2ª VRP|SP: Consulta – Tabelionato de Notas – Lavratura de inventário notarial em existindo testamento válido – Herdeiros maiores e capazes – Ordenamento jurídico – Necessidade de processamento em unidade judicial – Em resposta a consulta formulada, é no sentido da impossibilidade da realização de inventário extrajudicial em existindo testamento válido.

Processo 0006385-67-2014 Pedido de Providências 7º Tabelionato de Notas da Capital – VISTOS. Trata-se de expediente instaurado a partir de consulta realizada pelo Sr. 7º Tabelião de Notas da Comarca da Capital acerca da possibilidade de proceder ao inventário extrajudicial nas hipóteses em que existe testamento e todos os herdeiros são maiores e capazes consoante decisões prolatadas pelas 7a e 10a Varas da Família e das Sucessões do Foro Central da Comarca da Capital. A representante do Ministério Público e o Colégio Notarial do Brasil Seção São Paulo apresentaram entendimentos acerca da possibilidade da realização de inventário extrajudicial, este último inclusive com apoio em entendimento do Instituto Brasileiro de Direito de Família (a fls. 09/12 e 14/29). É o breve relatório. DECIDO. A situação em exame refere-se à possibilidade da realização de inventário (em verdade arrolamento) extrajudicial na hipótese da existência de testamento válido após sua abertura ou apresentação, arquivamento, registro e cumprimento em processo jurisdicional (CPC, art. 1.125 e ss.). O Ministério Público,o Colégio Notarial do Brasil Seção de São Paulo, o Instituto Brasileiro de Direito de Família, Juízos da Vara da Família e das Sucessões do Foro Central da Comarca de São Paulo, e mesmo precedente administrativo desta 2ª Vara de Registros Públicos do Foro Central da Comarca de São Paulo (processo n. 0072828-34.2013.8.26.0100, decisão proferida em 14.02.2014) alicerçados em interpretação teleológica do disposto no art. 982 do Código de Processo Civil tem entendimento firme acerca da possibilidade do inventário extrajudicial na sucessão testamentaria diante no caso de concordância dos herdeiros e legatários capazes. São entendimentos respeitáveis voltados à eficiente prestação do imprescindível serviço público destinado à atribuição do patrimônio do falecido aos herdeiros e legatários. Ideologicamente não poderíamos deixar de ser favoráveis à essa construção na crença da necessidade da renovação do Direito no sentido de facilitar sua aplicação e produção de efeitos na realidade social, econômica e jurídica. Não obstante, é necessário adequar a compreensão ao ordenamento jurídico conforme nossos estudos e ditames da ciência jurídica, pena da ausência de legitimidade de sua concreção no meio social. Não estamos aqui a defender um retorno ao positivismo e tampouco uma interpretação limitada em conformidade à célebre assertiva de Montesquieu o juiz é a boca que pronuncia as sentenças da lei. Impende considerar o contexto social na aplicação do Direito, assim, acompanhamos o pensamento de António Pedro Barbas Homem, conforme segue: A época contemporânea produziu um direito impecável na sua apresentação formal, mas despojado de alma. O estilo seco e sem adjectivos e a linguagem fria e impessoal das leis denuncia uma ciência do direito que procura a perfeição dogmática, mas tantas vezes esquecendo que o direito existe para disciplinar a economia e a sociedade de modo justo, organizando direitos e interesses e não para responder a problemas teóricos (O justo e o injusto. Lisboa: AAFDL, 2005, p. 44). Também interessante é lição de Eduardo Vera-Cruz Pinto ao tratar da diversidade entre lei e Direito nos seguintes termos: Não se pode dar o nome de Direito a qualquer normação da sociedade através da lei do Estado. Mesmo em democracia política e em Estado regido pela Constituição, os discursos políticos das maiorias que se constituem circunstancialmente nos parlamentos, enunciados sob a forma de normas legais publicadas no Diário da República, não são por si só, regras de Direito. O Direito inicia o seu percurso histórico em Roma: através de modos específicos (jurídicos) de criar regras de Direito assentes no labor criativo de pessoas com auctoritas, saber assente na experiência e socialmente reconhecido, que eram adoptadas pela comunidade; regras que eram praticadas em ambiente de separação e equilíbrio de poderes, efectivada pelas magistraturas, e aplicadas por um processo que envolvia o pretor; o iudex e o advocatus visando a justiça do caso concreto (Curso livre de ética e filosofia do