CNJ – Corregedoria Nacional de Justiça se manifesta sobre elaboração das demonstrações financeiras do ONR

Expediente foi instaurado em razão da consulta apresentada pelo Presidente do ONR, Flauzilino Araújo dos Santos.

Corregedora Nacional de Justiça, Ministra Maria Thereza de Assis Moura, aprovou o Relatório SEONR, submetido à apreciação pelo Coordenador da Câmara de Regulação do Agente Regulador do Operador Nacional do Sistema de Registro Eletrônico de Imóveis (ONR), Desembargador Marcelo Martins Berthe. A decisão pela aprovação foi publicada no Diário da Justiça Eletrônico do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) de ontem, 27/07/2021 (Edição n. 190/2021, Seção Corregedoria, p. 4). O expediente foi instaurado em razão da consulta apresentada pelo Presidente do ONR, Flauzilino Araújo dos Santos.

De acordo com o Relatório publicado com a decisão, os membros da Câmara de Regulação do Agente Regulador do ONR deliberaram pela aprovação da resposta à consulta formulada, no sentido de serem aplicáveis concretamente os princípios e as regras atinentes à contabilidade empresarial para a composição da escrituração mantida pelo ONR. Considerando ser unânime a decisão daquele Colegiado, a Ministra Maria Thereza Moura aprovou o referido relatório.

Fonte: IRIB.

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CSM/SP: Registro de Imóveis – Apelação – Dúvida julgada improcedente – Legitimidade recursal da instituição financeira credora hipotecária – Óbice afastado – Registro de escritura pública de dação em pagamento – Suficiência da cientificação do credor hipotecário – Desnecessidade de anuência ante a ausência de previsão legal – Hipótese que não se amolda à lei N.º 8.004/90 – Direito de sequela do direito real de hipoteca – Recurso não provido com observação.

Apelação Cível nº 0001497-05.2020.8.26.0566

Espécie: APELAÇÃO
Número: 0001497-05.2020.8.26.0566
Comarca: SÃO CARLOS

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 0001497-05.2020.8.26.0566

Registro: 2021.0000381022

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 0001497-05.2020.8.26.0566, da Comarca de São Carlos, em que é apelante BANCO DO BRASIL S/A, são apelados MAC LUCER CONSTRUÇÕES LTDA. E OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA COMARCA DE SÃO CARLOS.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Negaram provimento, com observação, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 19 de maio de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 0001497-05.2020.8.26.0566

Apelante: Banco do Brasil S/A

Apelados: Mac Lucer Construções Ltda. e Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Carlos

VOTO Nº 31.514

Registro de Imóveis – Apelação – Dúvida julgada improcedente – Legitimidade recursal da instituição financeira credora hipotecária – Óbice afastado – Registro de escritura pública de dação em pagamento – Suficiência da cientificação do credor hipotecário – Desnecessidade de anuência ante a ausência de previsão legal – Hipótese que não se amolda à lei N.º 8.004/90 – Direito de sequela do direito real de hipoteca – Recurso não provido com observação.

1. Cuida-se de recurso de Apelação interposto por BANCO DO BRASIL S.A. contra a r. sentença de fl. 169/171 que julgou improcedente a dúvida suscitada pelo Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Carlos, afastando o óbice ao registro da escritura pública de dação em pagamento ante a desnecessidade de anuência do credor hipotecário.

Sustenta o recorrente, em síntese, que na qualidade de credor hipotecário do imóvel dado em pagamento pela empresa devedora ao terceiro interessado, deve anuir a transferência do bem, nos termos do art. 1º da Lei n.º 8.004/90, o que efetivamente não ocorreu.

A D. Procuradoria Geral de Justiça opinou, preliminarmente, pelo reconhecimento da ilegitimidade recursal do apelante, e, no mérito, pelo desprovimento do recurso (fl. 202/206).

É o relatório.

2. Presentes seus pressupostos legais e administrativos, conheço do recurso.

De proêmio, afasto a alegada ilegitimidade recursal do apelante, sustentada pela D. Procuradoria Geral da Justiça.

