Cartórios e a vida como ela é – Por: Rodrigo da Cunha Pereira

* Rodrigo da Cunha Pereira

Começaram a vigorar em 10 de dezembro importantes normas jurídicas estabelecendo novas regras para os cartórios de acordo com o Provimento nº 260 da Corregedoria Geral de Justiça do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). Embora seja uma regulamentação dirigida mais aos cartórios, ela interessa a todos, pois afeta a vida da população em geral. Em mais de 1 mil artigos, esse provimento ampliou, alterou, detalhou e inovou em vários aspectos os atos registrais, obviamente nos limites da Lei de Registros Públicos (Lei 6.015/73).

Não há quem nunca tenha ido a algum cartório ou esteve dependente de um local em que se fazem procurações por instrumento público, reconhecem-se assinaturas, registram-se e transferem-se imóveis, fazem-se escrituras e são guardados documentos públicos ou particulares. Por mais que não gostemos de enfrentar essa burocracia e papelada, ela faz parte da nossa vida, e é mais uma herança da colonização portuguesa. Por mais que não gostemos, ela é necessária e significa um sistema de organização para dar segurança, publicidade e autenticidade às relações jurídicas. Comprar ou vender um imóvel, protestar uma dívida, nascer, casar, divorciar, morrer, entre vários outros exemplos, são atos que precisam se tornar públicos inclusive para evitar que sejamos enganados. Tudo isso para viabilizar uma organização social e negocial com um mínimo de segurança e controle estatal.

Esse sistema de organização jurídica é assim desde que o mundo é mundo, ou melhor, desde a colonização portuguesa, que implantou o sistema de vários tipos de cartórios: de notas, de registro de imóveis, de registro de pessoas, naturais e jurídicas, protesto, títulos e documentos, enfim, um emaranhado de livros registrais de difícil compreensão para o leigo. Uma mudança significativa nos últimos tempos na organização dos cartórios é que "donos" não são mais os "donos", como se dizia antigamente em linguagem leiga. Desde 1988 os tabeliães e notários só se titularizam em um cartório por concurso público.

A novidade trazida pelo Provimento 260/2013 é que, além de ter detalhado e melhorado muitos aspectos quanto à segurança jurídica de muitos atos registrais, apesar de ter aumentado a burocracia, alterou vários aspectos da vida em família. A partir de agora é possível, e com mais facilidade, registrar as Diretivas Antecipadas de Vontade (artigo 259). Isso significa que eu mesmo posso escolher meu possível curador em caso de doença degenerativa diagnosticada com antecedência, ou mesmo deixar registrado o não prolongamento de minha vida em situação de sofrimento e de cura improvável.

O Conselho Federal de Medicina, com a Resolução nº 1.995/2012, já havia autorizado tal prática, que agora pode ser registrada em cartórios, dando mais autenticidade e credibilidade. A união estável pode ser registrada no Cartório de Registro Civil e assemelhou-se mais ainda ao casamento, o que traz mais segurança para as partes e para terceiros. Ou seja, a partir daí esses registros informarão se alguém pode ou não vender um imóvel, por exemplo, sem a anuência de seu companheiro (a).

Com isso haverá mais transparência e segurança para toda a população, já que se poderá saber a partir do registro civil se alguém vive em união estável. Seguindo a tendência de outros estados brasileiros, sepultou de vez a polêmica do casamento civil entre pessoas do mesmo sexo ao regulamentar e detalhar sobre a sua preparação, autorizando que seja feito igualmente para as relações hetero e homoafetivas.

Foi um avanço, sem dúvida. Mas o TJMG não criou essas novas modalidades de vida em família. Ele apenas estabeleceu procedimentos para atualização de uma nova realidade. Afinal os atos registrais, apesar de suas incompreensíveis mas necessárias burocracias, só existem para registrar os atos da vida civil, ou seja, para traduzir a vida como ela é.

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* Rodrigo da Cunha Pereira Advogado, presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família.

Fonte: ANOREG/BR | 11/02/2014.

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TJ/RJ: Atos notariais e registrais terão selo de fiscalização eletrônico

Os atos notariais e registrais contarão com um novo instrumento de fiscalização indireta. Será instituído, a partir do dia 10 de março, o selo de fiscalização eletrônico. A novidade foi divulgada nesta segunda-feira, dia 13 de janeiro, por meio da publicação do Ato Executivo Conjunto nº 02/2014, assinado pela presidente do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro, desembargadora Leila Mariano, e pelo corregedor-geral da Justiça do Estado, desembargador Valmir de Oliveira Silva.