direito. Cascais: Principia, 2010, p. 185/186).Conforme Gustavo Zagrebelsky (Il diritto mite. Torino: Eunadi, 1992, p. 181), o juiz deve considerar a lei e a realidade na aplicação do Direito, a consideração única do caso conduziria a uma casuística incompatível com o a existência do Direito como ordenamento, de outra parte, a consideração exclusiva do ordenamento levaria a uma ciência teorética inútil às finalidade do Direito. Diante disso, a construção e interpretação dos fundamentos da presente decisão administrativa passará pelo equilíbrio e comunicação do Direito com suas finalidades, todavia, sempre preso ao dado legislativo como emanação das opções estatais pelo fio condutor da soberania estatal. O art. 982, caput, do Código de Processo Civil estabelece: Havendo testamento ou interessado incapaz, proceder-se-á ao inventário judicial; se todos forem capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário (grifos nossos). De outra parte, os itens 117, alínea “j”, 129 e 129.1 do Capítulo XIV, das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça têm a seguinte redação: 117. Na lavratura da escritura deverão ser apresentados os seguintes documentos: j) certidão comprobatória da inexistência de testamento (Registro Central de Testamentos). 129. É possível a lavratura de escritura de inventário e partilha nos casos de testamento revogado ou caduco ou quando houver decisão judicial, com trânsito em julgado, declarando a invalidade do testamento. 129.1. Nessas hipóteses, o Tabelião de Notas solicitará, previamente, a certidão do testamento e, constatada a existência de disposição reconhecendo filho ou qualquer outra declaração irrevogável, a lavratura de escritura pública de inventário e partilha ficará vedada e o inventário far-se-á judicialmente. Diante disso, as NSCGJ são claras ao permitir a lavratura de inventário extrajudicial diante de dois requisitos: (i) testamento revogado, caduco ou com invalidade reconhecida por decisão judicial com trânsito em julgado e, (ii) ausência de conteúdo não patrimonial nas disposições testamentárias (CC, art. 1.857, p. 2º). Nessa perspectiva a situação ora pretendida é expressamente proibida pela redação atual das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça ante a existência de testamento válido conforme decisão judicial proferida em procedimento de jurisdição voluntária. Não obstante, a compreensão elaborada não tratou da prescrição administrativa da E. Corregedoria Geral da Justiça e sim das leis incidentes, sabidamente o fundamento último daquela. Mesmo assim, modestamente, no momento, pensamos não ser possível a lavratura de inventario extrajudicial diante da presença de testamento válido. Há diversidade entre a sucessão legítima e testamentária no campo da estrutura e função de cada qual, para tanto, conforme Norberto Bobbio (Da estrutura à função. Barueri: Manole, 2007, p. 53), devemos indagar não apenas a estrutura (“como o direito é feito”) mas também a função (“para que o direito serve”) e, nesse pensamento, vamos concluir pela diversidade estrutural e funcional das espécies de sucessão. Somente na sucessão testamentária existe um negócio jurídico a ser cumprido, o que, por si só, implica na diversidade dos procedimentos previstos em lei para atribuição dos bens do falecido. Paulo Nader comenta essa distinção da seguinte forma: (…) Quem não faz testamento revela a sua concordância tácita com as medidas da lei. Dispor em testamento significa adotar fórmulas sucessórias distintas das previstas no ordenamento. De nenhum sentido ou eficácia o testamento que se limita a induzir à partilha de modo coincidente com o plano da lei. Justifica-se, na medida em que desvia o destino de seu patrimônio, ou de parte dele, do rumo fixado em lei. Se irmãos são os herdeiros mais próximos, pode o hereditando excluí-los da sucessão, beneficiando parentes mais distantes ou estranhos. Se todos são filhos, poderá beneficiar a um ou vários deles, destinando-lhes a sua quota disponível, ou seja, metade de seu patrimônio (Curso de direito civil. v. 6. Rio de Janeiro: Forense, 2010, p. 206). Na sucessão testamentária há necessidade de se assegurar a execução da vontade do falecido testador e a proteção de interesses de familiares próximos, daí seu processamento sob a presidência de Juiz de Direito e, respeitosamente, em nosso pensamento, sem a possibilidade normativa do processamento em atividade extrajudicial delegada. As questões de conteúdo não patrimonial, a fiscalização à