Na qualidade de terceiro interessado, afetado pela sentença recorrida, ostenta o apelante legitimidade para recorrer, nos exatos termos do art. 202 da Lei n.º 6.015/73, que assim dispõe:

“Art. 202 – Da sentença, poderão interpor apelação, com os efeitos devolutivo e suspensivo, o interessado, o Ministério Público e o terceiro prejudicado.”

No mérito o recurso não merece provimento.

Com efeito, Mac Lucer Construções Ltda apresentou a registro escritura de dação em pagamento e outras avenças, lavrada no Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais e Anexos de Tabelião de Notas do Distrito de Água Vermelha, da Comarca de São Carlos, firmada com a incorporadora Agraben Desenvolvimento Imobiliário Ltda, tendo por objeto o imóvel da matrícula n.º 122.657 do Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Carlos, consistente em um terreno com incorporação imobiliária gravado com hipoteca em favor do ora recorrente.

O título foi prenotado sob n.º 405.451; o registro foi negado nos termos da nota devolutiva de fl. 13 com o seguinte conteúdo:

“A mera ‘cientificação’ do credor Banco do Brasil S/A, ora apresentada, não foi vista como suficiente para suplantar o óbice da hipoteca constante do R.07./M 122.657, tendo em vista o que determina a cláusula 21ª, §2º do contrato registrado, conforme decidido às fls. 261 e seguintes do Processo de Dúvida sob n.º 000.2438-86.2019.8.26.0566 da 4ª Vara Cível local, que transitou em julgado aos 08/10/2019”.

Suscitada dúvida, cuidou a MM.ª Juíza Corregedora Permanente de julgá-la improcedente, autorizando o ingresso do título no fólio real.

Relevante consignar que o título já fora apresentado anteriormente ao Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Carlos e o registro foi negado com base em dois fundamentos: a) necessidade de anuência da instituição financeira credora; e subsidiariamente, b) necessidade de ao menos ciência da credora hipotecária.

Na oportunidade foi suscitada dúvida, autos do processo n.º 0002438-86.2019.8.26.0566, que foi julgada procedente, constando da r. decisão que:

“Conclui-se que o título não deve ser registrado porque não houve a prova da prévia cientificação do credor hipotecário nos termos do art. 292 da Lei de Registros Públicos e da cláusula vigésima primeira do contrato, celebrado entre a incorporadora e a credora hipotecária” (fl. 63/66) (g.n).

Nestes termos, a apresentante Mac Lucer Construções Ltdae a incorporadora Agraben Desenvolvimento Imobiliário Ltda. notificaram o apelante, por meio da pessoa de Lucas Alberto Guassu, gerente geral da Agência Alexandrina (fl. 14) e apresentaram o título novamente ao Oficial de Registro de Imóveis da Comarca de São Carlos e tiveram o registro uma vez mais negado, nos termos da já mencionada nota devolutiva de fl. 13.

A dúvida, outra vez suscitada, foi julgada improcedente entendendo-se desnecessária a anuência do credor hipotecário e suficiente a cientificação da instituição financeira.

Pois bem.

A prévia cientificação do credor hipotecário, como exigido na r. decisão de fl. 63/66, que julgou procedente a dúvida anteriormente suscitada, foi cumprida pela apresentante (fl. 14), não havendo razão para exigência diversa posterior do Oficial.

Restou expressamente dispensada a anuência da instituição financeira como condição para o pretendido registro.

A r. decisão de fl. 63/66 afastou um dos óbices lançados pelo Registrador destacando inexistir “norma jurídica exigindo a anuência do credor hipotecário”, mantendo apenas a necessidade de cientificação da instituição financeira credora, o que foi devidamente cumprido por Mac Lucer Construções Ltda e pela incorporadora.

A questão, ademais, não se amolda às disposições da Lei n.º 8.004/90, que trata do Sistema Financeiro da Habitação.

Consoante dispõe o art. 1º de mencionado Diploma Legal:

“Art. 1º O mutuário do Sistema Financeiro da Habitação (SFH) pode transferir a terceiros os direitos e obrigações decorrentes do respectivo contrato, observado o disposto nesta lei.

Parágrafo único. A formalização de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão relativas a imóvel financiado através do SFH darse- á em ato concomitante à transferência do financiamento respectivo, com a interveniência obrigatória da instituição financiadora”.

