente de trabalho, caso presentes os requisitos do ato ilícito e do dever de indenizar – dano, nexo de causalidade e culpa nos casos de responsabilidade subjetiva -, seja ele empregador, tomador de serviços ou o dono da obra.

No caso dos autos, a controvérsia envolve acidente em trabalho executado nas alturas (10 metros), relativo à construção civil (instalação, consertos ou manutenção de calhas de telhado). Para esta atividade, a jurisprudência do TST tem atribuído risco acentuado, de grau 3, segundo o CNAE 2.3 (F.43 – 4330-4/01), atraindo a incidência da responsabilidade objetiva prevista no art. 927 do Código Civil. Desse modo, presentes o dano (morte do trabalhador) e o nexo causal (acidente ocorrido por queda do telhado da ré após contrato para a manutenção de calhas), impõe-se o dever de indenizar, ainda que não comprovada a culpa efetiva.

De outra parte, mesmo se analisados os fatos sob a ótica da responsabilidade subjetiva, faz-se presente a culpa da ré. Com efeito, o objeto do contrato formulado entre a ré e o autor (seja com a pessoa física do de cujus, seja com a pessoa jurídica “Portal Calhas”, em que o de cujus laborava com seus filhos) tinha como fato intrínseco à atividade a permanência no telhado (altura) para a manutenção das calhas. O contrato civil entabulado pela ré pressupõe a observância da legislação sobre a sua execução. Ou seja, a ré jamais poderia permitir a ocorrência de um trabalho em altura, na sua sede, sem o uso de qualquer EPI. Se assim permitiu, agiu com culpa na modalidade de negligência, tendo concorrido para o infortúnio. Note-se ter a ré afirmado, nas contrarrazões, o fornecimento da escada ao trabalhador, sendo certa a sua ciência das condições de desenvolvimento das atividades.

Vê-se, portanto, que por qualquer ângulo que se analise a controvérsia – responsabilidade objetiva ou subjetiva, bem como contrato direto do trabalhador como autônomo ou contrato da empresa do autor “Portal Calhas” – a reclamada deve ser responsabilizada civilmente pelo acidente.

Houve ato ilícito da ré, tratando-se de culpa concorrente, o que justifica o pleito quanto aos deveres de indenizar por danos morais e materiais.

Conheço do recurso de revista, por violação do art. 927 do Código Civil.

Mérito

Conhecido o recurso de revista por violação do art. 927 do Código Civil, seu provimento é consectário lógico.

Todavia, tratando-se do primeiro julgamento em que se reconheceu a responsabilização civil da ré, não houve exame das condições fático-probatórios para se definir o direito e o valor das indenizações pleiteadas. No caso, é fato que o dano moral verificado com a perda do esposo e do pai dos autores é in re ipsa, mas não há dados sobre a capacidade econômica da empresa e demais condições para se estabelecer o valor da indenização. E, quanto aos danos materiais, inconteste o direito da esposa ou companheira, mas não houve análise do efetivo direito dos filhos – se são maiores de idade, se há algum fator específico de dependência do de cujus, por exemplo -, tampouco há dados para se estabelecer a indenização com base na remuneração efetiva do de cujus ou no salário mínimo ou para o exame do pedido de constituição de capital.

Ou seja, o feito não está maduro para julgamento nesta assentada.

Em vista do exposto, dou provimento parcial ao recurso de revista para, reformando o acórdão recorrido, reconhecer a responsabilidade civil da ré, por culpa concorrente, no acidente que vitimou o de cujus e determinar o retorno dos autos ao Tribunal Regional para que prossiga no exame dos pedidos relativos aos danos morais, materiais e demais pedidos devolvidos no recurso ordinário, como entender de direito.

ISTO POSTO

ACORDAM os Ministros da Sexta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade: 1) reconhecer a transcendência política; 2) conhecer do recurso de revista por violação do art. 927 do Código Civil; 3) dar provimento parcial ao recurso de revista para, reformando o acórdão recorrido, reconhecer a responsabilidade civil da ré, por culpa concorrente, no acidente que vitimou o de cujus e determinar o retorno dos autos ao Tribunal Regional para que prossiga no exame dos pedidos relativos aos danos morais, danos materiais e demais pedidos devolvidos no recurso ordinário, como entender de direito. Invertido o ônus da sucumbência, mantido o valor arbitrado à condenação.

Brasília, 9 de março de 2022.

Firmado por assinatura digital (MP 2.200-2/2001)

AUGUSTO CÉSAR LEITE DE CARVALHO

Ministro Relator – – /

Dados do processo:

TST – Recurso de Revista nº 333-07.2017.5.09.0122 – Curitiba – 6ª Turma – Rel. Min. Augusto César Leite De Carvalho – DJ 11.03.2022

Fonte: INR- Publicações

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias.

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