efetivação da vontade do testador, a eventual figura do testamenteiro e presença de institutos a exemplo da redução das disposições testamentárias e da deserdação nos conduzem a conclusão da inadequação jurídica, senão impossibilidade, do processamento em atividade de serviço extrajudicial delegado. Além disso, a interpretação do testamento, o que não ocorre no procedimento de jurisdição voluntária de apresentação ou abertura de testamento, compete ao juiz. Conforme Maria Berenice Dias A função interpretativa cabe ao juiz, que precisa cercar-se de elementos de convicção, buscando conhecer o perfil do testador no momento em que elaborou o testamento. Tem que procurar conhecer o que quis o testador (Manual das sucessões. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2008, p. 428). Enfim, o ordenamento jurídico aproxima, determina e impõe o processamento da sucessão testamentária em unidade judicial como se depreende dos regramentos atualmente incidentes e dos institutos que cercam a sucessão testamentária; daí a razão da parte inicial do art. 982 caput, do Código de Processo Civil iniciar excepcionado expressamente a possibilidade de inventario extrajudicial no caso da existência de testamento independentemente da existência de capacidade e concordância de todos interessados na sucessão; porquanto há necessidade de se aferir e cumprir (conforme os limites impostos à autonomia privada na espécie) a vontade do testador o que não pode ser afastado mesmo concordes os herdeiros e legatários. A interpretação pretendida, com o devido respeito, envolve tantas exceções que em nosso sentir não permite uma compreensão científica em conformidade com os mandamentos legais incidentes pelo fio condutor da Constituição da República. Noutra quadra, a presente decisão administrativa não trata de qualquer juízo e nem poderia, de decisões e interpretações de natureza jurisdicional, nosso papel é limitado ao cumprimento das determinações judiciais sem qualquer consideração. Nada obstante, sem ingressar no exame das particularidades da formação da coisa julgada em processos de jurisdição voluntária, o certo é a não inclusão dos Srs. Tabeliães da Comarca da Capital e desta Corregedoria Permanente nos limites subjetivos da coisa julgada atinente a processo de jurisdição voluntária de abertura, registro e cumprimento de testamento. A esta altura podemos afirmar nosso pensamento no sentido da impossibilidade da realização de inventário extrajudicial no caso da existência de testamento válido. Apesar de cientes da responsabilidade e da repercussão de nossa decisão enquanto precedente administrativo emanado de Autoridade Administrativa, também sabemos que a ciência só evolui pela crítica e pela tentativa de solução de problemas concretos e que as teorias, a exemplo da ora desenvolvida, estão sempre abertas à crítica. Karl Popper (O mito do contexto. Lisboa: Edições 70, p. 256) comenta esse aspecto nos seguintes termos: O que chamamos de objetividade científica nada mais é do que o facto de que nenhuma teoria científica é aceite como um dogma, e que todas as teorias são provisórias e sempre passíveis de críticas severas de uma discussão crítica racional que visa eliminar erros. Quanto à racionalidade da ciência, ela consiste simplesmente na racionalidade da discussão crítica. Nestes termos, a ampla discussão do ora decidido em conformidade à pluralidade de valores e princípios incidentes e mesmo o encontro de soluções díspares só nos aproxima no sentido da evolução da aplicação concreta que prevalecerá, donde se reconhece a legitimidade recursal de quaisquer Titulares de Delegação com atribuição bastante para a presidência de inventário extrajudicial para além dos diretamente envolvidos neste processo administrativo ante sua natureza consultiva, permitindo a exposição de todos os pensamentos e seu exame em conformidade a garantia constitucional do devido processo legal. Por fim, esta Corregedoria Permanente por decorrência do Poder Hierárquico está submetida à E. Corregedoria Geral da Justiça, assim, independentemente de eventuais recursos administrativos, remeta-se cópia desta decisão àquela para conhecimento e eventuais providências tidas por pertinentes. Ante o exposto, na esfera unicamente administrativa, respondemos a consulta no sentido da impossibilidade da realização de inventário extrajudicial em existindo testamento válido a par da capacidade de todos e concordância. Ciência ao Ministério Público. P.R.I (D.J.E. de 11.04.2014 – SP)

