TJ/SP. Mandado de segurança – ISS – Município de São Paulo – Instrução Normativa SF/SUREM nº 19/2011 – Suspensão da autorização para emissão de notas fiscais de serviços eletrônicas – Contribuinte inadimplente, pela falta de recolhimento daquele imposto – Ato administrativo contrário ao princípio da legalidade e ao artigo 170, parágrafo único, da Constituição Federal – Afronta as Súmulas nºs 70, 323 e 547, todas do Egrégio Supremo Tribunal Federal – Sentença reformada – Sucumbência invertida – Recurso provido.

EMENTA

Mandado de segurança – ISS – Município de São Paulo – Instrução Normativa SF/SUREM nº 19/2011 – Suspensão da autorização para emissão de notas fiscais de serviços eletrônicas – Contribuinte inadimplente, pela falta de recolhimento daquele imposto – Ato administrativo contrário ao princípio da legalidade e ao artigo 170, parágrafo único, da Constituição Federal – Afronta as Súmulas nºs 70, 323 e 547, todas do Egrégio Supremo Tribunal Federal – Sentença reformada – Sucumbência invertida – Recurso provido. (TJSP – Apelação Cível nº 0005435-73.2012.8.26.0053 – São Paulo – 15ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. Silva Russo – DJ 29.07.2014)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0005435–73.2012.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é apelante OFICIAL DO REGISTRO CIVIL E TABELIÃO DE NOTAS DO DISTRITO DE PERUS, é apelado SECRETÁRIO DAS FINANÇAS DO MUNICÍPIO DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em 15ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Deram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores SILVA RUSSO (Presidente), RODRIGUES DE AGUIAR E EUTÁLIO PORTO.

São Paulo, 3 de julho de 2014.

SILVA RUSSO – Relator.

RELATÓRIO

Cuida–se de apelação tirada contra a r. sentença de fls. 154/159, a qual denegou a segurança postulada na presente ação mandamental, buscando o impetrante, nesta sede, a reforma do julgado, em suma, batendo–se na ilegalidade da Instrução Normativa SF/SUREM nº 19/2011, que impõe aos contribuintes inadimplentes, pela falta de recolhimento do ISS, a suspensão da autorização para emissão de notas fiscais de serviços eletrônicas (fls. 164/176).

Recurso tempestivo, preparado (fls. 186), respondido (fls. 190/197) e remetido a este E. Tribunal, onde a d. Procuradoria Geral de Justiça apresentou sua manifestação às fls. 215/217, opinando pelo improvimento do apelo.

É o relatório, adotado, no mais, o da respeitável sentença.

VOTO

O recurso comporta guarida.

Isto porque as Súmulas nºs 70, 323 e 547, todas do Egrégio Supremo Tribunal Federal, são claras quanto a proibir–se a interdição de estabelecimentos comerciais com vistas a coagi–los ao pagamento de tributos.

Nesse sentido:

“SANÇÕES POLÍTICAS NO DIREITO TRIBUTÁRIO. INADMISSIBILIDADE DA UTILIZAÇÃO, PELO PODER PÚBLICO, DE MEIOS GRAVOSOS E INDIRETOS DE COERÇÃO ESTATAL DESTINADOS A COMPELIR O CONTRIBUINTE INADIMPLENTE A PAGAR O TRIBUTO (SÚMULAS 70, 323 E 547 DO STF). RESTRIÇÕES ESTATAIS, QUE, FUNDADAS EM EXIGÊNCIAS QUE TRANSGRIDEM OS POSTULADOS DA RAZOABILIDADE E DA PROPORCIONALIDADE EM SENTIDO ESTRITO, CULMINAM POR INVIABILIZAR, SEM JUSTO FUNDAMENTO, O EXERCÍCIO, PELO SUJEITO PASSIVO DA OBRIGAÇÃO TRIBUTÁRIA, DE ATIVIDADE ECONÔMICA OU PROFISSIONAL LÍCITA. LIMITAÇÕES ARBITRÁRIAS QUE NÃO PODEM SER IMPOSTAS PELO ESTADO AO CONTRIBUINTE EM DÉBITO, SOB PENA DE OFENSA AO "SUBSTANTIVE DUE PROCESS OF LAW". IMPOSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL DE O ESTADO LEGISLAR DE MODO ABUSIVO OU IMODERADO (RTJ 160/140–141 – RTJ 173/807–808 – RTJ 178/22–24). O PODER DE TRIBUTAR – QUE ENCONTRA LIMITAÇÕES ESSENCIAIS NO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL, INSTITUÍDAS EM FAVOR DO CONTRIBUINTE – "NÃO PODE CHEGAR À DESMEDIDA DO PODER DE DESTRUIR" (MIN. OROSIMBO NONATO, RDA 34/132). A PRERROGATIVA ESTATAL DE TRIBUTAR TRADUZ PODER CUJO EXERCÍCIO NÃO PODE COMPROMETER A LIBERDADE DE TRABALHO, DE COMÉRCIO E DE INDÚSTRIA DO CONTRIBUINTE. A SIGNIFICAÇÃO TUTELAR, EM NOSSO SISTEMA JURÍDICO, DO "ESTATUTO CONSTITUCIONAL DO CONTRIBUINTE". DOUTRINA. PRECEDENTES. AGRAVO IMPROVIDO. (AI nº 683000, Relator: Min. CELSO DE MELLO, j. 31/10/2007)

A Instrução Normativa SF/SUREM nº 19/2011, que permite o bloqueio eletrônico de emissão de notas fiscais quando tratar–se de contribuinte inadimplente mostra–se claramente como ato administrativo contrário ao princípio da legalidade e ao artigo 170, parágrafo único, da Constituição Federal.

Ademais, veja–se que inexiste norma jurídica que possa ampará–lo visto que o artigo 113, § 2º do Código Tributário Nacional estabelece a obrigatoriedade do cumprimento de obrigação acessória, qual seja, a emissão da respectiva nota fiscal em decorrência da prestação dos serviços, sendo ela a prova do recebimento pelo serviço prestado.

Conclui–se, portanto, que aquela adrede mencionada norma estabelece uma coerção indireta, tudo a contrariar frontalmente, como já dito, o entendimento do Superior Tribunal Federal, cabendo a Administração Pública valer–se de outros meios para cobrança de seus créditos, especificamente a execução fiscal.

Nesse sentido, já se pronunciou, inclusive, este E. Tribunal em diversas oportunidades:

Mandado de Segurança – Insurgência contra a vedação de emissão de notas fiscais à contribuinte inadimplente Instrução Normativa nº 19 SF/SUREM Ilegalidade – Impossibilidade de utilização desse meio coativo para cobrança de débito tributário – Ofensa ao princípio da legalidade Recursos oficial e voluntário improvidos. (4ª Câmara de Direito Público, Apelação nº 0006763–04.2013.8.26.0053, Rel. Des. Luis Fernando Camargo de Barros Vidal, j. 24/02/2014).

APELAÇÃO – Mandado de segurança Instrução Normativa SF/SUREM 19/2011 – Suspensão de emissão de notas fiscais por contribuintes inadimplentes de ISS – Inadmissibilidade – Meio não previsto em lei para cobrança de tributos – Ato coator configurado – Decisão denegatória da ordem impetrada reformada. RECURSO PROVIDO. É inadmissível a imposição da suspensão de emissão de notas fiscais eletrônicas com fito de constranger o contribuinte inadimplente à satisfação do crédito tributário devido. (1ª Câmara de Direito Público, Apelação nº 0016940–27.2013.8.26.0053, Rel. Des. Vicente de Abreu Amadei, j. 08/04/2014).

Por tais razões, dá–se provimento ao apelo, reformando integralmente a v. sentença recorrida, com inversão da sucumbência.

SILVA RUSSO – Relator.

Fonte: Grupo Serac – Boletim Eletrônico INR nº 6532 | 05/08/2014.