Nos termos de referida Lei especial o mutuário do SFH somente pode alienar o imóvel gravado com a concomitante transferência do financiamento e com interveniência obrigatória da instituição financeira.

Na hipótese, contudo, não houve financiamento por referido sistema e sim financiamento da obra de edificação do empreendimento dando-se em hipoteca o imóvel objeto da matrícula n.º 122.657.

Cuida-se, em verdade, de dação em pagamento de futuras unidades autônomas realizada pela incorporadora e não pelo mutuário do Sistema Financeiro da Habitação, inexistindo, pois, disposição legal acerca da anuência do credor hipotecário.

Não se observa, assim, impedimento à alienação do bem gravado posto não perder o proprietário o “jus disponendi”, transferindo-o ao adquirente, juntamente com o ônus que o grava.

Nos dizeres de Caio Mário da Silva Pereira:

“A alienação transfere o domínio do imóvel; mas este passa ao adquirente com o ônus hipotecário transit cum onere suo” (Instituições de Direito Civil, 18. Ed. Rio de Janeiro, Forense, 2003, v. IV, p. 386).

E, a sequela constitui um dos efeitos dos direitos reais de garantia, provocando a aderência do ônus à coisa, acompanhando-a em poder de quem se encontre.

Nesta ordem de ideias, cumpre destacar ainda que a apresentante Mac Lucer Construções Ltda. declarou sua ciência sobre a hipoteca na escritura pública de modo que a dívida estará garantida pelos direitos próprios ao referido instituto.

No ponto, não é demais lembrar o teor do art. 1475 do Código Civil:

“É nula a cláusula que proíbe ao proprietário alienar imóvel hipotecado”.

Relevante consignar, ainda, que do V. Acórdão de fl. 117/121 infere-se que foi dado provimento ao Agravo de Instrumento interposto por Mac Lucer Construções Ltda. em face do ora recorrente, concluindo-se pela inexistência de fraude à execução ou até fraude contra credores.

De mais a mais, eventual reconhecimento da existência de fraude à execução, como aventado pela Apelante, implicaria, em tese, apenas na ineficácia da alienação.

Finalmente, contudo, de rigor a revogação da parte final da r. sentença de fl. 169/171 que determinou o registro do título constando a “informação de que a hipoteca foi constituída na forma da mencionada súmula, isentando os adquirentes das unidade autônomas”, uma vez que o ponto extrapola o objeto da dúvida, inexistindo, ademais, previsão legal para averbação da existência e aplicação da Súmula 308 do STJ.

3. Por essas razões, nego provimento ao recurso, com observação.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 27.07.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP

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TJ/SP – Registro de Imóveis – Escritura pública de instituição de bem de família – Título qualificado negativamente – Indisponibilidade decorrente de penhora em favor da Fazenda Nacional que impede qualquer ato de disposição do bem, que não a forçada – Exigência de levantamento da constrição averbada na matrícula – A situação registral a ser analisada é aquela existente no momento em que apresentada a escritura para registro – Inadmissibilidade de registro condicional – Instituição voluntária do bem de família, com o registro obrigatório no ofício imobiliário da situação do bem, que se destina ao abrigo ou proteção familiar – Ato que não importa em alienação do imóvel, o qual permanece sob o domínio do devedor do crédito que originou a penhora – Instituição do bem de família ineficaz em relação à credora que penhorou o imóvel anteriormente, por força do direito de sequela – Óbice afastado – Dá-se provimento ao recurso interposto.

Apelação Cível nº 1067433-97.2020.8.26.0100

Espécie: APELAÇÃO
Número: 1067433-97.2020.8.26.0100
Comarca: CAPITAL

PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

CONSELHO SUPERIOR DA MAGISTRATURA

Apelação Cível nº 1067433-97.2020.8.26.0100

Registro: 2021.0000361665

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº 1067433- 97.2020.8.26.0100, da Comarca de São Paulo, em que é apelante LAURIVAL LAÉRCIO GABRIELLI JÚNIOR, é apelado 15º OFICIAL DE REGISTRO DE IMÓVEIS DA CAPITAL.