Fonte: DJE/SP | 11/04/2014.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.


Menina terá dupla paternidade em seu registro

Justiça de GO autorizou que seja acrescentado em seus registros o nome do padrastro e do pai biológico.

O juiz Andrey Máximo Formiga, da comarca de Estrela do Norte/GO, concedeu direito a uma garota para que seja reconhecida dupla filiação paterna e seja acrescentado em seus registros o nome de seu padrastro e de seu pai biológico.

Em ação de investigação de paternidade ajuizada pelo pai, representando a garota, foi manifestado o pleito de alterar o nome da menor e acrescentar o sobrenome "Cardoso", de seu pai biológico. O magistrado observou que não seria necessário apresentar outras provas, pois as partes entraram em acordo.

Ele observou que diante dos novos paradigmas comportamentais apresentados pela sociedade, "se tornou comum a existência de dois indivíduos exercendo a função de pai". Andrey Máximo pontuou que há a figura do pai socioafetivo, que contribui com a educação e dispensa carinho, afeto e respeito, e a do pai biológico, que contribuindo ou não com isso, é o responsável pelo material genético.

De acordo com ele, poderá ser reconhecido como pai o genitor que tiver relação parental já estruturada com o filho. "Percebe-se que a dupla parternidade já se tornou uma realidade na sociedade e no comportamento humano, o que se impõe juridicamente", frisou.

O juiz pontuou que o meio jurídico vem evoluindo no sentido de reconhecer a inclusão de um segundo pai no registro do filho. "A Lei de Registros Públicos sofreu modificação e incluiu o parágrafo 8º no artigo 57 da lei 6.015 para permitir que o enteado possa incluir em seus registros de nascimento o nome de família de seu padrasto", afirmou.

Para o magistrado, embora não seja comum, "é perfeitamente possível o pedido das partes, na medida que se preze o melhor interesse da menor".

Fonte: Migalhas | 08/04/2014.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.


TJ/PE: Artigo – Novo CPC e Família – Por JONES FIGUEIRÊDO ALVES

* JONES FIGUEIRÊDO ALVES

O projeto do novo Código de Processo Civil, aprovado pela Câmara dos Deputados (26.03.2014), apresenta importantes inovações para a eficiência da jurisdição e a efetividade dos julgados e, designadamente, também propõe significativos avanços para a área de família.

Anota-se, porém, que malgrado a supressão, no texto senatorial, sobre as ações de separação judicial (litigiosas ou não), por identidade lógico-constitucional com a Emenda Constitucional nº 66, quando conforme a melhor doutrina fez extinguir aquelas, o projeto analisado pela Câmara dos Deputados agora reedita a existência das referidas ações, ao trata-las no art. 746.

Antes de mais, importa dizer que o novo CPC traduz, com eficiência, os anseios de modernidade do processo civil de família, onde: (i) todos os esforços de desfecho devem ser empreendidos para a solução consensual da controvérsia, devendo o juiz dispor do auxilio de profissionais de outras áreas de conhecimento para a mediação e conciliação. No ponto, consagra-se a necessária interdisciplinaridade, acentuada nas ações de família (artigo 709); (ii) o Ministério Público somente intervirá quando houver interesse de incapaz (art. 713); (iii) o juiz decisor atuará sempre com dicção voltada a proferir a garantia e efetividade de direitos fundamentais.

Para além disso cumpre referir, com boa nota, outras significativas mudanças que o Código de Processo Civil projetado apresenta para o direito de família e sua operacionalidade, a exemplo: (i) assinatura digital dos juízes, a ensejar uma maior ação de presença para decisões-instantes, onde quer o magistrado se encontre; (ii) Livros específicos destinados à Parte Geral do Código de Processo Civil, tal como sucede com o moderno Código Civil; (iii) capítulo, no Livro I da Parte Geral, que trata dos Princípios e das Garantias Fundamentais do Processo Civil, permitindo, de tal diretiva, um permanente elo e consequente diálogo de fontes entre os direitos e garantias individuais elencados na Constituição de 1988 e a aplicação deles no processo civil; (iv) a disciplina do instituto da Tutela da Evidência, para os fins de medidas satisfativas que visam a antecipar ao autor, no todo ou em parte, os efeitos da tutela pretendida, tal como sucede com a atual Tutela da Urgência, também disciplinada; (v) um procedimento estabelecido em lei, pela primeira vez, para a aplicação da desconsideração da personalidade jurídica, cabível em todas as fases processuais, importando seus reflexos para a desconsideração inversa com atenção ao patrimônio dos cônjuges e efetiva defesa protetiva da meação; (vi) uma maior dinâmica sucumbencial, quando os honorários advocatícios passam a ser devidos também em pedidos contrapostos, no cumprimento de sentença, na execução resistida ou não, e nos recursos interpostos, de forma cumulativa; (vii) o emprego da conhecida técnica da distribuição dinâmica do ônus da prova, amplamente consagrada pela doutrina e moderna jurisprudência do STJ.