De acordo com o ato, o instrumento poderá ser controlado pelo órgão fiscalizador e pelos próprios usuários dos serviços extrajudiciais, que poderão visualizar as informações relativas à identificação de cada ato praticado por meio do site do TJRJ, de acordo com o respectivo selo de fiscalização.

Para a medida, foi considerada a constante necessidade de aperfeiçoamento dos procedimentos de fiscalização dos serviços extrajudiciais, observando a evolução tecnológica. A mudança considerou ainda que cabe à Corregedoria Geral da Justiça adotar as medidas necessárias para propiciar melhores condições de normatização, orientação e fiscalização das atividades extrajudiciais, buscando sua prestação eficiente e eficaz. O novo modelo também irá proporcionar maior segurança e celeridade às demandas dos usuários.

Com identidade firmada pela combinação alfanumérica do seu código e por uma sequência aleatória de três letras, o selo de fiscalização eletrônico tem como escopo principal o controle em relação à prática dos atos extrajudiciais e o respectivo recolhimento dos acréscimos legais destinados ao Fundo Especial do Tribunal de Justiça, não substituindo a fé pública que a lei confere ao notário e ao registrador.

Ainda de acordo com o ato, é obrigatória a afixação do selo eletrônico de fiscalização em todos os atos extrajudiciais que venham a ser praticados. O prazo para a transmissão dos atos será contado em dias corridos, excluindo-se o dia da prática do ato e incluindo-se o de vencimento. Os registros de nascimento e óbito e a certidões referentes a estes registros contarão com um prazo de dois dias para a transmissão dos atos. Os demais atos extrajudiciais terão um prazo de quatro dias.

Fonte: TJ/RJ I 13/01/2014.

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CONHECENDO OS CARTÓRIOS – O seu valor e desarrazoados mitos – Parte 1

* Fernando Alves Montanari

Tudo na vida tem seu valor, inclusive a própria vida. Por isso, as vidas são únicas, especiais e merecem, não importando os fins a que se destinam, ser vistas de antemão com todo respeito e dignidade, principalmente aquelas que marcam a trajetória da Humanidade de forma positiva para o crescimento e evolução de todos. Se assim não for, se não fizermos nossa vida valer a pena ser vivida por aquilo que acreditamos e pelo bem de todos, o que nos constitui como “humanos” se esvai e automaticamente deixamos de ser e, quiçá, de existir. Passamos a um estado próximo do vegetativo, nos tornando escravos de uma vida imposta e não da vida que deveríamos viver, sendo que a vida escrava não tem gosto, não tem sabor, não é digna e não tem valor. Pode, quando muito, ter preço, ter custo, ter cotação…

Filosofias à parte, além da vida, alguns produtos e serviços que nos rodeiam também têm seu valor inerente, desde que prestem para algo e alcancem os fins que se destinam. Por isso, dizemos que estes valem por si mesmos. Se não valerem, são descartados ou descartáveis, inúteis, não precisam existir.

Tendo por partida esse raciocínio, muitas e desarrazoadas vozes defendem a extinção dos cartórios extrajudiciais, fulcradas em verdadeiros mitos, sem qualquer embasamento fático ou efetivo que as torne, ao menos, verossímeis.

Vejamos alguns deles, seus erros e, por via direta, os direitos que nos protegem enquanto brasileiros.

PRIMEIRO MITO – CARTÓRIOS SÃO FONTES DE BUROCRACIA EXAGERADA.

Por primeiro, a burocracia está presente em todas as instituições, sejam elas públicas ou privadas, pois todas fazem uso de procedimentos e regulamentos para desenvolverem suas atividades. Não existe aparelhamento sem divisão, regramento e controle. O problema reside, concordemos, no exagero e uso desenfreado da burocracia.

Os cartórios, antes de tudo, cumprem os ditames legais, até mesmo porque são fiscalizados pelo Poder Judiciário, por mandamento constitucional, e se assim não agirem, sofrem sanções de várias ordens. Deste modo, se existe burocracia nas leis que os cartórios cumprem, devemos atentar mais para aqueles que elegemos para nos representar através do Poder Legislativo, pois são estes que fazem as leis que nos governam.