ACORDAM, em Conselho Superior de Magistratura do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: “Deram provimento, v.u.”, de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores PINHEIRO FRANCO (PRESIDENTE TRIBUNAL DE JUSTIÇA) (Presidente), LUIS SOARES DE MELLO (VICE PRESIDENTE), XAVIER DE AQUINO (DECANO), GUILHERME G. STRENGER (PRES. SEÇÃO DE DIREITO CRIMINAL), MAGALHÃES COELHO(PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PÚBLICO) E DIMAS RUBENS FONSECA (PRES. DA SEÇÃO DE DIREITO PRIVADO).

São Paulo, 4 de maio de 2021.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator

Apelação Cível nº 1067433-97.2020.8.26.0100

Apelante: Laurival Laércio Gabrielli Júnior

Apelado: 15º Oficial de Registro de Imóveis da Capital

VOTO Nº 31.495

Registro de Imóveis – Escritura pública de instituição de bem de família – Título qualificado negativamente – Indisponibilidade decorrente de penhora em favor da Fazenda Nacional que impede qualquer ato de disposição do bem, que não a forçada – Exigência de levantamento da constrição averbada na matrícula – A situação registral a ser analisada é aquela existente no momento em que apresentada a escritura para registro – Inadmissibilidade de registro condicional – Instituição voluntária do bem de família, com o registro obrigatório no ofício imobiliário da situação do bem, que se destina ao abrigo ou proteção familiar – Ato que não importa em alienação do imóvel, o qual permanece sob o domínio do devedor do crédito que originou a penhora – Instituição do bem de família ineficaz em relação à credora que penhorou o imóvel anteriormente, por força do direito de sequela – Óbice afastado – Dá-se provimento ao recurso interposto.

1. Trata-se de apelação interposta por Laurival Laercio Gabrielli Júnior contra a sentença proferida pela MM.ª Juíza Corregedora Permanente do 15º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, objetivando o registro de escritura pública de instituição de bem de família tendo por objeto o imóvel matriculado sob no 2.098 junto à referida serventia imobiliária (fl. 218/220).

O registrador emitiu nota de devolução, consignando que “o imóvel (…) encontra-se gravado pela penhora objeto da AV. 10 na matrícula nº 2.098, em favor da Fazenda Nacional, o que torna o imóvel indisponível, conforme § 1º do artigo 53 da Lei 8212/91”. Assim, exigiu o prévio cancelamento da referida penhora (fl. 18).

Alega o apelante, em síntese, que reside no imóvel com sua família, desde 1985, razão pela qual o bem já estava protegido, nos termos do art. 1º da Lei nº 8.009/90, antes mesmo da averbação da penhora em favor da Fazenda Nacional. Nesse sentido, afirma que o imóvel, sendo bem de família, não poderia ser penhorado por expressa disposição legal. Defende, também, a possibilidade da prática do ato de registro sob condição, ou seja, garantindo a proteção legal do bem de família enquanto não houver decisão judicial em sentido contrário, nos autos da ação de embargos à execução fiscal em que se discute a impenhorabilidade do bem. Por fim, sustenta que a indisponibilidade, se admitida, atingiria apenas a meação do executado e não, de sua esposa, ressaltando que, à época da lavratura do ato, ficou expressamente constando da escritura de instituição de bem de família que não havia indisponibilidade do bem (fl. 225/235).

A Procuradoria de Justiça opinou pelo não provimento do recurso (fl. 263/266).

É o relatório.

2. Busca o apelante o registro da escritura de instituição de bem de família tendo por objeto o imóvel matriculado sob nº 2.098 junto ao 15º Oficial de Registro de Imóveis da Capital (fl. 117/124).

Desde logo, é preciso anotar que, diferentemente do que sustenta o apelante, não há como se admitir o registro condicional, subordinado ao futuro julgamento dos embargos à execução que tramita perante a Justiça Federal (Processo nº 0003404-17.2013.4.03.6133). A respeito, merece ser transcrito ilustrativo trecho do voto vencedor proferido pelo Desembargador Márcio Martins Bonilha, na Apelação Cível nº 82.230-0/0, da Comarca de Piracicaba:

“Cumpre, inicialmente, ressaltar que não há como admitir o registro condicional, subordinado à futura apresentação de determinado documento, ou certidão explicativa. A legalidade da desqualificação é aferida tomando-se como parâmetro o momento exato da suscitação da dúvida, independentemente de documentos novos acostados aos autos no curso do procedimento, ou prometidos pelo interessado.