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Café com Jurisprudência debate “Emolumentos e gratuidade” em última palestra do 8° Ciclo

O último encontro do 8° Ciclo do Café com Jurisprudência foi realizado no último dia 27, em São Paulo, na Escola Paulista da Magistratura, com o tema “Emolumentos e gratuidade”. O evento teve a participação do Oficial de Registro de Imóveis de Campos do Jordão, Fábio Ribeiro dos Santos; do presidente da Associação dos Registradores Imobiliários de São Paulo – ARISP, Flauzilino Araújo dos Santos; do desembargador do TJSP, Luís Paulo Aliende Ribeiro e da juíza da 1ª Vara de Registros Públicos, Tânia Mara Ahualli.

O registrador Fábio Ribeiro dos Santos abordou o tema a partir de uma perspectiva histórica, até chegar ao artigo vigente, art° 236 da Constituição Federal,  e citou Aliomar Baleeiro, cuja doutrina alega que o exercício da atividade notarial e  registral repugna o desempenho do particular. “Se a atividade que gera os emolumentos é propriamente uma atividade pública, ela está completamente afastada do domínio particular e, em face da Constituição de 1967, o que existe são taxas de serviços”, ponderou Fábio.

O oficial esclarece que nesse caso seria uma espécie de remuneração para o Estado, em decorrência de uma atividade pública, e que na condição de serviço público o emolumento se encaixava na categoria de taxa. Ele também menciona que os recebimentos de emolumentos eram autorizados especialmente para a remuneração do serventuário do cartório.

De acordo com o registrador, a ideia era que os emolumentos pertenciam ao Estado, mas os serventuários, o titular da delegação, recebiam esses emolumentos como uma espécie de remuneração alternativa. Para elucidar, Fábio faz referência ao voto condutor do ministro Moreira Alves na época: “O serviço exercido pelo estado é por meio do seu agente, que é o serventuário da Justiça submetido a este regime especial”.

Ainda segundo Santos, esta seria a razão para a continuidade das taxas, com caráter de receita pública, podendo o Estado reservar parte para si, por meio da fixação de porcentagens incidentes sobre sua arrecadação – uma circunstância que evidencia os emolumentos, em qualquer caso, como espécie de taxas devidas ao estado, contra a prestação compulsória de serviço público, específico e divisível.

“O estado permite ao serventuário que fique total ou parcialmente com o que é arrecadado a este título, para fazer face às despesas do cartório e ao seu salário. É como se realmente essa receita fosse recebida pelo Estado e imediatamente transferida ao serventuário ou delegatório para essas finalidades”, acrescenta Fábio.

No entanto, houve algumas alterações após a vigência da constituição de 1988. O registrador também citou decisões do STF modificaram essa visão, entre elas a emenda 19, na reforma administrativa, que faz a distinção entre o serviço público e o servidor público titular de cargo efetivo. “Essa é a disposição da constituição e, a partir dessa distinção, o Supremo já disse que delegatário não era servidor de cargo público efetivo. Portanto, não se aplicaria compulsoriedade”, alerta o registrador.

ISS x Atividade Notarial e Registral

Outro item questionado por Fábio Ribeiro dos Santos durante o encontro foi o Imposto sobre serviço (ISS) e a decisão direta de inconstitucionalidade (n°3089). “Nessa decisão se reconhece que os emolumentos podem sofrer a incidência de imposto sobre serviço, mas penso que o Supremo fez uma salada e misturou vários conceitos que realmente não poderiam ser utilizados. É uma soma de argumentos que não andam bem na distinção entre atividade econômica propriamente dita e serviço público”, afirma.

Para o desembargador Paulo Aliende, é indiscutível que o Registrador ou Notário é um agente público e nesta qualidade, particular, em colaboração com a administração, ele recebe uma remuneração como agente público. “Já falei para vários registradores e notários que essa decisão do Supremo confunde muitas coisa, mas também acredito que todos devem se convencer do que realmente são, pois tenho visto atuações coordenadas e individuais que se modificam a cada momento e atrapalham a classe. Isso precisava ser mudado”, sugere o desembargador.