Pois bem. Na seara do direito de família processual, o novo Código de Processo Civil tem seu projeto indicando novos avanços, convindo assinalar, dentre outros, os seguintes: Procedimento especial – Cria-se, por imprescindível, um procedimento especial para as ações de família, que contém algumas especificidades importantes. Exemplo marcante é o da citação desacompanhada de cópia da petição inicial (art. 710 § 1º), tudo a conferir maior possibilidade de êxito na mediação e conciliação do conflito familiar, em audiência própria. No entanto, fica a ressalva de ser assegurado ao réu o direito de examinar o conteúdo da inicial a qualquer tempo. O procedimento especial para as ações de família está referido pelos artigos 708 a 714 do projeto.

Alienação Parental – Pela primeira vez, aparecerá no Código de Processo Civil a referência à alienação parental. No art. 714 do projeto, é previsto que quando a causa envolver a discussão sobre fatos relacionados a abuso ou alienação parental, o juiz, ao tomar o depoimento do incapaz, deverá fazê-lo acompanhado por especialista.

Considere-se, todavia, que melhor seria para efeito de disciplina da arguição, que esta fosse resolvida como incidente do processo, a ser dirimido com um procedimento mais amplo e eficiente, a tanto ensejar providencias específicas; salvo quando a invocação se constituir, efetivamente, como causa de pedir, em face da pretensão deduzida em juízo. De todo modo, registra-se que os processos de família envolvendo imputação de alienação parental, merecem tratamento específico, nomeadamente pela gravidade do tema. O mesmo pode-se afirmar para as ações de destituição do poder familiar, que estão a exigir um procedimento especial próprio.

Mediação – A disciplina da conciliação e da mediação (artigos 166 a 176 do novo CPC) aperfeiçoa os institutos, buscando, através deles, empreender mecanismos mais eficazes para a resolução consensual de conflitos. O projeto estabelece os princípios que regem a mediação e a conciliação, observando os parâmetros estabelecidos pelo Conselho Nacional de Justiça, para a formação dos conciliadores e mediadores (Resolução nº 125). Com efeito, o juiz, a requerimento das partes, poderá determinar a suspensão do processo enquanto os litigantes se submetem a mediação extrajudicial ou a atendimento multidisciplinar (art. 709, § único). Assinala-se, ainda, que a audiência de mediação e conciliação poderá dividir-se em tantas sessões quantas sejam necessárias para viabilizar a solução processual, sem prejuízo de providências jurisdicionais para evitar o perecimento do direito (art. 711).

Atendimento multidisciplinar – A figura do atendimento multidisciplinar dos litigantes, envolvendo profissionais de outras áreas de conhecimento como psicólogos, psicoterapeutas, pedagogos e assistentes sociais, aparece pioneira  no CPC projetado, no efeito de servir à hipótese de suspensão do processo, enquanto os litigantes a ele se submetam. Assim, importa urgente que os juízes de família estabeleçam paradigmas para o atendimento multidisciplinar, sempre que este novo instituto jurídico, em direito de família processual, seja necessário ou conveniente.

Parte convivente – Dentre os requisitos da petição inicial (art. 320) está prevista a necessidade de indicação da existência ou não de união estável por quem demanda ou por quem seja demandado (inciso II), quando se refere à qualificação das partes. Afinal, cuidará o novo CPC, de admitir, por via de consequência, a união estável como um estado civil, como temos de há muito sustentado.

Efetividade – O aperfeiçoamento de mecanismos para a efetividade dos julgados é uma expressão marcante da política judiciária trazida pelo projeto do novo Código de Processo Civil. A tanto, introduz-se dispositivo que prevê a possibilidade de ser levada a protesto a sentença judicial transitada em julgado (art. 531), "servindo como um ótimo meio para forçar ou estimular o pagamento de valores decorrentes de condenação judicial transitada em julgado".  Demais disso, registra-se o novo regramento da hipoteca judiciária, com as previsões expressas do direito de preferência e o regime de responsabilidade civil em favor de quem a hipoteca é constituída.

No mais, "altera-se a redação de alguns dispositivos para deixar claro que podem ser executadas as sentenças que preveem o direito a uma prestação, não se restringindo apenas à sentença condenatória".