Lembre-se que admitir o cumprimento de exigências no curso do procedimento acarretaria a indevida prorrogação da prenotação, em detrimento potencial de outros titulares de direitos posicionais contraditórios (…)”.

É que a dúvida, se não prejudicada, comporta apenas duas soluções: procedência ou improcedência. Jamais poderá ser julgada improcedente para deferimento da prática de ato de registro condicionado a um evento futuro e incerto.

Ainda, no que diz respeito à alegação de que o imóvel em questão é destinado à moradia do apelante e sua família desde 1985 e que, portanto, a proteção legal decorrente do disposto na Lei nº 8.009/90 antecede a averbação da penhora em favor da Fazenda Nacional, importa lembrar que o título é qualificado pelo Oficial do registro de imóveis segundo as regras vigentes ao tempo em que a inscrição (lato sensu) foi rogada. Assim, mesmo que na escritura de instituição de bem de família não tenha constado a indisponibilidade decorrente da penhora averbada na matrícula, a situação registral a ser analisada é aquela existente no momento em que apresentada a escritura para registro.

No caso concreto, a recusa do registrador está fundada na exigência de cancelamento da averbação de penhora do referido imóvel em favor da Fazenda Nacional e consequente levantamento da indisponibilidade do bem.

A propósito da indisponibilidade, prevê o art. 53, § 1º, da Lei nº 8.212/91:

Art. 53. Na execução judicial da dívida ativa da União, suas autarquias e fundações públicas, será facultado ao exeqüente indicar bens à penhora, a qual será efetivada concomitantemente com a citação inicial do devedor.

§ 1º Os bens penhorados nos termos deste artigo ficam desde logo indisponíveis.

A redação da norma permite concluir que, penhorado o imóvel por dívida ativa da União, de suas autarquias ou de suas fundações públicas, de pronto estará indisponível o bem. E a indisponibilidade, decorrente da penhora em favor da Fazenda Nacional, impede qualquer ato de disposição do bem, que não a forçada. Sobre o tema, há inúmeros precedentes deste C. Conselho Superior da Magistratura: Apelação Cível nº 3003761-77.2013.8.26.0019, Rel. Elliot Akel, j. 03.06.2014; Apelação Cível nº 1003418-87.2015.8.26.0038, Rel. Pereira Calças, j. 25.04.2016; Apelação Cível nº 0006500-59.2019.8.26.0344, Rel. Pinheiro Franco, j. 10.12.2019.

Nesse contexto, é preciso ponderar se a instituição de bem de família importa em alienação voluntária do imóvel.

Pois bem. O Código Civil não traz uma definição específica sobre o instituto, nem seu conceito, apenas prevendo sua existência, forma de constituição e finalidade. Nesse sentido, dispõem os arts. 1.711 e 1.712 do referido diploma legal:

Art. 1.711. Podem os cônjuges, ou a entidade familiar, mediante escritura pública ou testamento, destinar parte de seu patrimônio para instituir bem de família, desde que não ultrapasse um terço do patrimônio líquido existente ao tempo da instituição, mantidas as regras sobre a impenhorabilidade do imóvel residencial estabelecida em lei especial.

Parágrafo único. O terceiro poderá igualmente instituir bem de família por testamento ou doação, dependendo a eficácia do ato da aceitação expressa de ambos os cônjuges beneficiados ou da entidade familiar beneficiada.

Art. 1.712. O bem de família consistirá em prédio residencial urbano ou rural, com suas pertenças e acessórios, destinando-se em ambos os casos a domicílio familiar, e poderá abranger valores mobiliários, cuja renda será aplicada na conservação do imóvel e no sustento da família.