Ademais, como garantidores da segurança jurídica, não podem os cartórios estar à mercê do mau que alguns teimam em fazer prosperar nas relações sociais com suas falsificações e suas mentiras. A Verdade e a concretude do Direito estão entre as pedras angulares dos registros públicos. Lembremos que chancelar um escrito com a fé pública é um atributo único dos cartórios para que os fatos sejam por todos admitidos com segurança. A vileza humana deve sucumbir ante os procedimentos dos cartórios, por isso estes fazem uso da boa burocracia, a qual, por sua vez, faz com que a Prudência emirja. Quem pensa diferente, provavelmente, precisa atingir negativamente a boa-fé alheia.

Saibamos que somente através da abertura de um cartão de padrão de assinaturas, colheita de impressão digital, identificação fotográfica e documental, entre outros, existe certa segurança para atestar que alguém que assina um documento de transferência de carro, por exemplo, perante o tabelião de notas, é aquele que afirma ser seu dono. Do contrário, falsificadores poderiam abusar da boa-fé da sociedade e perpetrar seus crimes e abusos.

Estes procedimentos não são exagerados. Antes disso, são necessários. E crescem na mesma medida que os bandidos se aperfeiçoam, como resposta da própria sociedade e dos cartórios para garantia da almejada segurança. O outro jeito é impedirmos, através de algum mecanismo, que estas pessoas existam, coisa deveras exagerada.

Concluímos que os cartórios valem por sua prudente burocracia, que atua na medida exata para e pelo bem de todos nós e não, como alguns levianamente fazem prosperar, de que a burocracia serve para enriquecer seus titulares.

SEGUNDO MITO – CARTÓRIOS SÃO COISAS QUE PASSAM DE PAI PARA FILHO.

Desde a Constituição de 1988 de forma mais intensa o concurso de provas e títulos é a única forma de assumir um cartório. Nada mais democrático, nada mais justo, até mesmo porque é um concurso realizado pelo Poder Judiciário, com a participação do Ministério Público, da Ordem dos Advogados do Brasil, de um notário e um registrador em todas as fases do mesmo.

No nosso país existem aqueles que no momento em que a atual Constituição foi promulgada já eram titulares de cartórios e, portanto, ao ver dos Tribunais, portadores do chamado “direito adquirido”, ou seja, do direito incorporado de continuarem encabeçando os mesmos. Existem, também, os que ocupam o cargo de forma provisória, pois de alguma forma o cartório que respondem perdeu seu titular (por exemplo, por morte) e até que novo concursado assuma o mesmo, deverão dar continuidade ao serviço público ali prestado.

A ideia de que os cartórios passam de pai para filho, por isso, veio daqueles interinos que eram filhos de titulares e permaneceram na função após a morte de seu genitor, pois que eram educados para tanto e, geralmente, faziam parte dos funcionários mais experientes e antigos da serventia, o que embasou decisões judiciais que os nomearam para que o serviço não parasse.

Trata-se de imagem totalmente obsoleta e ilegal, não podendo prosperar sob nenhum argumento, sob pena de diminuirmos a igualdade e a oportunidade que todos nós temos de sermos “donos” de cartórios, bastando que preenchamos os requisitos legais e sejamos aprovados em concorrido e difícil concurso público.

Os cartórios valem pelo respeito que nos é garantido como forma de a um deles assumirmos, através deste concurso, que iguala e escolhe os melhores, além do fato de que por trás daquela estrutura de mesas, cadeiras, funcionários e maquinários, existe um titular aprovado por uma concorrência pública, ou um portador de direito adquirido ou um interino mais capacitado e, espera-se, todos fortemente preparados para dar cabo aos problemas que lhes são apresentados da melhor forma possível, garantindo e assegurando nossos direitos e liberdades, sob o manto da fé pública.

(continuaremos na próxima semana)

Clique aqui e leia a Parte II.

Clique aqui e leia a Parte III.

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* Fernando Alves Montanari é Oficial de Registro Civil  das Pessoas Naturais e Tabelião de Notas do município de Lourdes, Comarca de Buritama. Ex-advogado. Pós graduado em Direito Empresarial, Notarial, Registral e Tributário.

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