Além do ISS e as controversas posições sobre qual categoria notários e registradores se enquadra, Santos falou sobre a extensão da gratuidade, a qual se sente incomodado não porque permite alguém que não pode pagar obtenha o benefício, mas sim para os casos opostos a essa situação. “Precisamos da consciência do usuário, do Poder Judiciário e dos próprios titulares, pois quem arca com a atividade, quem paga pelo serviço, ajuda a manter o equilíbrio nas contas, exatamente para que os que não podem pagar sejam beneficiados com a gratuidade”.

Já sobre o direcionamento de verbas provenientes dos emolumentos para o Estado, o desembargador  Paulo Aliende apoia este tipo de procedimento. Segundo ele, o Estado pode criar um fundo, pelo qual é possível cobrir eventuais prejuízos com a negligência de notários e registradores.  “Se uma delegação finda não por causas naturais, como aposentadoria e falecimento, mas por perda de delegação de um titular que praticou conduta irregular e causou prejuízo ao Estado, este último assume o serviço de volta, porém recebeu um dinheiro suficiente para sanar aquela unidade e devolver a unidade limpa para o próximo concurso extrajudicial”, conclui.

Fonte: iRegistradores – ARISP | 03/07/2014.

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TJ/SP. Apelação – Ação declaratória – Sentença de improcedência – ISS sobre serviços de registros públicos, cartoriais e notariais – Base de cálculo – Aplicação do Decreto-Lei nº 406/68 para cobrança em valor fixo – Possibilidade, tendo em vista responsabilidade pessoal do Delegatário – Sentença reformada, quanto à forma de recolhimento do imposto – Recurso provido.

EMENTA

APELAÇÃO – Ação declaratória. Sentença de improcedência. ISS sobre serviços de registros públicos, cartoriais e notariais. Base de cálculo. Aplicação do Decreto-lei nº 406/68 para cobrança em valor fixo. Possibilidade, tendo em vista responsabilidade pessoal do delegatário. Sentença reformada, quanto à forma de recolhimento do imposto. Recurso provido.(TJSP – Apelação Cível nº 0013135-08.2009.8.26.0053 – São Paulo – 14ª Câmara de Direito Público – Rel. Des. João Alberto Pezarini – DJ. 09.06.2014)

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº 0013135-08.2009.8.26.0053, da Comarca de São Paulo, em que é apelante ÉLVIO PEDRO FOLONI, é apelado PREFEITURA MUNICIPAL DE SÃO PAULO.

ACORDAM, em 14ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: "Por maioria de votos, deram provimento, vencido o 2º juiz, Des. Octávio Machado de Barros que declarará.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores OCTAVIO MACHADO DE BARROS (Presidente) e HENRIQUE HARRIS JÚNIOR.

São Paulo, 8 de maio de 2014.

JOÃO ALBERTO PEZARINI – Relator.

RELATÓRIO

Cuida-se de apelação (fls. 44/61) em face de sentença (fls. 245/253) que julgou improcedente ação declaratória [1], condenando ao pagamento das custas processuais, bem como honorários advocatícios arbitrados em R$ 5.000,00.

Insurge-se quanto à forma de tributação do ISSQN.

Sustenta ofensa ao principio da isonomia e inadmissibilidade de bitributação em nosso ordenamento.

Defende a vigência do artigo 9º do DL nº 406/68.

Pede reforma, para que lhe seja autorizado recolher o imposto na forma de trabalho pessoal.

Recebido e processado (fls. 305), houve contrarrazões (fls. 309/325).

É o relatório.

VOTO

Em face da improcedência da ação direta de inconstitucionalidade ajuizada pela Associação dos Notários e Registradores do Brasil Anoreg/BR (ADI nº 3.089-2), não mais se admite discussão em torno da incidência ou não do ISS decorrente dos serviços de registros públicos, notários ou cartorários.