Alimentos e Execução – O projeto do CPC adota, em linhas gerais, o sistema da execução de prestação alimentícia que já havia sido previsto pelo Estatuto das Famílias, proposta legislativa do IBDFAM. Além dos mecanismos de prisão civil, a possibilidade de protesto de dívidas alimentares no caso de inadimplência do devedor.  Esgotado o prazo de cumprimento voluntário, o devedor poderá ter o nome inscrito nos sistemas de bases de dados de proteção ao crédito. Vejamos, então: A regra do novo artigo 542 do CPC projetado, para efeito do cumprimento da sentença que reconheça a exigibilidade de obrigação de prestar alimentos ou da decisão que fixar alimentos, para além de determinar, a requerimento do credor exequente, que seja o devedor executado, intimado pessoalmente a pagar o débito em três dias, dispõe no sentido que o juiz mandará protestar o pronunciamento judicial, aplicando-se, no que couber, o disposto no artigo 531. Ou seja, a dívida alimentar impaga será levada, necessariamente, a protesto, figurando a sentença ou a decisão judicial como títulos executivos, nesse fim, ao tempo em que executada a dívida. A seu turno, o reportado artigo 531 do projeto agora aprovado pela Câmara estabelece que "a decisão judicial transitada em julgado poderá ser levada a protesto, nos termos da lei, depois de transcorrido o prazo para pagamento voluntário previsto no artigo 537" (ou seja, o que quinze dias).

Esse novo modelo que alia a execução alimentar a outros instrumentos de coercibilidade, a par de se constituir em uma das mais expressivas inovações do CPC, tem precedente em importantes instrumentos normativos já disponibilizados na justiça brasileira.

Não custa lembrar o pioneiro Provimento nº 03/2008, de 11.09.2008, do Conselho da Magistratura de Pernambuco (DOPJ de 17.09.2008), dispondo sobre o protesto de decisões irrecorríveis acerca de alimentos provisórios ou provisionais ou de sentença transitada em julgado, em sede de ação de alimentos.

De nossa iniciativa, quando presidente do Tribunal de Justiça de Pernambuco, o provimento editado considerou, então, que o instituto do protesto, contemplado na Lei federal nº 9.492, de 10.09.1997, em albergando títulos e documentos de dívida (art. 1º), alcançava, por corolário lógico, todas as situações jurídicas originadas em documentos que representem dívida liquida e certa. Segue-se, daí, entender que, "o protesto, sob o prisma do binômio celeridade/efetividade, materializa medida viável e satisfatória ao forçoso cumprimento de decisões judiciais", no âmbito das dívidas alimentares.

O provimento assinalou que a "obrigação alimentar constitui um instrumento de viabilização da vida com dignidade, conquanto objetiva assegurar meios essenciais de subsistência aos seus beneficiários, enquanto impossibilitados de promove-los por si próprios"; assegurando, de efeito, o protesto das decisões judiciais determinantes do pagamento de alimentos.

Nesse conduto, o novo texto processual vem, agora, ratificar, a necessidade de medidas de maior efetividade às decisões judiciais, apresentando-se o instituto do protesto como novo instrumento de eficiência da jurisdição, no sentido de uma prestação de justiça útil e efetiva.
Em resumo, o pronunciamento judicial, quanto à dívida alimentar existente e impaga, no tocante a reconhecer o inadimplemento imotivado, será levado agora, a protesto, por determinação do juiz (art. 542, CPC projetado), sem prejuízo de, em tempo instante, ser decretada a prisão civil, pelo prazo de um a três meses, em regime fechado.

Como observado, o novo CPC permitirá um mais eficiente processo civil de família. Afinal, como é consabido, em ações de famílias, a resolução do processo implica, igualmente, em solucionar e resolver pessoas. Justiça seja feita.

________________________

* O autor do artigo é desembargador decano do Tribunal de Justiça de Pernambuco. Diretor nacional do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), coordena a Comissão de Magistratura de Família.  Assessorou a Comissão Especial de Reforma do Código Civil na Câmara Federal. Autor de obras jurídicas de direito civil e processo civil. Integra a Academia Pernambucana de Letras Jurídicas (APLJ).

Fonte: TJ/PE | 07/04/2014.

Publicação: Portal do RI (Registro de Imóveis) | O Portal das informações notariais, registrais e imobiliárias!

Para acompanhar as notícias do Portal do RI, siga-nos no twitter, curta a nossa página no facebook, assine nosso boletim eletrônico (newsletter), diário e gratuito, ou cadastre-se em nosso site.