Para Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald (“Direito das Famílias”. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, pp. 702/703), o instituto é uma forma de afetação de bens a um destino especial, visando assegurar a dignidade humana dos componentes de uma família, garantindo sua sobrevivência, com base no mínimo existencial de patrimônio, para a realização da justiça social. Caio Mário da Silva Pereira (“Instituições de Direito Civil: direito de família”, 23ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2015, v. 5, p. 244) entende que “o bem de família é uma forma de afetação de bens a um destino especial que é ser a residência da família, e, enquanto for, é impenhorável por dívidas posteriores à sua constituição, salvo provenientes de impostos devidos pelo próprio prédio”. De seu turno, Sílvio de Salvo Venosa (“Direito Civil: Direito de família”, 9ª ed. São Paulo: Atlas, 2009, pp. 384/386) transmite o pensamento de Serpa Lopes, para quem o bem de família é um condomínio sui generis, no qual nenhum dos cotitulares possui uma quota parte, ensejando uma coletividade que abarca o instituto, representada pelo chefe da família.

Assim, conclui:

“Trata-se da destinação ou afetação de um patrimônio em que opera a vontade do instituidor, amparada pela lei. É uma forma de tornar o bem como coisa fora do comércio, em que são combinadas a vontade da lei e a vontade humana. Nesse diapasão, o bem de família fica isento de execução por dívidas posteriores sua instituição, salvo as que provierem de tributos relativos ao prédio ou despesas de condomínio (art. 1.715)”.

A instituição voluntária do bem de família, com o registro obrigatório no ofício imobiliário da situação do bem, destina-se ao abrigo ou proteção familiar. Com isso, o imóvel em que a família está domiciliada torna-se impenhorável (isento de dívidas futuras, salvo obrigações tributárias referentes ao bem e despesas condominiais – art. 1.715 do Código Civil) e inalienável (só poderá ser alienado com a autorização dos interessados, cabendo ao Ministério Público intervir quando houver participação de incapaz – art. 1.717 do Código Civil), até a morte de ambos os cônjuges e a maioridade dos filhos, desde que não sujeitos a curatela (art. 1.722 do Código Civil).

Como se vê, a instituição do bem de família não se consubstancia numa transferência de domínio, ou seja, não equivale à alienação do imóvel. Ao contrário, o imóvel permanece sob o domínio do devedor do crédito que originou a penhora em questão.

A respeito, ressalta Caio Mário da Silva Pereira que:

“Não se verifica uma transmissão (salvo constituição por terceiros), porque a coisa não sai da propriedade do pater familias, e não ocorre a criação de um condomínio, pela razão de nenhum dos membros do grupo familiar ter uma quota ideal do imóvel. Se se atentar para o fato de que com a morte dos cônjuges e a maioridade dos filhos se opera, pleno iure, a sua extinção, da mesma forma que esta pode ser declarada a requerimento dos interessados, se o bem tiver deixado de preencher o requisito de sua destinação, concluir-se-á que não sofre a coisa, como objeto de relação jurídica, uma alteração essencial na sua natureza. É, e continua sendo objeto do direito de propriedade do instituidor, mas afetado a uma finalidade, sub conditione da utilização como domicílio dos membros da família” (“Instituições de Direito Civil”. 28ª ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2010, p. 230).

Ademais, em relação à credora que penhorou o imóvel a instituição do bem de família é ineficaz, por força do direito de sequela. Em princípio, responderá o imóvel pelos débitos pretéritos, certo que eventual impenhorabilidade decorrente de lei deverá ser discutida nos autos dos embargos à execução que está em curso perante a Justiça Federal.

Nesse cenário, o registro da escritura pública de instituição de bem de família, tendo por objeto o imóvel matriculado sob nº 2.098 junto ao 15º Oficial de Registro de Imóveis da Capital, não pode ser obstado, sendo de rigor o afastamento, no caso concreto, da exigência de prévio levantamento da penhora averbada em favor da Fazenda Nacional (AV. 10 – fl. 117/124), que deu ensejo à indisponibilidade do bem (art. 53, § 1º, da Lei 8.212/91).

3. À vista do exposto, pelo meu voto, dou provimento à apelação interposta, para julgar a dúvida improcedente.

RICARDO ANAFE

Corregedor Geral da Justiça e Relator (DJe de 27.07.2021 – SP)

Fonte: DJE/SP

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