Contudo, o autor faz jus ao recolhimento de ISS nos termos do artigo 9º, §1º, do Decreto-lei nº 406/68, como objetivado no apelo.

Os serviços notariais e de registro são exercidos em caráter privado, por delegação do Poder Público, conforme disposto no artigo 236, “caput”, da Constituição Federal, dispositivo este regulamentado pela Lei nº 8.935/94.

Saliente-se, a propósito do tema, o que dispõe o diploma por último referido:

Art. 3º Notário, ou tabelião, e oficial de registro, ou registrador, são profissionais do direito, dotados de fé pública, a quem é delegado o exercício da atividade notarial e de registro.”

(…)

“Art. 21. O gerenciamento administrativo e financeiro dos serviços notariais e de registro é da responsabilidade exclusiva do respectivo titular, inclusive no que diz respeito às despesas decusteio, investimento e pessoal, cabendo-lhe estabelecer normas, condições e obrigações relativas à atribuição de funções e de remuneração de seus prepostos de modo a obter a melhor qualidade na prestação dos serviços.” (destaque nosso)

“Art. 22. Os notários e oficiais de registro responderão pelos danos que eles e seus prepostos causem a terceiros, na prática de atos próprios da serventia, assegurado aos primeiros direito de regresso no caso de dolo ou culpa dos prepostos.

Diante disso, tudo aponta a pessoal responsabilidade dos titulares dos cartórios, em função da delegação dos serviços feita em seu nome, mediante a aprovação em concurso público.

Este, aliás, o entendimento de Sacha Calmon, conforme artigo coletivo, publicado na Revista Dialética, acerca da base de cálculo do ISSQN incidente sobre serviços notariais e de registro público: [2]

… a responsabilidade dos titulares de cartórios é pessoal, em decorrência da delegação dos serviços, respondendo, de forma ilimitada e intransferível, pelos danos causados por eles mesmos e por seus prepostos a terceiros.

Nesse quadro, é oportuna ainda a referência do ilustre jurista ao voto do Ministro Marco Aurélio, no julgamento da ADI nº 3.089, perante o Supremo Tribunal Federal:

(…) Encontramo-nos, então, em posição de analisar a inserção de uma consideração isolada, obiter dictum, no voto do Ministro Marco Aurélio, do seguinte teor: 'no tocante à base de incidência descabe a analogia profissionais liberais, Decreto n° 406/68 -, caso ainda em vigor o preceito respectivo, quando existente lei dispondo especificamente sobre a matéria. O artigo 70 da Lei Complementar nº 116/03 estabelece a incidência sobre o preço do serviço."

À vista dos argumentos e considerações expostos ao longo deste Parecer, tem razão o Ministro Marco Aurélio, descabe a analogia. Embora proferida em obiter dictum, o que não obriga nem o próprio Ministro Marco Aurélio, em futuro julgamento sobre a base de cálculo adequada aos serviços de registro público, cartorários e notariais, cabe-nos ponderar que, efetivamente, é inadequada a analogia entre os serviços prestados por 'profissionais liberais', que podem se associar, formando sociedades especiais (como ocorre com os advogados), e os serviços radicalmente diferentes, prestados pelos tabeliães, notários e registradores públicos. A analogia ao parágrafo 3° do art. 9° do DL n° 406/68 somente poderia ser feita se os titulares de cartórios e tabelionatos pudessem, legalmente, integrar ou formar sociedades o que não é possível – ou pelo menos se as serventias tivessem personalidade (o que não ocorre) e, uma vez feita a analogia, o que é incompatível com nosso sistema jurídico, ela arrastaria consigo toda a problemática da vigência, superveniente ao advento da Lei Complementar n° 116, do mesmo dispositivo, o parágrafo 30 do art. 9°, constante do citado DL na 406/68.

Em verdade, o que se dá é o enquadramento direto e perfeito da prestação de serviços notariais e de registro público no parágrafo 1° do art. 9° do DL n° 406/68, de vigência não contestada.

O exercício da profissão de notário, tabelião e oficial de registro desencadeia responsabilidade personalíssima. (…)

Veja-se, por sua vez, precedente do Egrégio Superior Tribunal de Justiça, em caso semelhante ao ora discutido:

PROCESSO CIVIL. CARTÓRIO DE NOTAS. PESSOA FORMAL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. RECONHECIMENTO DE FIRMA FALSIFICADA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. O tabelionato não detém personalidade jurídica ou judiciária, sendo a responsabilidade pessoal do titular da serventia. No caso de dano decorrente de má prestação de serviços notariais, somente o tabelião à época dos fatos e o Estado possuem legitimidade passiva. Recurso conhecido e provido.” [3] (destaquenosso)

Assim, entendendo-se que o artigo 9º, § 1º, do Decreto-lei nº 406/68 [4] permanece vigente, mesmo após a edição da Lei Complementar nº 116/03 (artigo 10), tal confere aos titulares de cartórios o recolhimento do ISSQN fixo, não obstante a possibilidade de contratação de terceiros (artigo 20, da Lei 8.935/94).

A propósito, questão idêntica foi travada nos autos de mandado de segurança nº 533.01.2008.010018-2, impetrado perante a 1ª Vara Cível de Santa Bárbara D'Oeste, sendo oportuno transcrever parte da sentença ali proferida:

… A prestação do serviço sob a forma de trabalho pessoal, ainda que suscetível de auxílio de terceiros para redação de atos, aliada à responsabilidade pessoal derivada da lei disciplinadora dos serviços notariais e de cartório, aponta para a correção da incidência da regra de exação especial, inserta no artigo 9º do Decreto-lei nº 416/68. Ademais, a legislação tributária, especificamente a que diz respeito ao Imposto de Renda (Decreto nº 3.000/99, artigos 45 e 106), confere aos tabeliães, notários e oficiais de registro tratamento fiscal idêntico àquele carreado aos exemplos clássicos de profissionais liberais, como sói ocorrer em relação a médicos, engenheiros e advogados, no tocante aos quais a aplicação da regra de exação veiculada no artigo 9º do Decreto-lei nº 416/68, conforme reiterada jurisprudência pátria, é fora de dúvidas, dês que o serviço seja unipessoal.Derradeiramente, entendo que a tributação sobre todo o rendimento do impetrado (ainda que ressalvadas as custas repassadas ao Estado), de fato, caracteriza inaceitável bitributação, uma vez que o rendimento já consiste na base de cálculo para apuração do Imposto de Renda, do qual é contribuinte o impetrado. E, nessa senda, avista-se-me ilícita a persecução de exação sobre o rendimento do impetrado, devendo o Município valer-se da regra de alíquotas fixas ou variáveis, nos termos do disposto no § 1º do artigo 9º do Decreto-lei nº 416/68.” (grifo nosso)

Nesse quadro, merece reforma a sentença quanto a forma de recolhimento do ISS, qual seja, nos termos do artigo 9º, § 1º do Decreto-lei nº 406/68.

Posto isso, dá-se provimento ao recurso.

JOÃO ALBERTO PEZARINI – Relator.

_______________________________

Notas:

[1] Ação declaratória nº 053.09.013135-8, valor da causa, em abril de 2009: R$ 1.000,00.

[2] Revista Dialética de Direito Tributário nº 158, pág. 108/116, Sacha Calmon Navarro Coelho, Misabel Abreu Machado Derzi e Valter Lobato.

[3] REsp 545613/MG, relator Ministro CESAR ASFOR ROCHA, j. 8.5.2007

[4] Art 9º A base de cálculo do imposto é o preço do serviço.

§ 1º Quando se tratar de prestação de serviços sob a forma de trabalho pessoal do próprio contribuinte, o imposto será calculado, por meio de alíquotas fixas ou variáveis, em função da natureza do serviço ou de outros fatores pertinentes, nestes não compreendida a importância paga a título de remuneração do próprio trabalho.

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Fonte: Grupo Serac – Boletim Eletrônico INR nº 6454 | 13/06/2014.

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